Há 20 anos, enquanto passeava por um antiquário nos arredores de Phoenix, a colecionadora de livros Ellen G.K. Rubin passou os olhos por algo intrigante no alto de uma prateleira. Era um livro pop-up, "Moko and Koko in the Jungle" (Moko e Koko na floresta, em tradução literal), que revelou uma série de bananeiras, lotadas de animais.
Era uma cena densamente povoada. Próxima a um rio, a floresta protegia um elefante, um rinoceronte, uma girafa e uma zebra, com o bumbum listrado visível, enquanto o resto do animal desaparecia em meio às árvores. Leões, um macho e uma fêmea, descansavam. No alto das copas, um chimpanzé comia solenemente uma banana. Encostado nas palmeiras, um menino europeu branco, com uma pele de animal sobre os ombros, e um menino negro, com as saias feitas de penas coloridas, parados como sentinelas. Era um mundo inteiro que se passeava entre as páginas do livro.
Essa foi a primeira vez que Rubin teve contato com a obra de Vojtech Kubasta, arquiteto, ilustrador checo de livros infantis e mestre dos livros pop-up. No auge de sua produção, nos anos 60 e 70, seus livros criados cuidadosamente foram traduzidos para dezenas de idiomas e lidos por crianças do mundo todo. As crianças britânicas o conheciam como o autor de livros envolvendo o Tip e o Top, dois meninos que constroem juntos um carro (Tip e Top Constroem um Carro) e viajam para o espaço (Tip e Top na Lua). Nos EUA ele era praticamente desconhecido.
- Decidi que iria colecionar tudo que ele já tivesse feito; agora eu percebo o quanto essa ideia era ingênua e sou obrigada a rir. Esse pode ser o artista mais prolífico que já viveu - afirmou Rubin.
A evidência pode ser encontrada no Grolier Club, onde cerca de 100 itens da grande coleção de Rubin de obras de Kubasta estarão expostos até o dia 15 de março, em "Pop-Ups de Praga: Centenário das Artes Gráficas de Vojtech Kubasta".
Cronologicamente, a exposição organizada por Rubin começa com algumas das primeiras obras de Kubasta, quando ele ainda era um estudante de desenho nos anos 1920, passeando pelas décadas e terminando com uma bibliografia ilustrada de seus livros, publicada de forma privada em 1989, três anos antes de sua morte aos 78 anos de idade.
No meio tempo, a imaginação fértil de Kubasta e suas mãos incansáveis revelaram ter um valor inestimável para todos os tipos de arte: propaganda, cartazes do governo, souvenires de Praga e Brno, uma Meca de papel para o mercado iraniano, uma série de livros para ajudar as crianças a contarem, contos de fadas clássicos, a ilustração da capa da versão checa de "O Ovo e Eu", cenas natalinas, cartões de Ano-Novo, uma série de livros pop-up sem assinatura baseados em filmes da Disney, como "Bambi", "Os 101 Dálmatas", etc.
Foto: Byron Smith / New York Times
- O primeiro pop-up bonito de verdade que ganhei quando era pequeno foi a 'Cinderela' de Kubasta. Reconheci imediatamente que aquilo era especial. Foi a primeira vez que vi uma arte bonita e integrada ao mundo tridimensional - afirmou o engenheiro de papel e ilustrador Robert Sabuda, que produziu muitos livros infantis e cartões.
Kubasta, que nasceu em Viena e foi criado em Praga, nunca teve a intenção de se tornar um artista pop-up. Assim como muitas pessoas da Europa Central, sua vida virou de cabeça para baixo quando a Alemanha entrou na guerra. Depois de estudar Arquitetura e Engenharia na Universidade Técnica Tcheca, em Praga, ele encontrou trabalho em um único prédio antes da chegada dos nazistas, um hotel no sul da Boêmia que ainda existe.
Durante a guerra, Kubasta deu aulas na Escola de Desenho Gráfico de Rotter. Ele também projetou utensílios domésticos, propagandas para fabricantes de plástico e começou a conhecer melhor o mundo editorial, criando capas e livros e litografias de locais históricos em Praga.
No início dos anos 50, Kubasta foi contratado pela agência de turismo da Eslováquia, desenhando pôsteres de turismo e livros de viagem, elementos que saltavam das páginas. Para a Câmara de Comércio da Tchecoslováquia, ele desenvolveu materiais de propaganda para máquinas de costura, para a cerveja Pilsner Urquell e para as lâmpadas Praha. Um dos pôsteres mais impressionantes da exposição mostra um enorme gênio azul saltando da lâmpada de Aladdin e segurando uma lâmpada elétrica acesa.
