Igrejas evocativas, românticas ruas de paralelepípedos, cafés novos e descolados ou museus excêntricos: o que os habitantes de Bratislava, capital da Eslováquia, sugerem que os visitantes vejam primeiro?
- Viena - disse, brincando, meu amigo Peter, que havia acabado de voltar à terra natal depois de passar vários anos fora.
Essa talvez não seja a dica mais útil do mundo, mas realmente destaca a fácil acessibilidade de Bratislava, que fica a apenas uma hora de Viena, cerca de duas horas e 40 minutos de Budapeste, na Hungria, e cerca de quatro horas de Praga, com trens e ônibus diretos de todas as três cidades.
Uma cidade intimista e de fácil locomoção, com cerca de meio milhão de habitantes, Bratislava é um excelente refúgio dos destinos mais badalados da região, especialmente se você já estiver farto das multidões das cidades grandes.
A capital eslovaca também oferece encantos centro-europeus parecidos (história rica, arquitetura impressionante e restaurantes e vida noturna agitados), como eu descobri durante um final de semana que passei lá este inverno.
Peter, apreciador de cerveja, havia sugerido que nos encontrássemos no Richtar Jekub (Moskovska 16; richtarjakub.sk), o primeiro pub da cidade a ter sua própria cervejaria, que abriu em um bairro residencial ao nordeste de Stare Mesto, a Cidade Antiga, em 2008.
Até o momento da minha chegada no bar, eu já havia visto o bastante da cidade para desconsiderar sua recomendação sobre Viena, e já havia até reunido minhas próprias dicas de Bratislava.
Havia sentido o clima de Bratislava caminhando pelas labirínticas ruas para pedestres de Stare Mesto, que tem vários portões antigos da cidade, além de restos de suas antigas muralhas fortificadas.
Depois de conferir as estranhas coleções de potes de boticário e armários de remédios antigos e ornamentados do Museu da Farmácia, subi e contei os 110 degraus de pedra e madeira que levam ao topo da Torre de São Miguel, que fica ao lado e fazia parte das fortificações originais que defendiam a Cidade Antiga.
Ao chegar no topo, abri uma pequena porta e alcancei a estreita plataforma de observação da torre, absorvendo o pôr do sol sobre os telhados de Stare Mesto. O atarracado Castelo de Bratislava se encontrava no alto, sobre um morro diante de mim, enquanto o som dos sinos das igrejas ecoavam pelas ruas medievais.
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A vista foi de tirar o fôlego, e mais surpreendente ainda foi não encontrar nenhum outro turista bloqueando a paisagem. Tive uma experiência particular parecida no excêntrico Museu dos Relógios, que ocupa um edifício estreito em formato triangular e tem relógios de pulso, de parede e de mesa pouco comuns.
Por que será que não havia mais nenhum visitante admirando as enormes peças do tamanho de mesas, cobertas de figuras laminadas da era barroca? Imaginei, com uma certa inveja, que todos deveriam estar se divertindo no Museu de Apicultura a céu aberto no vilarejo vizinho de Kralova pri Senci, que eu havia infelizmente deixado para outra viagem.
Apesar da falta de turistas, muitos cafés de Stare Mesto parecem estar indo bem, especialmente o Shtoor. Batizado em homenagem a Ludovit Stur, líder do renascimento cultural e da batalha contra a dominação austro-húngara no século 19, o cardápio do Shtoor tem sabores internacionais, como o "chai latte", além de pratos claramente locais, como o sanduíche aberto com "bryndza" ácido, um tipo de queijo cremoso cujo nome é um dos indicadores geográficos protegidos da Eslováquia.
Em todo lugar aonde eu ia, encontrava sabores locais parecidos, como os elegantes vinhos produzidos com alibernet, um cruzamento leste-europeu pouco conhecido das uvas cabernet sauvignon e alicante bouschet, que é capaz de gerar tintos surpreendentemente encorpados.
