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Por Lorena Caleffi*
E se, mesmo sem você atender por Rapunzel ou Cinderela, um príncipe encantado aparecesse, repentinamente, na sua vida? Se no lugar do cavalo branco ele trouxesse uma série de promessas — mas também alguns pedidos?
Ao contrário dos contos de fadas antigos, as histórias recentes não começam com "era uma vez" e tampouco terminam com um "felizes para sempre". Cada vez mais, vemos golpistas travestidos de "mocinhos" para subtrair valores e a autoestima das suas vítimas. É o chamado estelionato afetivo ou amoroso.
A prática é mais corriqueira do que imaginamos — um levantamento feito pela organização Era Golpe, Não Amor, em 2022, revelou que quatro em cada 10 brasileiras já haviam sido impactadas por esse tipo de crime. E tem ficado mais sofisticada.
Golpistas têm se passado por famosos para roubar dinheiro de mulheres. Um dos casos recentes de grande repercussão foi o de uma francesa de 53 anos que acreditava estar namorando o ator Brad Pitt.
Conforme noticiado, o falsário teria pedido dinheiro — equivalente a R$ 5 milhões — para custear um tratamento de saúde. Aqui no Brasil, há poucos meses, uma idosa também caiu em um golpe ao enviar valores para o suposto namorado, Elon Musk.
Estamos sujeitos a enganos
Ainda que mal compreendidas, existem razões para explicar por que algumas pessoas acreditam nessas ciladas.
A primeira, e aparentemente óbvia, é que, como seres humanos, estamos sujeitos a enganos. Quem nunca se enganou — em uma relação íntima, comercial ou de outra esfera — é, definitivamente, um sujeito de sorte! Contudo, há outras hipóteses.
Um aspecto é a imaturidade emocional das vítimas. Mesmo adultas, com responsabilidades em casa, no trabalho e com filhos, podem ser imaturas do ponto de vista emocional, sobretudo diante de situações de estresse. Assim, o indivíduo se torna incapaz de lidar com as obrigações — e uma promessa de "solução mágica" pode parecer tentadora.
As vítimas não devem ser julgadas, sob pena de serem punidas três vezes: pelo prejuízo emocional, pelo patrimonial e pela consideração social
Outra hipótese diz respeito a pessoas com algum grau de frustração ou ausência de objetivos de vida. Ou, ainda, com dificuldades de autovalorização. Elas são mais propensas a crer em uma solução externa "fácil", pois mudar demanda um esforço que acreditam não ter.
Logo, elogios, promessas de cuidados, fantasias sobre uma "vida melhor" também encontram solo fértil nesses indivíduos, pois os eximem desse esforço de mudança. Normalmente, as vítimas têm baixa autoestima, estão enfrentando crises depressivas ou estão passando por situações de perda ou luto.
Vítimas de classe média-alta
E engana-se quem pensa que caem nesses golpes apenas pessoas em situação de vulnerabilidade social. Uma pesquisa do Ministério Público analisou quase 40 casos desse tipo de violência patrimonial no Distrito Federal. Os resultados mostraram que as vítimas eram, predominantemente, residentes de bairros de classe média-alta e com renda acima de três salários mínimos. Em comum, o fato de serem, na maioria, mulheres brancas entre 25 e 44 anos.
Isso chama a atenção, pois justamente nos remete às fábulas infantis, que contam histórias de mulheres que foram "escolhidas pelos príncipes", que foram consideradas "especiais", deixando para trás uma vida de sofrimento. Mulheres com esse tipo de funcionamento emocional podem ser vítimas de golpes afetivos.
É preciso analisar caso a caso
Apesar das hipóteses, é preciso lembrar que cada um tem um funcionamento psíquico individual. Logo, devemos analisar particularmente caso a caso.
A única certeza, em situações como essas, é que as vítimas não devem ser julgadas, sob pena de serem punidas três vezes: pelo prejuízo emocional, pelo patrimonial e pela consideração social. Como seres humanos, e não personagens de contos de fadas, repito, somos vulneráveis — e passíveis de erros.
* Lorena Caleffi é médica psiquiatra do Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre