Se a flâmula posta na entrada da prefeitura o identifica como “município da canção italiana”, é verdade que Coqueiro Baixo está conhecida nacionalmente por um motivo bem diferente: localizada no Vale do Taquari, a cidade registrou a maior proporção de idosos do país pelo segundo Censo Demográfico consecutivo. Enquanto o percentual brasileiro, em 2022, foi de 13,46% de pessoas com 60 anos ou mais no total da população, na pequena localidade o índice foi três vezes maior – de seus 1.290 habitantes, 502 (38,91%) estão nessa faixa etária.
Normalmente, é força de expressão. Em Coqueiro Baixo, porém, a máxima de que todo mundo se conhece é verdadeira. Formado por uma zona rural e duas ruas principais na área urbana, o município já pertenceu a Encantado, Arroio do Meio e Nova Bréscia. Há 22 anos, conseguiu sua emancipação e vive, segundo os moradores, a sua melhor fase.
— Ah, aqui é maravilhoso. É uma vida saudável, tranquila, linda — resume Iride Salami, 77 anos.
Moradora há 47 anos na localidade, junto ao seu marido, Jorge Paulo Salami, 77 anos, a idosa se junta ao coro dos conterrâneos, que dizem que os serviços de saúde e educação são bons e gratuitos na cidade, e que a insegurança é zero.
— A vida é muito tranquila. Eu só cerquei a casa por causa deste aqui (aponta para Pingo, o cachorrinho preto do casal, que se aconchegava no colo do dono), porque, na rua, é muito fácil de ser atropelado — relata Jorge.
De fato, há poucas residências com cercas em Coqueiro Baixo. Nas que têm, as grades costumam ser baixas – como todos se conhecem, quando surge alguém anônimo na cidade, a presença é evidente para os moradores.
Serviços públicos de qualidade
Na visita da reportagem de GZH ao município, na última terça-feira (31), oito habitantes foram entrevistados, e tantos outros bateram papo com a equipe. Era consenso entre todos a qualidade dos serviços públicos prestados.
Com um custo de vida baixo e o bom poder aquisitivo da população, o Centro de Referência em Assistência Social (CRAS), por exemplo, é muito usado para atividades como aulas de dança sênior e artesanato. Ao lado do posto de saúde – também muito elogiado pelos moradores – uma academia funciona de forma gratuita, com professoras oferecendo diariamente treino funcional para idosos, pilates, alongamento, entre outros tipos de exercício. Com acesso a atividades físicas, morando em uma localidade onde não há necessidade de se deslocar de carro e na qual quem ainda trabalha realiza funções majoritariamente rurais e não sedentárias, é raro ver cidadãos coqueirenses acima do peso.
Acho que não tem ninguém aqui, dos idosos, que não tem filhos pra fora. A maioria procura trabalhar nos restaurantes em São Paulo, Rio de Janeiro.
LUIZ MATUELLA, 71 ANOS
Morador de Coqueiro Baixo
No posto de saúde, a comunidade encontra um bom atendimento básico e encaminhamentos. Quando a demanda é um pouco mais complexa, basta rodar 10 quilômetros para chegar ao hospital de Nova Bréscia. Para consultas com especialistas e realização de exames, a prefeitura faz o transporte para um centro urbano maior, como Porto Alegre. Tudo de graça.
Tradição em espeto corrido
As histórias dos habitantes de Coqueiro Baixo se repetem – via de regra, nasceram lá, ou em alguma cidade próxima. Muitos saíram do município quando jovens, para abrir churrascarias ou trabalhar em uma, e regressaram mais tarde. Hoje, veem os filhos fazerem o mesmo. É o caso de Íris Maria Locatelli, 78 anos, que morou com o marido em São Paulo e em Minas Gerais.
— Trabalhávamos em uma churrascaria em São Paulo e, depois, compramos uma em Minas. Voltamos porque acabou o contrato lá, e a gente estava cansado, também. Aqui, pegamos uma lancheria e criamos gado — conta Íris.
A cidade é conhecida como a terra onde nasceu o criador da churrascaria de espeto corrido, Albino Ongaratto. Desde os anos 1960, muita gente sai de lá para abrir empreendimentos em outros Estados e até países. Quando vão, levam conterrâneos para trabalharem nos locais, por serem pessoas consideradas de confiança. A tradição deu tão certo, que o município exibe casarões imponentes, cujas construções foram fruto do sucesso dos rodízios.
— A juventude procura uma vida melhor nos restaurantes, e assim por diante. Acho que não tem ninguém aqui, dos idosos, que não tem filhos pra fora. A maioria procura trabalhar nos restaurantes em São Paulo, Rio de Janeiro — relata Luiz Matuella, 71 anos.
Ao lado de Matuella, Ademir de Paoli, 80 anos, diz que o filho chegou a ganhar 11 salários-mínimos trabalhando em uma churrascaria em Canoas.
— É um meio de vida. Na época, eles ganhavam bem. Hoje caiu tudo, né? — lamenta o idoso, que, após um período no quartel, voltou para Coqueiro Baixo para trabalhar como produtor rural.
Uma das exceções de jovem que resolveu seguir em Coqueiro Baixo é Vanessa Mocellin Rusin, 21 anos – uma das 53 pessoas entre 20 e 24 anos moradoras da cidade. Aos 17 anos, na hora de decidir entre se mudar para estudar ou encontrar uma função ali mesmo, decidiu abrir uma barbearia dentro do mercado da mãe.
— Eu gosto bastante de morar aqui. Tipo assim, eu gosto de ir para a cidade e tal, onde tem bastante coisa pra fazer, mas, pra morar, eu prefiro aqui. Eu não sei se eu sairia daqui pra morar numa cidade grande — conta Vanessa, que diz que o asfaltamento do acesso a Nova Bréscia, feito recentemente, facilitou as idas e vindas.
Receita oriunda da agricultura
Vice-prefeito de Coqueiro Baixo, Valmor Salvi afirma que, apesar de haver muitas pessoas aposentadas e que, portanto, não contribuem com a geração de renda para o município, a cidade consegue ter uma boa receita, já que a agricultura, lá, é forte. O setor tem grande participação na riqueza local, especialmente na produção de suíno, de frango e de leite. Por isso, é possível viabilizar bons serviços para a população.
— Não é porque eu sou vice-prefeito, mas o posto de saúde, aqui, é muito bom. Por isso, os idosos vivem bem, tranquilos, e não saem daqui — explica o vice-prefeito.
Perguntado sobre o motivo de a cidade se chamar Coqueiro Baixo, Salvi diz que não sabe muito bem, mas que há lendas sobre isso. Somada ao relato de Jorge Salami, a história fica mais ou menos assim: antigamente, passavam pela região comerciantes, transportados por mulas. Para saberem onde estavam, usavam como referência dois coqueiros – um alto e um baixo. Ambas as árvores batizaram duas linhas na região, Coqueiro Alto, que segue como linha, e Coqueiro Baixo, que foi emancipada.