Com obras memoráveis ou frases espalhadas pelas redes sociais, Clarice Lispector (1920 - 1977) segue viva na literatura brasileira. Mas isso não impede que ela seja lembrada em um momento especial, só seu: em 10 de dezembro, o projeto Hora de Clarice ganha as livrarias e os centros culturais no Brasil afora. Porto Alegre é uma das capitais que receberá homenagens à escritora nascida na Ucrânia e naturalizada brasileira, com sarau nesta quinta, às 19h30min, na Livraria Cultura do Bourbon Shopping Country.
Jornalista Cláudia Laitano, editora de ZH, fala sobre Clarice Lispector
Promovida pela editora Rocco e pelo Instituto Moreira Salles (IMS), a iniciativa realizada no dia do aniversário da autora chega ao seu quinto ano. Em 2015, a programação ocorre em pelo menos seis capitais e no Exterior, em países como Portugal, França e Estados Unidos. Os eventos variam: vão desde palestras e debates a leituras dramáticas, entre outras manifestações artísticas. A cada edição, o projeto se consolida no calendário cultural, ganhando mais parceiros - em Porto Alegre, outro local que também fará homenagens a Clarice será a Aldeia (leia mais abaixo).
- É uma forma de difundir ainda mais a obra, além de ser uma justa homenagem. A literatura tradicionalmente é mais fria, isolada e individual. Nesses encontros, a obra sai do livro, por assim dizer. Fica viva - ressalta o escritor, colunista de ZH e professor de literatura da UFRGS, Luís Augusto Fischer.
Nesta quinta-feira, Fischer comanda com a jornalista Cláudia Laitano, editora e colunista em ZH, o Sarau Hora de Clarice, na Capital. O evento contará com leituras de trechos da escritora, comentários e bate-papo - no ano passado, a Rocco e o IMS não realizaram eventos oficiais da data na capital gaúcha. Mas não será um momento voltado somente a admiradores: Fischer avisa, inclusive, que não é exatamente um fã da obra da autora. Ele prefere se definir como um leitor:
- Conheço bastante a obra, mas não sou um apaixonado. Isso me dá uma condição interessante de contraponto. O evento será uma celebração, mas também servirá como divulgação. Para quem não conhece muito da Clarice, vale a pena ir.
Confira uma das últimas entrevistas de Clarice Lispector
Hoje, com a enxurrada de aforismos nas redes sociais, é difícil alguém que nunca tenha ouvido falar dela. Mesmo assim, parece que o mundo ainda está descobrindo a escritora aos poucos. Neste ano, por exemplo, a coletânea de contos The Complete Stories - lançada em julho nos Estados Unidos - entrou na lista dos 100 melhores títulos feita pelo The New York Times, além de Clarice ter sido a primeira brasileira a figurar na capa do suplemento de livros do jornal americano.
- Cada vez mais, ela tem sido apreciada como uma figura de importância para a literatura. Hoje, com a maré montante do feminismo, é um momento ainda mais favorável para a divulgação da Clarice, pelos méritos que ela tem como escritora. Ela representa um ponto de vista feminino - avalia Fischer.
Hora de Clarice
Sarau
Com o escritor, colunista de Zero Hora e professor de literatura da UFRGS Luís Augusto Fischer e a jornalista Cláudia Laitano, editora e colunista de Zero Hora. Quinta, às 19h30min, na Livraria Cultura do Bourbon Shopping Country (Túlio de Rose, 80). Entrada franca.
Bate-papo e leituras
Com Diego Dourado, Márcia Ivana de Lima Silva, Ligia Savio e Deborah Finocchiaro. Quinta, às 20h15min, na Aldeia (Santana, 252). Entrada franca.
Três livros para conhecer Clarice, por Luís Augusto Fischer
A Legião Estrangeira
"Excelente livro de contos, que dá uma boa notícia da força literária e da perspectiva da autora, sempre combinando um tanto de relato narrativo, dotado de um mínimo de realismo documental, externo aos personagens, com outro tanto de atenção ao mundo interior das personagens, flagradas geralmente na intimidade menos óbvia. Tudo composto numa linguagem fluente, sem nenhum traço de pernosticismo ou preciosismo, mas paradoxalmente dotada também de muita opacidade - sim, é isso mesmo, simultaneamente. O resultado é muito interessante e é um elemento de grande interesse por parte dos leitores, especialmente dos fãs (o que não é meu caso)".
A Paixão Segundo G.H.
"No romance, que tem um enredo mínimo, uma mulher, tendo despedido a empregada, vai limpar o quarto e precisa matar uma barata. E, nesse processo trivial, entra numa crise de identidade - e de uma intensidade grande, fruto do magnetismo da narrativa, que vai se aproximando e se afastando do objeto problemático (a barata, no plano elementar, mas a mulher ela mesma, no plano mais complexo), enquanto a linguagem da narrativa vai simulando os processos de hesitação internos da personagem-narradora".
A Descoberta do Mundo
"Vale ler esta reunião de crônicas publicadas no antigo Jornal do Brasil para conhecer a face, digamos, pública da autora. É bastante original seu jeito de cronista, considerado o panorama da crônica brasileira, que é bem amplo e bem servido. Clarice relata muitas coisas pessoais, incluindo questões com as experiências dos filhos, recorda cenas de sua vida, comenta figuras de prestígio daquele momento, faz entrevistas rápidas, relata correspondências que mantém, tudo com a mesma linguagem e a mesma abordagem de sua ficção".