Oito atores coadjuvantes aguardam na coxia de um teatro, mas lá se foram três horas de espetáculo e ainda não chegou a vez de brilharem. Enquanto observam o que se passa em cena, questionam-se sobre seu próprio ofício. Mas o que é o sucesso, afinal? E por que temos tanto medo do fracasso? Em cartaz desta sexta-feira (12/5) a domingo (14/5) no Theatro São Pedro, em Porto Alegre, O Grande Sucesso é uma peça sobre teatro, mas não apenas isso: os dilemas dos personagens podem ser os de qualquer espectador.
Conhecido por papéis televisivos como o Comendador da novela Império, Alexandre Nero contracena com sete atores: Carol Panesi, Edith de Camargo, Eliezer Vander Brock, Fabio Cardoso, Fernanda Fuchs, Marco Bravo e Rafael Camargo. Aqui, Nero reencontra amigos da cena curitibana com os quais compartilha uma trajetória. O autor e diretor Diego Fortes e a designer de luz Nadja Naira haviam trabalhado com ele em Os Leões (2006), montagem que lhe valeu um convite para a televisão.
O Grande Sucesso desembarca na Capital com dois Prêmios Shell de São Paulo por texto (Diego Fortes) e figurino (Karen Brusttolin). É um musical fora dos padrões, repleto de metalinguagem e autoironia. Fortes adianta que a peça subverte o senso comum (leia entrevista com o autor e diretor):
– Penso que o sucesso, da maneira mais comum do nosso imaginário, é uma ilusão, um lugar que não existe, a não ser na fantasia de quem não o tem. Para mim, sucesso é ter a oportunidade de fazer coisas com algum propósito e junto de pessoas em quem se confia.
Leia, a seguir, a entrevista que o ator Alexandre Nero concedeu a Zero Hora por telefone.
ENTREVISTA
Alexandre Nero: "O artista tem que poder decepcionar"
Atores que trabalham na televisão costumam sentir necessidade de voltar ao teatro sempre que possível. O que há de especial no palco?
O que mais me interessa no teatro e que não tenho na televisão é o processo criativo. Na televisão, cada um faz o seu trabalho. Ninguém se intromete no figurino, na direção, na luz. No cinema, isso também ocorre bastante. No teatro, de certa forma, somos todos autores, diretores. É um time. Temos mais poder de criatividade.
E tem a presença do público.
Cada dia é um público diferente, as reações são diferentes. Tem dias que precisamos fazer um pouco mais engraçado porque o público não está rindo muito e tem vezes que temos que segurar as piadas porque estão rindo de tudo. O espetáculo é divertido, mas tem um lugar reflexivo. Se ficamos jogando as piadas gratuitamente, as pessoas podem apenas rir em vez de refletir. Precisamos sentir o público para poder transmitir o que queremos.
Quando um ator faz sucesso em novelas, uma parte do público o identifica muito com aqueles papéis e acaba tendo uma visão limitada de seu trabalho. Criam-se estereótipos. É o seu caso?
Sim. É o caso de todos. Quando você se torna um ator popular, inevitavelmente as pessoas vão acabar lhe atribuindo um determinado papel. Tem algumas pessoas que conseguem ver você (em sua complexidade), mas a maioria avassaladora não. Se eu falar em Caetano Veloso, você vai dizer: O Leãozinho. Sabemos que Caetano é muito maior do que qualquer música que tenha composto, mas popularmente é o cara de O Leãozinho. Acho que não tem como fugir disso.
Fazer teatro é também uma forma lembrar a si mesmo que seu talento é múltiplo e vai além do que se vê na televisão?
Sem dúvida. Não é à toa que fui a Curitiba chamar as pessoas que trabalhavam comigo. Bebi na fonte de quem sou. Para lembrar, rir, chorar e brigar com essas pessoas (risos). Mas confesso que estou louco para voltar para a TV, louco para fazer filme. Durante uma época, o teatro foi minha vida total. Agora, com as portas um pouco mais abertas, tenho tesão pela TV e pelo cinema também. A matéria-prima do ator é a mesma.
Sucesso é uma palavra muito usada, mas não há consenso sobre ela. O que o espetáculo diz sobre o sucesso?
