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O jornalismo gaúcho perdeu nesta sexta-feira (26) um dos mais dedicados protetores da língua portuguesa. Aos 59 anos, faleceu o revisor Henrique Erni Grawer. Um mal súbito provocou a morte, no início da tarde, em Porto Alegre. Formado em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Erni nasceu em Novo Hamburgo, o segundo entre os quatro filhos de uma dona de casa e de um metalúrgico.
Oráculo dos jornalistas de Zero Hora, Diário Gaúcho e GZH, Erni ingressou na RBS em 1984. Era um tempo de redações barulhentas, com redatores maltratando as máquinas de escrever e a fumaça dos cigarros empesteando o ar. Aos poucos, com vasto domínio da gramática e ortografia, uma generosidade permanente e um humor mordaz, Erni conquistou a admiração de gerações e gerações de profissionais da notícia.
Discreto, com passos silenciosos e uma mochila às costas contendo uma térmica de café e lanche, todo início de tarde ele cruzava a Redação Integrada de GZH e se aboletava em sua estação de trabalho, no fundo da sala. De lá, enquanto ouvia nos fones as apresentações de calouros em realities musicais, salvava os colegas do vexame público estampado nas páginas do jornal ou no site.
— Em 50 anos de jornalismo, nunca vi um revisor tão competente como o Erni. É muito difícil fazer um jornal e ele nos salvou muitas vezes de cometer erros na capa, em editoriais. Nos poupou de muita vergonha. O curioso é que é um trabalho que só é percebido quando falha — conta o colunista Nilson Souza, ex-editor de Opinião da RBS.
Formado em técnicas agrícolas no Ensino Médio, Erni era apaixonado pela natureza. Alimentava os peixes da Redenção a cada passeio no parque, tinha uma horta que fazia questão de manter na casa do pai, em Novo Hamburgo, e adorava as praias de Santa Catarina, destino inescapável nas férias. Sua predileção era percorrer trilhas nas matas catarinenses, à procura das mais raras orquídeas. À amiga Daniela Neu, confidenciou o desejo para a aposentadoria: construir uma estufa para plantar orquídeas raras e depois devolvê-las à natureza.
— Ele também adorava descobrir novos sabores, principalmente frutas exóticas, temperos. Muitas vezes, comprava alguma fruta exótica e levava para a gente provar na redação. Não sei o que poderia acrescentar para dar conta do cara incrível que ele foi comigo nos cinco anos em que convivemos lado a lado — lembra Daniela.
Disciplinado e com obediência severa às regras da língua portuguesa e às normas de redação da RBS, Erni prezava textos claros, informações precisas e a elegância formal da escrita. Mas não perdia piada. Semana passada, brincou com a colega Adriana Irion ao dizer que “o feminino de comendador poderia ser comendadeira, mas é melhor não contar para ninguém”.
— Havia três anos, trabalhava diretamente com o Erni no fechamento das capas de Zero Hora e do Diário Gaúcho. Nesse período, além de confirmar toda a competência dele na revisão de páginas, descobri um cara doce, solidário, alegre e extremamente tranquilo — afirma o editor-chefe do Diário Gaúcho, Diego Araújo.
Nascido no dia de Natal, Erni mandava mensagens de final de ano e de feliz aniversário aos colegas. Há poucas semanas, ao cumprimentar a diagramadora Nádia Toscan pela troca de idade, agradeceu a sugestão para visitar a exposição Tarsila para Crianças, no Farol Santander, enviando a foto de um balanço da mostra.
— Ele gostava muito de viver, tinha muita vontade de viver, não queria ficar dentro de casa. Queria sempre fazer alguma coisa, assistir a uma peça de teatro, ir numa exposição. Vamos sentir muita falta — lamenta Nádia.
Erni deixa o pai, também Erni, os irmãos Elisa, Soraia e André, seis sobrinhos e dois sobrinhos-netos.
— Era uma pessoa maravilhosa. Jamais conheci alguém tão bom, tão amoroso. Nunca ouvi falar algo ruim. Amava os sobrinhos, que eram loucos por ele. Nos fez ir sempre à Feira do Livro e foi lá que agora há pouco conheceu o Enzo, sobrinho-neto de um ano e sete meses. Ele é tão incrível que esses dias o Enzo, recém aprendendo a falar e que o tinha visto apenas uma vez, estava chamando pelo tio Henrique — conta o irmão André.
O velório será na Funeraria Krause, em Novo Hamburgo, na capela C (Rua Santos Pedroso, 155), das 9h às 16h30min deste sábado. O sepultamento ocorrerá no Cemitério Municipal de Novo Hamburgo.