Em um canto do enorme Palácio Erdody, em Stare Mesto, o elegante wine bar Elesko tem taças de seu próprio barrique alibernet de 2008 por 5,80 euros (R$ 13,70). Para terminar o dia, parei no elegante terraço do Sky Bar, onde fui bem recebido, apesar de não ser tão bonito, magro e loiro quanto o resto da clientela.
O bar, na praça mais fotogênica de Bratislava, tem vistas de toda a cidade e do Danúbio atravessando o seu coração. Enquanto absorvia a vista (que, por algum motivo, repentinamente passou a incluir fogos de artifício), um garçom pacientemente me ajudou com os enormes nomes das 80 vodcas da carta, das quais a mais cara era uma marca russa, Kauffman Private Collection, cuja dose custava 40 euros (R$ 95).
Bebericando lentamente uma extremamente suave e carismática vodca eslovaca, a Double Cross (7,90 euros, ou R$ 19, a dose), enquanto via a beleza das pessoas dentro do clube e o show de pirotecnia lá fora, tive quase certeza de que não conseguiria encontrar tanto charme inesperado em Viena.
Glória histórica
A história da cidade rapidamente me conectou à glória dos dias da Áustria e da Hungria. No graciosamente reformado Museu da Cidade de Bratislava, passei por uma capela dedicada ao rei húngaro, São Ladislau, onde afrescos do século 15 enfeitavam as paredes sob esculturais arcos da Renascença.
Na sala seguinte, um mapa de Viena de 1430 mostrava Bratislava (então conhecida como Pressburg em alemão, Presporal em eslovaco e Pozsony em húngaro) como nada mais do que um subúrbio da capital austríaca.
Com a ocupação turca de boa parte da Hungria, depois da batalha de Mohács, em 1526, Bratislava passou a servir como a capital húngara por cerca de três séculos. Durante esse período, 11 governantes do império austro-húngaro, entre eles a grande Maria Teresa, foram coroados na Catedral de São Martinho, em Bratislava.
Passando pela igreja à tarde, me pareceu que nada havia mudado desde os tempos da última mulher Habsburgo a governar. À distância, o prédio tinha a forma pontiaguda familiar de muitas igrejas de vilarejos, e portanto parecia bem menor. Mas, ao me aproximar dele pelas ruas sinuosas da Cidade Antiga, a forma se tornou muito maior.
Ao contrário da bem mais ornamentada Stephansdom, em Viena, ou da Basílica de Santo Estevão, em Budapeste, não havia ninguém tirando fotos do lado de dentro, o que me permitiu bastante tempo para absorver sozinho a sombria e romântica vastidão gótica.
De vinho a cervejas
Embora a Eslováquia seja mais conhecida por seus vinhos, um interesse recente por cervejas de qualidade trouxe para a cidade, nos últimos quatro anos, quatro novos pubs que têm suas próprias cervejarias.
O primeiro, o Richtar Jakub, oferecia 10 variedades consistentes de cervejas na pressão, incluindo a lager escura da própria casa, além de marcas checas e eslovacas mais obscuras e menores, como a Chotebor e a Urpiner. Em termos de cerveja, a novidade mais recente era a chegada, no ano passado, do Zamocky Pivovar, um lounge limpo em estilo de bar de coquetel que não fica muito longe do Museu do Relógio.
Pelo menos em termos de atmosfera e clientela cosmopolita, a nova onda de pubs com cervejarias provavelmente atinge o seu auge no Bratislavsky Mestiansky Pivovar, ou Cervejaria da Cidade de Bratislava, um pub lindamente reformado com vários andares ao lado da principal rua comercial de Obchodna.
Na manhã seguinte, impulsionado pela minha noite rica em calorias, subi o morro do castelo para uma última vista de Bratislava antes do meu trem matinal para Praga. Perto do topo, deparei com um casal de adolescentes praticando parkour no muros e degraus, correndo direto pelo centro da calçada.
Percebi que isso seria impossível de fazer nas capitais maiores ao redor, por causa das multidões, mas aqui não havia ninguém para atrapalhá-los. Eles continuaram com suas tentativas de correr, pular e rodopiar no ar enquanto eu passava. Como eu, eles pareciam amar o fato de ter aquele lugar mais ou menos só para eles.