Em pouco tempo ele firmou uma parceria vitalícia com a editora estatal checa. Em 1953, ele projetou seu primeiro livro pop-up, "Christopher Columbus" (mais tarde publicado como "How Columbus Discovered America", ou "Como Cristóvão Colombo descobriu a América), cujas capas, quando abertas, revelavam miniaturas da Pinta, da Niña e da Santa María. Muitos outros livros foram publicados na sequência e Kubasta produziu quase uma centena de livros pop-up entre 1955 e 1965.
A exposição mostra diversos livros dessa época, incluindo "A Estação Polar", um cenário polar com um grande avião, um urso polar ao lado de uma câmera de vídeo em um tripé e dois meninos, Johnny e Nanuk, que exploram as maravilhas do Ártico.
Ao mesmo tempo, Kubasta ilustrou dezenas de contos de fadas, muitos de autoria dos Irmãos Grimm. Suas ilustrações coloridas e exuberantes para a edição de 1945 dos "Músicos de Bremen" estão na exposição de Grolier. Foi para fugir do passado que Kubasta imaginou Tip e Top, dois meninos, um magro e impetuoso, o outro gordo e cauteloso, em busca de aventuras no mundo moderno, muitas vezes ao lado do cachorro Tap.
Kubasta produziu suas cenas complexas e integradas com um toque minimalista.
- O que é mais impressionante a respeito de Kubasta, ao contrário de muitos artistas que fazem cenas pop-up hoje em dia com muitas camadas de papel, é que ele conseguiu todos os seus efeitos utilizando uma única folha de papel. Essa é a verdadeira mágica de Kubasta. Observe um de seus pop-ups pela lateral, e ele terá a aparência de uma escada, com os espaços positivos ausentes do plano de fundo, já que foram cortados. Entretanto, ninguém nota essa ausência. A simplicidade do trabalho, do ponto de vista de alguém que trabalha com engenharia de papéis, é simplesmente genial - afirmou Sabuda.
Foto: Byron Smith / New York Times
Waldo Hunt, ex-executivo de marketing de Los Angeles, encontrou seu destino quando viu os livros de Kubasta em uma loja de brinquedos de Nova York no início dos anos 60.
- Sabia que havia encontrado a chave mágica. Ninguém fazia livros pop-up no país. Ninguém tinha dinheiro para fazê-los aqui. Eles tinham que ser feitos a mão e o custo do trabalho era alto demais - afirmou Hunt ao The Los Angeles Times em 2002.
Torcendo para importar as obras, ele abordou a editora de Kubasta, que não aceitou a oferta, pois ela não se adequava ao plano quinquenal. Em vez disso, ele criou sua empresa de livros pop-up, a Graphics International. Isso permitiu o renascimento do gênero pop-up nos EUA. Bennett Cerf da Random House se interessou, e colaborou com Hunt em dezenas de livros "dimensionais". A sucessora da Graphics International, a Intervisual Books, se tornou a maior fabricante de livros pop-up do mundo, com títulos que incluíam "O Corpo Humano" (1983), de Jonathan Miller e David Pelham, e "How Many Bugs in a Box?" (Quantos insetos há na caixa, em tradução literal), de David A. Carter. A empresa produziu obras de estrelas em ascensão, como Eric Carle e Jan Pienkowski, cujo livro "A Casa Assombrada" (1979) venceu o Kate Greenaway Prize, na Inglaterra, uma honraria rara para livros pop-up.
Kubasta e Hunt deram vida a um gênero moribundo, cujas origens datam ao século XIII, embora o termo seja relativamente novo, registrado nos anos 1930 pela Blue Ribbon Publishing para a venda de uma série de livros sobre contos de fadas e heróis dos quadrinhos, como Tarzan e Popeye.
A indústria alemã dos livros pop-up desapareceu depois da Primeira Guerra Mundial. Foi só quando Kubasta publicou seus livros intricados e sofisticados que o formato recuperou a glória do passado. Embora suas obras tenham sido traduzidas a mais de 30 idiomas e 10 milhões de seus livros tenham sido impressos, ele é principalmente conhecido na Inglaterra e na Europa Oriental e sua influência continua a ser indireta.
- Seu ponto forte era a criação de ambientes e, embora tenha trabalhado sob circunstâncias repressivas, ele sempre foi otimista. Vejo seus livros como uma espécie de teatro de marionetes e é o leitor quem puxa as cordinhas - concluiu Rubin.
Leitura mágica
Ilustrador checo usava arte pop-up para dar vida aos livros infantis
Vojtech Kubasta produziu quase uma centena de obras entre 1955 e 1965, com traduções para dezenas de idiomas
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