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Em meio à riqueza de sotaques surgida na música brasileira na década de 1970, as vozes de Luhli e Lucina ganharam projeção graças à qualidade de seu trabalho e ao pioneirismo comportamental de suas intérpretes. Raríssima parceria estável entre compositoras, a dupla escreveu mais de 800 músicas – a maioria inéditas – e foi gravada por nomes como Nana Caymmi, Tetê e Alzira Espíndola, Joyce Moreno, Rolando Boldrim e Wanderléa. Amigo das compositoras, Ney Matogrosso já registrou diversas canções das duas, como Bandoleiro, Coração Aprisionado, Êta Nóis e Pedra de Rio; já O Vira e Fala, clássicos dos Secos & Molhados, têm a assinatura de Luhli.
Eleito o melhor filme pelo júri e pelo público no Festival In-Edit Brasil em 2015, Yorimatã narra a história dessas aves raras da MPB. Primeiro longa dirigido por Rafael Saar, o documentário em cartaz no CineBancários destaca também o aspecto sociológico do duo: na vanguarda alternativa da contracultura que chegava ao país no começo dos anos 1970, Luhli e Lucina formaram uma família a três ao lado do fotógrafo Luiz Fernando Borges da Fonseca – morto em 1990, vítima de um câncer – e desbundaram com o idílio da vida em comunidade hippie morando em um sítio no litoral do Rio.
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Para além dos depoimentos atuais de artistas como Ney Matogrosso, Gilberto Gil e Zélia Duncan, o tesouro da produção está no acervo de imagens de arquivo, garimpado entre filmes domésticos de Luhli e Lucina e registros de apresentações. O material revela a singular sonoridade do duo – uma espécie de casamento entre a força percussiva dos tambores religiosos afro-brasileiros com influências melódicas da bossa nova, do folk, da música caipira e até do flamenco espanhol.
Mistura de iorubá com tupi-guarani, yorimatã significa "salve a criança da mata" – nome de uma canção de Luhli e Lucina, a palavra é utilizada por ambas como um tipo de chave para abrir caminhos. Um bom título também para esse documentário que apresenta para o grande público duas cantoras, compositoras, violonistas e percussionistas que misturaram arte, amor e sonho em uma obra musical única.
YORIMATÃ
De Rafael Saar
Documentário, Brasil, 2014, 116min.
Em cartaz no CineBancários.
Cotação: 4