– Esse filme não é político – insiste o diretor Marcelo Antunez, ao iniciar comentário sobre sua superprodução (para os padrões brasileiros) Polícia Federal – A Lei é Para Todos. Vã tentativa. Por mais que seus autores neguem, o filme é ideológico até a medula. Espelha o ponto de vista da força-tarefa de policiais federais e procuradores da República que inverteu a noção de que corrupto não vai para a cadeia no Brasil. Agora vai – basta lembrar que mais de 400 "colarinhos-brancos" foram presos pela Operação Lava-Jato e outras similares desencadeadas nos últimos três anos.
Antunez e o produtor Tomislav Blazic garantem que a intenção inicial era fazer um filme sobre tráfico de drogas (outro assunto pelo qual o Brasil é notório), mas em conversas com policiais federais foram convencidos a abordar o grande sucesso da PF, a Lava-Jato. Pode ser. Há quem desconfie que o filme foi concebido por encomenda dos admiradores da Lava-Jato – até porque a lista de empresários financiadores dos R$ 16 milhões do custo do filme permanece um mistério, que a produção se recusa a revelar. O produtor alega que os financiadores preferem evitar polêmicas estéreis, mas enfatiza com orgulho que não há dinheiro público na iniciativa.
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Com objetivos propagandísticos ou não, o filme retrata uma realidade? Do ponto de vista de quem acompanha o cotidiano da Operação Lava-Jato, sim. Os federais que atuam em Curitiba realmente acreditam estar numa cruzada contra o mal (corrupção) e isso está bem retratado pelos personagens-policiais do filme. A obra das telas destaca que a Lava-Jato não foi pensada para atingir um partido ou partidos do poder – foi fruto do acaso, uma investigação sobre tráfico e lavagem que esbarrou num doleiro que "limpava" dinheiro de corruptos das estatais e empreiteiras. Os documentos (pedidos de prisão, denúncias, sentenças) dos últimos anos mostram que isso é verossímil.
Os federais da tela são composição de vários policiais de verdade. Antônio Calloni uniu na ficção dois delegados da vida real, Igor Romário de Paula e Luciano Flores de Lima. A delegada do filme, vivida por Flávia Alessandra, é inspirada em Erika Marena, que atua em Curitiba – só que sua participação é vitaminada. Empoderaram a personagem, de olho no público feminino. Algumas cenas de ação existiram, outras foram encorpadas, numa licença poética para dar dinamismo a um filme que poderia ser tedioso se ficasse na papelada dos desvios de dinheiro.
O filme tem alguns pecados? Sim. Na tela, procuradores da República e policiais federais interagem por música, quando sabemos que a relação entre eles muitas vezes é tensa e beira o antagonismo na hora de conduzir delações premiadas. O diretor optou por dar nomes reais aos políticos e empresários (Lula, aliás, aparece só com uma faceta ranzinza e antipática), mas deu pseudônimos aos policiais. Por que essa diferenciação? Até para driblar a acusação de maniqueísmo, alguns delegados-personagens dizem que votaram no PT e debatem a Lava-Jato em família (como tem ocorrido, aliás, em qualquer família brasileira). Se o filme carrega contra os petistas nesse primeiro momento, as continuações (sim, será uma trilogia e o roteiro do segundo já está no fim!) devem bater nos tucanos e nos peemedebistas. Ficou claro que diretor sonhe com um Tropa de Elite, com policiais de elite como personagens. Inclusive com retorno financeiro similar. Agora é ver se os fãs correspondem.