
Com tantos dias de chuva no Rio Grande do Sul – resultando em tragédias históricas e no mês de setembro mais chuvoso em Porto Alegre desde 1916 –, o humor e o comportamento das pessoas podem ficar abalados. Para além da crença popular, o tempo tem influência na manifestação dos sentimentos também de acordo com especialistas.
— Normalmente as pessoas fazem essa aproximação do sol com a felicidade, com o bem-estar, e da chuva e do frio com a coisa da tristeza e estarmos mais deprimidos. Não é por acaso, é porque realmente existe uma queda na produção da serotonina com a falta do sol — afirma o psicólogo Rodolfo Urruth, mestre em Psicologia Clínica.
A serotonina é um neurotransmissor responsável pela regulação de uma série de fatores, como o humor, o sono, a libido, a ansiedade, o apetite, a temperatura corporal, o ritmo cardíaco e, sobretudo, a satisfação e o bem-estar. No entanto, existe uma redução da produção da serotonina – que necessita de vitamina D – na ausência do sol. A vitamina acelera a produção do aminoácido triptofano, que, por sua vez, é utilizado pelo cérebro para a produção da serotonina. Outro neurotransmissor que pode ser afetado é a dopamina, também ligado ao humor e ao prazer.
Além disso, os dias de chuva trazem mudanças na rotina, diminuindo a possibilidade de atividades ao ar livre, o que também pode impactar o emocional. Urruth alerta para a importância de estar atento a sintomas como falta de energia ou disposição, dificuldade de concentração, sentimento de desesperança – que pode estar relacionado a quadros mais graves, como transtorno depressivo ou transtorno afetivo sazonal, que costuma surgir na mudança das estações. Porém, os sintomas podem surgir em outros momentos.
Vivências podem interferir
Dan Montenegro, psicólogo e doutorando em Psicologia Social na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), lembra que a reação varia de pessoa para pessoa: para algumas, um dia chuvoso pode ser um fator de estresse, pela necessidade da mudança de planos ou rotas, enquanto, para outras, pode remeter a memórias saudosas. A chuva também pode estar associada a preocupações, dependendo das circunstâncias em que a pessoa vive – alguém que mora perto de regiões atingidas pelas cheias de rios, por exemplo, poderá passar a ter outra relação com a chuva.
— Não é só a chuva, é uma chuva que pode se transformar em tempestade, que pode durar muito mais do que o previsto, nos surpreender de alguma maneira — afirma Montenegro.
O psicólogo também frisa a importância de refletir sobre como as mudanças climáticas podem estar reconfigurando a relação com o tempo e o clima. Se antes os efeitos já eram sentidos no humor e no comportamento, o especialista acredita que, agora, isso tende a se agravar, porque os estímulos ambientais também estão se transformando.
— A gente tem uma escala muito maior de afetação com esse tempo, porque além das intempéries naturais, da chuva, do frio e do calor, a gente tem isso em uma escala muito maior, que pode ter consequências mais desastrosas. Então a gente vai ter também um ganho no sentido de maiores preocupações, de um estado de vigília, provocado pelo medo do que pode acontecer, das consequências dessas mudanças climáticas — enfatiza.
Medidas para mitigar impactos
Contudo, há medidas que podem ser tomadas para mitigar o impacto do tempo no humor e no comportamento. A principal é a exposição à luz solar, nos dias sem chuva, ou à luz artificial com comprimentos de onda aproximados ao da luz do sol, conforme Urruth. A reposição de vitamina D também pode ser uma alternativa em caso de deficiência, com base em recomendação médica. Ainda, o exercício físico e uma alimentação saudável também contribuem para a saúde em geral.
Além disso, Urruth destaca que é fundamental buscar ajuda psicológica ou psiquiátrica com profissionais que possam diagnosticar e indicar os tratamentos adequados para as pessoas que estejam sentindo prejuízos na vida.
Dan Montenegro lembra que é preciso avaliar quais estratégias cada pessoa pode dispor para enfrentar este momento. A sugestão é apostar em atividades dentro de casa, já que sair na chuva pode ser mais difícil e, inclusive, representar riscos para algumas pessoas. Rodolfo Urruth também recomenda buscar mais a rede de apoio, como amigos e família, para quebrar a rotina, ser criativo e se reinventar.
— É nesses momentos que tem de buscar, quando está mais indisposto, tente fazer isso para recarregar as energias. Procurar amigos e atividades diferentes. Essa falta de energia vem de necessidades emocionais que a gente tem e precisa suprir nessas relações — explica Urruth.