Em vida, Plauto Cruz (1929-2017) se consolidou como um dos maiores flautistas do país. Seu nome também se confunde com o choro, ritmo em que se tornou mestre. Agora, a trajetória de um dos mais eminentes músicos gaúchos é retratada no documentário Plauto, Um Sopro Musical, que estreia nos cinemas nesta quinta-feira (5).
Com direção de Rodrigo Portela, roteiro de Márcio Schoenardie e produção de Carlos Peralta, o longa da Guarujá Produções — sediada em Porto Alegre — soma elementos de musical e ficção ao documentário para contar a história de Plauto. O filme teve sua première em 2019, no 47º Festival de Cinema de Gramado, integrando a mostra de longas gaúchos.
Plauto, Um Sopro Musical marca a estreia de Portela no comando de um longa-metragem. Antes, ele escreveu e dirigiu curtas como Continuidade (1997), Só Algumas Cenas (2000), Rango (2007) e Reflexo (2017). Também foi um dos autores do longa Noite de São João (2003), de Sérgio Silva.
O cineasta foi convidado para o projeto por Peralta. Embora conhecesse por cima a obra de Plauto, ele logo se apaixonou pela música do instrumentista. Durante a construção do documentário, Portela e Schoenardie decidiram inserir encenações reconstruindo momentos chaves da vida do músico, desde sua infância.
Para essas recriações, o livro Plauto Cruz, de Kenny Braga, serviu como base. Rodadas em Bento Gonçalves e Porto Alegre, essas cenas são quase de cinema mudo, que não chegam a ter um som direto — embora amparadas pela música de Plauto.
— Quando surgiu esse convite, pensei em botar um pouquinho do cinema que eu amo – conta Portela. — Havia "N" situações do filme que a gente via que poderia trazer algo mais visualmente cinematográfico. Buscamos isso enquanto o roteiro era elaborado.
O grupo Sexteto Gaúcho atua tanto nas dramatizações quanto nos momentos musicais. Aliás, o violonista Mathias Berharends Pinto, que integra o conjunto e também coordenador da Oficina de Choro, é o responsável pela trilha sonora do filme.
Gente boa
Além de reunir fotos e vídeos de arquivo com entrevistas e apresentações, o documentário traz depoimentos de familiares, amigos e músicos sobre Plauto. Para isso, Portela reuniu os participantes em diferentes grupos para conversarem sobre o flautista, captando diálogos e falas. Nessas rodas de conversas, há nomes como Arthur de Faria, Juarez Fonseca, Kenny Braga, Hique Gomez, Paulinho Parada, Luiz Coronel, Renato Borghetti, Luiz Carlos Borges, Kleiton e Kledir, entre outros.
Nos depoimentos colhidos, a generosidade e atenção do instrumentista se sobressaem unanimemente. O diretor ressalta que houve uma pesquisa profunda para saber se havia algum elemento mais antagonista na vida do músico, mas nada foi encontrado. Além da excelência musical, Plauto ficou conhecido por sua bondade e doação.
— Todo mundo sempre exaltou ele como uma pessoa querida, disposta a ajudar os outros. Se algum amigo precisasse na madrugada, Plauto ia ao local tocar até de pijama, como já aconteceu. Sua principal preocupação era atender aos amigos. O amor pela música era tão grande que ele passava por cima de qualquer outro detalhe. Estava sempre disposto a tocar e a estimular as pessoas a ouvirem música — explica Portela.
Natural de São Jerônimo, Plauto era filho de José Alves da Cruz, um flautista de cinema mudo. Desde pequeno, ele já soprava flautinhas feitas de taquara, como mostra o documentário. O músico foi casado com Eva Maremy por quase 50 anos, com quem teve seis filhos, além de netos e bisnetos.
Ele iniciou sua carreira profissional nos anos 1950, apresentando-se em emissoras de rádio. No final daquela década, chegou a acompanhar a iniciante cantora Elis Regina em programas radiofônicos da capital gaúcha. Plauto tocaria, ao longo de sua trajetória, com nomes como Lupicínio Rodrigues, Orlando Silva, Ângela Maria, Silvio Caldas, Kleiton e Kledir (são dele os arranjos na clássica Maria Fumaça) e muito mais.
De acordo com o site Dicionário da MPB, Plauto gravou cinco discos como solista e mais de 40 como acompanhador. A estreia solo foi com o LP O Choro É Livre (1978). Também conquistou 60 prêmios em festivais como flautista e compositor.
O talento de Plauto é enfatizado nos depoimentos do documentário. Por conta de seu ouvido absoluto, era um perfeccionista em estúdio e, durante as apresentações, aprendia qualquer música rapidamente. Também era capaz de tirar notas de um simples copo.
Entre os entrevistados, há um consenso de que Plauto poderia ter tocado em filarmônicas na Europa ou obtido ainda mais visibilidade. Porém, ele quis ficar em Porto Alegre. Chegou a viver por um período em Curitiba, mas logo voltou ao RS.
— Enquanto colhíamos depoimentos, percebemos que Plauto não saiu da cidade por causa dos amigos e da família — aponta Portela. — Acredito que a grande busca dele era a música, não importava onde estivesse. Seu principal objetivo era a excelência em sua arte.