A imagem de mãos ao lado foi tirada de um vídeo que Hélio Fervenza exibe em sua nova exposição, Tempos Reversos, com inauguração nesta sexta-feira (4/5), à noite. Mas, sozinha, diz muito pouco sobre a mostra. De caráter conceitual, o trabalho do artista gaúcho exige que o espectador dedique tempo tanto à obra quanto ao seu contexto – neste caso, a Galeria Mamute, onde os trabalhos foram distribuídos cuidadosamente entre a entrada e duas salas.
Feito com fotografias, o vídeo integra a instalação Relógios: Dias de Areia: Segundos de Chuva. Mostra um fio de areia escorrendo entre dois pares de mãos, espécie de ampulheta humana. Enquanto assiste, o espectador é convidado a manipular um pau-de-chuva, que aqui é uma versão "estilizada" de um tubo com contas em seu interior. Inclinando o instrumento, fabrica-se uma trilha sonora para o vídeo.
– O suporte da obra são pessoas, as mãos pertencem a uma adolescente e a uma mulher adulta, então, metaforicamente, estou misturando tempos – diz o artista, que é professor de gravura no Instituto de Artes da UFRGS e um pesquisador acostumado a discorrer sobre cada aspecto do seu trabalho.
Obras conversam com o espaço expositivo
A instalação começou a ser desenvolvida na Bienal de Yakutsk (Rússia, 2014). Aqui, compõe o que Hélio chama de "miolo" da exposição. Duas séries a completam e, de maneiras diferentes, também refletem sobre espaço e tempo. Remanescências pede que o visitante se desloque pela galeria. É composta por cinco peças de acrílico em formato de colchete. Cada uma traz uma data decisiva para a história do Brasil, de 1500 a 2016. Percorrer a galeria torna-se, assim, atravessar simbolicamente essa história, atualizando-a, já que fazemos isso no presente.
– Na medida em que tu te desloca, tu vai criando uma relação entre as datas. E esses tempos também te atravessam porque continuamos vivendo os efeitos do passado – comenta o artista, ressaltando o motivo do formato: – O colchete interrompe, mas também indica uma continuação.
Os sinais gráficos são parte importante da obra de Hélio há décadas – nos anos 1990, uma instalação sua convidava as pessoas a se colocarem entre parênteses numa parede. As chaves entraram na sua poética quando o artista representou o Brasil na 55ª Bienal de Veneza, em 2013, e reaparecem agora, na instalação Relógios...
– Duas chaves juntas, para mim, é o abre e fecha conectado no mesmo símbolo.
A linguagem é a protagonista da terceira série da mostra, um conjunto de 10 gravuras chamado de Inversões (2018). Nela, Hélio carimba sobre papel de arroz pontuações como vírgulas, chaves e dois pontos, além de palavras que variam de posição e tamanho até perderem o sentido.
– Funciona como um comentário sobre os dias atuais, em que toda hora tu te confronta com situações em que a linguagem parece ter entrado em crise, enlouquecido.
Segundo Fervenza, o tempo tornou-se um assunto especialmente importante desde a sua participação na 30ª Bienal de São Paulo (2012), onde expôs uma pequena retrospectiva de seu trabalho. Em Tempos Reversos, o espaço arquitetônico é usado para falar desde o tempo subjetivo, que é vivenciado no próprio corpo, até o histórico, comum a todos. Mas a mostra vai muito além disso. É preciso caminhar por ela para ver.
Tempos Reversos
- De Hélio Fervenza
- Curadoria de Eduardo Veras
- Abertura sexta-feira (4/5), às 19h.
- Galeria de Arte Mamute (Rua Caldas Júnior, 375).
- Visitação de segunda a sexta, das 13h às 18h, a partir de segunda-feira (7/5) até 25 de agosto de 2018. Entrada gratuita.
- Mais informações: 3286-2615 ou contato@galeriamamute.com.br.