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Para o Brasil, era clima de Copa do Mundo. O Oscar inédito recebido por Ainda Estou Aqui na categoria de melhor filme internacional foi combustível para esquentar ainda mais o Carnaval no país. Mas a 97ª edição da cerimônia também foi a consagração do cinema independente e autoral.
Realizada na noite de domingo (2), em Los Angeles, a premiação foi especial para Sean Baker. Aos 54 anos, o cineasta americano se tornou a primeira pessoa a ganhar quatro estatuetas por um mesmo longa: melhor filme, melhor direção, melhor montagem e melhor roteiro original. Ainda, Anora rendeu a Mikey Madison o Oscar de melhor atriz, acumulando cinco vitórias na cerimônia.
Tendo custado US$ 6 milhões, Anora superou produções caras de grandes estúdios — como Wicked (US$ 145 milhões) e Duna: Parte 2 (US$ 190 milhões).
Um dos nomes de destaque do cinema independente contemporâneo dos Estados Unidos, Baker se notabilizou por longas como Tangerine (2015, que se destacou por ter sido filmado com celular) e Projeto Flórida (2017). Costumeiramente, suas histórias abordam personagens à margem da sociedade, excluídas do chamado "sonho americano" — o que também é trabalhado em Anora.
Além de Anora, outra consagração do cinema independente veio de Flow, que venceu na categoria de melhor animação. Realizado com orçamento baixo para os padrões da indústria hollywoodiana — pouco mais de US$ 3,5 milhões — e com uma equipe enxuta, o filme garantiu o primeiro Oscar da história da Letônia e superou produções da Disney (Divertida Mente 2) e Dreamworks (Robô Selvagem). Trata-se de uma animação sem diálogos, feita em um software gratuito chamado Blender.
Por outro lado, embora tenha conquistado duas estatuetas — melhor atriz coadjuvante (Zoe Saldaña) e melhor canção original (El Mal) — Emilia Pérez era a produção recordista de indicações na noite, concorrendo em 13 categorias, que saiu com bem menos do que planejava originalmente. Projeto ambicioso capitaneado pela distribuição da Netflix, o filme francês derreteu durante a campanha por conta das polêmicas envolvendo publicações ofensivas da atriz Karla Sofía Gascón.
Logo na abertura, o apresentador Conan O'Brien fez uma piada com a atriz:
— Karla, se você for tuitar sobre o Oscar hoje à noite, meu nome é Jimmy Kimmel (apresentador americano).
Aliás, a condução de Conan foi cumpridora, embora uma parte da audiência brasileira não tenha achado maior graça. Especialmente quando ele fez uma piada envolvendo Ainda Estou Aqui.
O apresentador disse que o longa era sobre “uma mulher que segue sua vida adiante e sozinha após seu marido desaparecer”.
— Minha esposa viu e o chamou de “filme de conforto” do ano — arrematou.
De qualquer maneira, o derretimento da campanha de Emilia Pérez abriu caminho para um Oscar inédito para o Brasil. O diretor Walter Salles recebeu a histórica estatueta das mãos de Penélope Cruz.
Nas outras categorias, algumas vitórias se confirmaram protocolarmente: a da já citada melhor atriz coadjuvante para Zoe Saldaña (que lembrou de suas origens dominicanas), por Emilia Pérez; a de melhor ator coadjuvante para Kieran Culkin por A Verdadeira Dor. Aliás, tanto Zoe quanto Culkin poderiam ter concorrido nas categorias principais de atuação, já que ambos os papéis também podem ser considerados como protagonistas seus filmes — aliás, essa é uma controvérsia recorrente nas temporadas de premiação.
Falando no vencedor de ator coadjuvante, Culkin fez o discurso mais caótico da cerimônia. Ele relembrou que sua esposa, Jazz Charton, havia prometido lhe dar mais dois filhos caso recebesse o Oscar. O casal já tem dois filhos. Então, o ator aproveitou para cobrar a promessa:
— Vamos agilizar essas crianças, amor?
Outra vitória esperada da noite ocorreu na categoria de melhor ator para Adrien Brody (com o discurso mais longo da noite), por O Brutalista. Era o segundo Oscar do ator, que já havia vencido em 2003 por O Pianista.
Porém, Brody bateu um recorde inusitado: realizou o discurso mais longo da história da cerimônia, com 5 minutos e 40 segundos. A marca anterior pertencia a Greer Garson — 5 minutos e 30 segundos —, quando recebeu a estatueta de melhor atriz, em 1943, por Rosa da Esperança.
Em sua fala, Brody refletiu sobre a carreira:
— Independente do que você já conquistou, tudo isso pode desaparecer. Sou muito grato por poder trabalhar com o que eu amo. Vencer um prêmio como este significa que tenho um destino.
O ator ainda acrescentou:
— Mas isso também é uma oportunidade de começar novamente, de provar nos próximos 20 anos da minha carreira que mereço papéis ambiciosos.