Leandro Roque de Oliveira, o Emicida, já sabe onde vai bater um rango nesta quinta-feira, antes de apresentar, no palco do Opinião (Rua José do Patrocínio, 834), o show do disco Sobre Crianças, Quadris, Pesadelos e Lições de Casa, lançado em 2015.
– Sou maloqueiro, gosto de comer uma à la minuta no Tudo Pelo Social. Tá ligado? A rua é nóis – diverte-se o rapper de 31 anos, fã confesso dos pratos fartos servidos no popular restaurante da Cidade Baixa.
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Emicida costuma lotar todos os shows que faz na Capital, e a sintonia do músico com o público gaúcho impressiona, fruto das relações pessoais que cultiva sempre que vem à cidade:
– Quando a gente vai a um lugar várias vezes, como é o caso de Porto Alegre, você já desenvolve uma relação com o local. Tenho os meus lugares favoritos aonde gosto de ir com meus camaradas, que são de grupos da Região Metropolitana dos quais eu sou fã.
Entre eles, o paulistano cita o Da Guedes ("uma referência nacional"); o Rafuagi ("o Rafa [um dos integrantes do grupo de Esteio] é a maior figura, né? Adoro aquele gordinho, toda vez que vou aí eu encho o saco dele"); e Zudizilla, de Pelotas ("este moleque tem que brilhar muito, o Brasil precisa da música deste mano, fico emocionado com o potencial criativo dele").
Na entrevista a seguir, Emicida fala sobre o disco que fez em parceria com rappers portugueses, o elogiado desfile de sua marca na São Paulo Fashion Week e o seu engajamento político.
Como foi produzir o disco Língua Franca em parceria com Rael e os rappers portugueses Capicua e Valete em Lisboa?
Foi um projeto colaborativo. Ficamos trancados em estúdio durante 10 dias. Tive que me ausentar um pouquinho e voltar porque eu tinha outros shows para fazer na Europa. Foi uma parada intensa, onde a gente ficou fazendo música juntos. No final, ficou um retrato muito bacana do que a gente viveu nesses dias. Fico felizão porque a gente queria estabelecer uma ponte, mostrar que dá para cruzar o oceano com essa parada e inspirar outras pessoas a fazer essa mesma travessia.
Assista agora ao clipe de Ideal, do projeto Língua Franca:
Qual a sua opinião sobre o momento da indústria da música no Brasil?
Ela não privilegia a diversidade. Culturalmente a gente tem um país rico pra caramba, só que, quando você liga a televisão ou o rádio ou abre uma revista, infelizmente essa diversidade desaparece. Só existe no discurso das pessoas privilegiadas.
E como é produzir música em tempos de redes sociais? As críticas e comentários agressivos te incomodam?
Tem coisa que é legal ver, outras não. Umberto Eco disse que a internet deu voz para uma legião de imbecis. Concordo com isso em parte. Isso é muito bom porque algum tempo atrás só podiam falar os imbecis que tinham dinheiro. A gente ter a capacidade de se comunicar é muito valioso. Hoje você consegue emitir uma opinião contrária à dos meios de comunicação hegemônicos sem o filtro de nenhum tipo de censura. Mas isso leva para uma reflexão que é mais profunda: que tipo de educação a gente tem para emitir nossas opiniões? São opiniões ou é ódio disfarçado de opinião? É por isso que puxo o freio da internet às vezes. É uma energia ruim, uma parada que nivela tudo por baixo, tem que tomar muito cuidado.
Como foi desfilar com a sua marca, a LAB Fantasma, na São Paulo Fashion Week?
Fiquei surpeso com o impacto porque eu estava tão centrado na produção, fiquei tão elétrico e nem me dei conta da dimensão do que a gente estava fazendo, do quão histórico era aquilo. Só foi cair a minha ficha quando entrei para ensaiar no auditório, ouvi a música tocando e vi aquela negrada entrando na passarela. Meu olho encheu de água, quase chorei. No dia seguinte, foi como se tivesse caído uma bomba, estava todo mundo falando. A gente começou a receber muita mensagem de gente que é fã de moda e estudantes que diziam não ver uma razão para ter escolhido esse curso, mas que, a partir daquele desfile, tinham entendido um significado para essa parada. Você se sente feliz quando você consegue reacender a motivação de alguém.
Tu tens criticado bastante o presidente Michel Temer, inclusive participando de atos pelas eleições diretas. Qual é o teu papel e o papel dos artistas neste momento?
O artista não tem nenhum obrigação que qualquer outro membro da sociedade civil não tenha. O que acontece é que a arte brasileira tem um histórico de pular na linha de frente da guerra e puxar essa responsabilidade. A gente vive num vazio institucional tão grande que a arte vem para dizer "isso precisa mudar" e exerce essa pressão. Porque a gente pode andar em lugares onde os políticos não podem, temos o respeito da população. A gente precisa se unir, conversar e lutar. É vergonhoso a gente ter que gritar "diretas já" em 2017. Parece que a gente retrocedeu 50 anos. Tenho um papel e o exerço. O hip hop tem esse histórico.
Como se dá a conexão com o público de Porto Alegre?
O que eu faço é trocar ideia com as pessoas que estão ao meu redor. Quando vou a Porto Alegre, sou comunicativo. Tenho uma relação com o Rio Grande do Sul. Quando subo no palco, sou mais um de vocês, estamos juntos para trocar uma ideia. O trabalho do mestre de cerimônia é esse. O MC conecta o público com o evento através da música. O hip hop ensinou isso. Não posso agir como se eu fosse uma coisa destacada da multidão. É essencial que a multidão entenda que sou parte dela, que a gente se torna um através da música.
EMICIDA
Quinta-feira (08/06), às 23h (abertura da casa: 21h30min). Classificação: 16 anos
Opinião (Rua José do Patrocínio, 834), em Porto Alegre
Ingressos: R$ 45 (com a doação de um quilo de alimento não perecível) a R$ 110
Pontos de venda sem taxa (somente em dinheiro): Youcom Bourbon Wallig. Venda com taxa (somente em dinheiro): Youcom – Shopping Praia de Belas, Iguatemi, Bourbon Ipiranga, BarraShoppingSul, Bourbon Novo Hamburgo e Canoas Shopping; Multisom – Andradas, 1.001 (centro de Porto Alegre) e Bourbon São Leopoldo. Online: no site blueticket.com.br/grupo/opiniao