Houve um tempo em que o futebol amador animava as tardes de domingo no bairro Petrópolis e arredores, em Porto Alegre.
— Não se tinha muito o que fazer no fim de semana, então, lotavam os nove campos da região. Hoje, só temos dois (Ararigboia e Tamandaré) — diz o projetista de desenho mecânico e arquitetônico Luciano D’Alascio, de 79 anos.
Com outros jovens do bairro, ele fundou o Dínamo Atlético Clube — que adotou o slogan “A Máquina de Petrópolis” — em 18 de novembro de 1956, aos 15 anos de idade. A equipe, que joga no campo do Praça Tamandaré, tem 21 títulos conquistados, entre campeonatos e copas. Nos anos 1950, o esporte amador se organizava em diretórios da Federação Gaúcha de Futebol. O de Petrópolis — que também reunia times como Bagé, Concórdia, Bonsucesso, São Luís, Vila América e Universal — tinha como sede o bar São Rafael, na Protásio Alves, local em que a turma bate ponto até hoje.
— Fiz festa aqui quando era menor de idade — diz Jaime Michielon, de 77 anos, que nunca vestiu o uniforme do Dínamo, mas faz parte da diretoria desde a fundação.
Por falar nisso, no começo, o fardamento era todo vermelho. Para desespero da mãe, preocupada com manchas espalhadas pela casa, D’Alascio fervia dois latões de tinta encarnada para tingir camisas, calções e meias.
— É que tinha muito mais colorados do que gremistas. Éramos minoria, e tínhamos que aceitar — justifica ele.
Com o tempo, o azul foi introduzido no uniforme para acomodar as duas torcidas. Já o nome se inspirou nas sessões do Ritz, cinema com fachada art déco (já demolido) da Avenida Protásio Alves. Antes de começar o filme, a rapaziada assistia ao cinejornal, que exibia partidas de seleções europeias, o que estimulou D’Alascio a pesquisar clubes da Europa. Descobriu o ucraniano Dínamo, de Kiev (não o de Moscou, ressalta ele), nome que achou bonito e propôs que fosse adotado em Petrópolis.
Poucas equipes amadoras da Capital viajaram tanto quanto o Dínamo, que percorreu todo o interior do Estado e jogou também no Uruguai e na Argentina, relata Sílvio Toniolo, de 73 anos, que vestia a camisa 8 de ponta de lança. Já D’Alascio chegou a jogar também profissionalmente, como centroavante, em Santa Catarina, Mato Grosso e Rondônia, até que, aos 26 anos, estourou o joelho esquerdo.
— Fazia os meus golzinhos. Mas, naquele tempo, curar uma lesão no joelho não era tão simples como hoje, e eu tive que parar.
As finais dos torneios amadores aconteciam na Timbaúva, do Força e Luz (que disputou campeonatos profissionais até 1959), na Rua Dr. Alcides Cruz, atrás do Hospital de Clínicas. O recorde de público do Dínamo foi a decisão da Copa Ajax de 1985, quando venceu o La Salle, de Esteio, por 1 a 0 diante de 4.360 espectadores. O gol foi de Nica, ponta-direita habilidoso que, em seguida, foi parar na Finlândia. Segundo D’Alascio, a várzea era o celeiro dos clubes profissionais.
— Eu te faço uma lista com 40 caras que saíram dos campos de Petrópolis para times importantes, como o Cláudio e o Higino, que jogaram no Corinthians. Isso em 1950 e uns quebrados.
Não à toa, Abílio dos Reis — célebre garimpeiro de talentos do Internacional — estava sempre por perto.
As negociações se davam na base do escambo. Volnei, ponta-esquerda do Bagé, foi para o Grêmio em troca de 25 bolas de couro. Já o Caxias cedeu um par de redes para levar o zagueiro Rui Leão.
Atualmente, o Dínamo ainda joga amistosos, mas não há mais campeonatos, o que não diminui o entusiasmo dos veteranos craques. Afinal, o time amador transcendeu a dimensão de seu propósito original e se transformou em um espaço de entretenimento e diálogo comunitário. Tanto que o jantar de comemoração dos 60 anos, em 2016, reuniu 523 pessoas no Clube Farrapos, com direito à música do conjunto Caravelle.
— Agora, estamos esperando passar a pandemia para fazer a festa dos 65 anos — antecipa D’Alascio.