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Para a criação da peça Luis Antonio - Gabriela, destaque do 7º Festival Palco Giratório Sesc/POA neste fim de semana, o diretor Nelson Baskerville buscou o distanciamento defendido pelo dramaturgo alemão Bertolt Brecht (1898 - 1956) em seu teatro épico para evitar que o público se identifique com os personagens.
Segundo Brecht, defensor de um teatro político, a estratégia estimula que a plateia tenha a consciência crítica despertada.
Mas Baskerville admite que, nesse sentido, falhou na missão.
- É um épico que deu um tiro no pé. O público se emociona do mesmo jeito - diz, por telefone.
Mesmo assim, é por meio do teatro épico que o diretor explica a reação da plateia frente à história de seu próprio irmão, Luis Antonio, homossexual que assumiu a identidade da travesti Gabriela, enfrentando a rejeição da família e morrendo de forma solitária na Espanha:
- Meu teatro é brechtiano porque a plateia assiste a uma tragédia que poderia ter sido evitada. Assim, ele também toca pessoas distantes do tema.
Levando ao extremo o teatro confessional, os personagens interpretados pelos atores da Cia. Mungunzá (SP) são os próprios integrantes da família do diretor e pessoas próximas - a madrasta, os irmãos, um amigo de Luis Antonio. Entre os méritos da produção paulista, que levou este ano o Prêmio Shell (o mais importante do teatro nacional) de melhor direção, está a abordagem sensível de um tema que costuma ser tratado de maneira estereotipada, folclórica. Luis Antonio - Gabriela mostra que a vida real não é uma gaiola das loucas.
- A peça fala não apenas do meu irmão, mas de 98% dos travestis do mundo. O travesti nasce, não é aceito pela família, é expulso da escola, sai de casa sem estudo, sem trabalho e não tem outro meio para se sustentar que não seja a prostituição - observa Baskerville.
Corajoso, o diretor revê no espetáculo episódios da infância, na década de 1960, como a ocasião em que o irmão o seduziu, e conta o triste destino de Luis Antonio, que morreu em Bilbao, em 2006, praticamente abandonado por todos.
Baskerville não esconde que a peça é um pedido de desculpas. Lamenta que tenha faltado "orientação" à família para lidar com a situação. Mais de um ano depois da estreia, ele ainda tem dificuldade para acompanhar o espetáculo. Alguns atores ficaram frustrados com a distância, mas veio, enfim, a compreensão.
- Toda vez que assisto à peça, ela me machuca um pouco. Ao final, não tive uma sensação de alívio. Continua sendo uma tragédia - diz o diretor.
SERVIÇO:
Luis Antonio - Gabriela
Direção de Nelson Baskerville com a Cia. Mungunzá de Teatro (SP)
Sábado e domingo, às 18h.
Duração estimada: 90 minutos.
Classificação: 16 anos.
Teatro Sesc (Alberto Bins, 665), fone (51) 3284-2070, em Porto Alegre.
Ingressos: R$ 20 (R$ 10 para estudantes, idosos e classe artística). À venda no local, uma hora antes do início do espetáculo.
A peça: conta a história de Luis Antonio, que assume a identidade da travesti Gabriela. Em tom confessional, o espetáculo é baseado na vida do irmão do diretor.