Vivemos em um momento em que apenas o sucesso é vangloriado, as redes sociais dizem isso para nós. Todo mundo está sempre sorrindo, feliz. Os fracassos são escondidos. Temos vergonha dos fracassos, o que acho uma pena, pois nos engrandecem muito. Aliás, podem ser muito divertidos. O "grande sucesso" do título da peça, na verdade, é uma ironia. São oito personagens em tese fracassados, jogados em um canto. Esquecemos que, com o fracasso, damos grandes risadas, fazemos grandes amigos, aprendemos tanto. O sucesso nos leva para lugares esquizofrênicos. E é muito particular: o que é para mim pode não ser para você. Sucesso, resumidamente, é a gente se sentir bem. Agora, cada um se sente bem de uma forma diferente.
Muitas pessoas devem pensar que o seu sucesso começou na televisão, mas já havia uma trajetória antes.
Não é só para o ator. Para um jornalista, sucesso não é necessariamente se tornar o William Bonner ou escrever para determinado jornal. É muito particular. Para mim, aconteceu com o Comendador (da novela Império, 2014 – 2015). Me diziam: "Parabéns, você está fazendo sucesso". Como assim? Sempre fiz sucesso. Em Curitiba, sempre trabalhei dignamente. Nada mudou. Só comecei a ganhar mais dinheiro e fiquei mais conhecido. Fiz peças maravilhosas antes de entrar na Globo, gravei discos, fiz shows. Sucesso não tem a ver com a expectativa do outro, e sim com a minha.
Um artista ou um grupo de teatro que faz um espetáculo com pouco público, mas com o qual se realiza artisticamente, pode se considerar bem-sucedido?
Sem dúvida. Os Leões (2006), a peça que me levou para a Rede Globo, foi um grande sucesso, mas um fracasso de público. Nos apresentávamos para três, quatro, cinco pessoas. Mas foi um sucesso: viajamos pelo Brasil inteiro, recebemos as melhores críticas. Era um espetáculo fabuloso. Eu tinha um orgulho tremendo de fazer. Mas não tinha público (risos).
Por causa da fama, você acaba atraindo um público que não costuma ir ao teatro e acaba gostando?
Quero crer nisso. Optamos por fazer um espetáculo literalmente de teatro, porque não tem aquela dinâmica e aquela narrativa tradicional da TV. Hoje, não é porque você está no teatro que está fazendo teatro. Muitos atores estão levando TV para o teatro e para o cinema. Eu sabia que muitas pessoas iam assistir ao espetáculo e que eu iria decepcionar muitas delas. Acredito que o artista tem que poder decepcionar. Isso não significa fazer alguma coisa de que o público não goste: torço para que goste. Mas a ideia do artista é sempre levar algo que o público não espera ver. E acho que conseguimos. É um espetáculo original.
Ou seja, você não fica refém da expectativa do público.
Exatamente. As pessoas esperam que o ator da Rede Globo vai levar uma comédia romântica. Mas não foi dessa vez, talvez um dia (risos).
Em O Grande Sucesso, há uma crítica ao teatro mais hermético e de duração muito longa?
Na verdade, tiramos sarro de nós mesmos, pois nosso espetáculo é hermético (risos). Nossa peça não é longa (a duração é 105 minutos), mas é bastante hermética. É uma ironia o tempo inteiro. Estamos falando do nosso espetáculo. Quem assiste percebe isso na hora.
Quais são seus próximos projetos?
Em agosto, lançamos nos cinemas o filme em que interpreto o (pianista) João Carlos Martins. Em setembro, começa Filhos da Pátria na Globo, uma série de humor que fiz com Fernanda Torres e Matheus Nachtergaele, com texto de Bruno Mazzeo. Terminando a temporada da peça, começo a filmar em São Paulo Albatroz, com roteiro de Bráulio Mantovani (de Cidade de Deus e dos dois Tropa de Elite). Depois, começo a gravar Onde Nascem os Fortes, a próxima novela das 23h. Acho que vai ao ar em abril do ano que vem.
O GRANDE SUCESSO
Nesta sexta-feira (12/5) e sábado (13/5), às 21h, e domingo (14/5), às 18h. Duração: 105 minutos. Recomendação: 14 anos.
Theatro São Pedro (Marechal Deodoro, s/n°), fone (51) 3227-5100, em Porto Alegre.
Ingressos: R$ 50 (galeria), R$ 90 (camarote lateral), R$ 100 (camarote central), R$ 120 (plateia e cadeiras extras).
Desconto de 50% para sócios do Clube do Assinante e um acompanhante.
Ponto de venda com taxa: site blueticket.com.br. Ponto de venda sem taxa: bilheteria do teatro (hoje, das 13h até a hora do espetáculo, e amanhã e domingo, das 15h até a hora do espetáculo).