A peça era domingo, às seis da tarde, no Theatro São Pedro (TSP). Chegamos mais cedo e subimos ao foyer para um café. Numa das mesas, dona Eva Sopher se despedia, com alguma urgência, das amigas com as quais estivera até então. Perguntamos aonde ela ia com tanta pressa. A resposta:
- Ora, preciso receber as pessoas que vêm ver a peça.
Quem frequenta o São Pedro conhece a cena: dona Eva, junto ao bilheteiro, cumprimentando os espectadores, sempre com um sorrisão de boas-vindas. Um dos mais belos e tradicionais rituais da vida cultural do Estado. Do país. Do mundo.
Cíntia Moscovich: Todos os milagres
Aos 92 anos, atuando como presidente da Fundação Theatro São Pedro, dona Eva e equipe promovem uma média de sete espetáculos por semana. São apresentações de solistas, grupos de teatro, de dança, além de orquestras internacionais e da própria orquestra do TSP. No último 28 de agosto, dona Eva recebeu a Medalha Goethe 2015 Residenzschloss de Weimar, honraria oficial da Alemanha a personalidades que se destacaram na promoção do intercâmbio cultural.
Magrinha, cabelos brancos bem cortados, olhos vivazes, sempre vestida de maneira informal e com um molho de chaves na mão, essa judia alemã fugida do nazismo e naturalizada brasileira é uma das maiores bênçãos que essas paragens remotas já receberam. Tomou para si o comando da reforma do São Pedro dos anos 1970 até 1984, espécie de milagre que evitou a demolição do prédio. Foi com um admirável senso de responsabilidade e de respeito amoroso a todas as formas de expressão artística que dona Eva passou a cumprir no Rio Grande do Sul o papel de civilizadora, na contramão evidente do burocratismo oficial.
Há 12 anos, ela luta pela conclusão do Multipalco Theatro São Pedro, complexo de salas e palcos que abrigarão ensaios, cursos e debates. Com os maus pedaços que os gaúchos têm passado, torna-se cada vez mais difícil que ela consiga os cerca de R$ 30 milhões que ainda faltam para a conclusão do complexo (e nem se fala aqui da conclusão do Teatro da Ospa, outra encrenca que parece não sair do lugar).
Sei que é quase impossível, mas, com a proximidade do 20 de setembro, a conclusão do Multipalco e do Teatro da Ospa seriam realmente façanhas que serviriam de modelo a toda terra. Ah, se seriam.