
Depois de um inesperado encontro com o Super-Homem, na janela do terceiro andar do Hospital da Criança Santo Antônio, em Porto Alegre, em 12 de outubro do ano passado, Vicktor Gabriel dos Santos, então com três anos, alimentou a vontade de reencontrá-lo. Naquele dia, um vidro e o tratamento contra o câncer o impossibilitaram de tocar no idolatrado personagem. Restaram as memórias, uma foto na capa de Zero Hora do dia seguinte à visita e o sonho de, um dia, abraçar o herói favorito.

Agarrado a este desejo, em fevereiro deste ano Vicktor passou pelo autotransplante de medula. Na semana passada, prestes a completar dois anos de tratamento, de volta à casa da família, em Osório, ele recebeu um presente pela recuperação. Sentado no sofá da sala, o guri alisava uma cópia da foto dele com o super-herói quando viu um homem de roupa azul e capa vermelha entrar pela porta da sala. Os olhos do menino fixaram-se no visitante. Fez-se um breve silêncio.
— Olha a minha moto! — foram as únicas palavras ditas por ele, ainda surpreso, enquanto apontava o presente recebido no Natal.
Emocionado, Super-Homem ajoelhou-se na frente de Vicktor. Era o mesmo herói da imagem eternizada no jornal. Desta vez, porém, o alpinista industrial Maicon Castilho, 27 anos, não precisou descer de rapel pelas paredes. Depois da ação voluntária ao Santo Antônio, ele chegou a tentar encontrar o garoto outra vez. Mas o trabalho no Nordeste, nos últimos 10 meses, o afastou do Estado.
De volta a Charqueadas, onde mora, na Região Carbonífera, Maicon aceitou o convite da reportagem para ir a Osório. Ele trocou de horário na empresa especialmente para visitá-lo.
— Aquele encontro impactou muito a minha vida. Sempre vivi sem pensar no amanhã. Vê-lo lutando pela vida me fez dar valor a todos os momentos com os meus filhos — desabafou Maicon.

"Bigado"
Enquanto mostrava as três fotos guardadas do encontro na instituição hospitalar _ presentes do fotojornalista de ZH Bruno Alencastro _ Vicktor esboçou o primeiro sorriso para o Super-Homem. Em seguida, apresentou os dois passarinhos da família e pediu o colo do herói. Aos poucos, foi se soltando.
Tímido como o fã, Maicon também esperou uma aproximação. De casa, levou presentes para Vicktor e para as irmãs dele, Yasmin, três anos, e Valentina, cinco meses. Foi um pedido de sua mulher, Cindi Teixeira, 25 anos, com quem tem três filhos _ Maya, um ano, Maria Joana, três, e Arthur, cinco anos. Vicktor ganhou um copo com a imagem do super-herói favorito e uma réplica do personagem, logo colocada para voar pelas mãos do alpinista industrial.

— Você gostou da surpresa? _ perguntou a mãe, a dona de casa Neriana Crippa dos Santos, 24.
— Gostei! Bigado, super-herói! — agradeceu Vicktor.
— Eu que te agradeço por estar bem. É uma vitória te ver assim — respondeu Maicon, com os olhos marejados.
Cansado das conversas e brincadeiras dentro de casa, o menino puxou o Super-Homem pela mão e o levou para o pátio. Juntos, jogaram futebol. Animado, o garoto driblou, correu e tentou chutar cada vez mais forte. Era para demonstrar que o período mais difícil de enfrentamento da doença, finalmente, havia ido embora. Para combater o câncer no testículo esquerdo, Vicktor passou pela cirurgia de retirada do tumor e fez 12 sessões de quimioterapia. Em cada uma delas, repetidas durante sete dias seguidos, recebeu três tipos de medicamentos.
— Ele é sempre muito tranquilo. Enfrentou tudo sem reclamar. Das crianças que começaram o tratamento com ele, apenas duas seguem vivas. Sempre evitei pensar algo ruim e preferi acreditar na recuperação dele. Vê-lo forte, sorrindo e abraçando o ídolo é o melhor presente — emocionou-se Neriana.

Revelação
Em meio às brincadeiras, Maicon deixou escapar uma curiosidade desconhecida por todos. No dia da visita ao Santo Antônio, proposta por oito integrantes da empresa Executar Alpinismo Industrial, o quarto de Vicktor acabou esquecido pelo grupo. Todos os outros já tinham sido visitados e a equipe começava a guardar os equipamentos, quando Maicon decidiu descer mais uma vez para não deixar nenhum paciente sem a visita-surpresa. Pela autorização da administração do hospital, ele teria três minutos para dar um alô.

Do outro lado do vidro, um guri sem cabelos e de rosto sisudo o olhava, à espera de algum sinal. Maicon contou ter engolido o choro e começado a sorrir. Em segundos, veio o primeiro aceno e a aproximação pelo vidro da janela. Durante 15 minutos, fizeram corações e tentaram se tocar, até o alpinista industrial ouvir a solicitação para descer. Ambos guardaram a promessa de um reencontro.
— Sempre me emociono quando lembro daquele dia. O Vicktor me ajudou, e eu precisava agradecê-lo pessoalmente por isso — disse Maicon.
Quase um ano depois, o desejo foi realizado. A nova visita animou ainda mais o garoto, agora cabeludo. Após ultrapassar obstáculos tão difíceis impostos pela vida, restava ainda atravessar o vidro que o separava do super-herói. Na tarde de 5 de outubro de 2017, finalmente ele conseguiu abraçá-lo.
Depoimento do fotojornalista Bruno Alencastro
"Prometi que se a fotografia do Vicktor Gabriel, feita por mim, ganhasse algum prêmio, dividiria de alguma forma com ele. Dito e feito: fui agraciado com o primeiro lugar no mais importante concurso de fotografia do nosso Estado, o Prêmio ARI. Como estava próximo ao Natal, atuei como ajudante do velho Noel e descobri que o sonho do pequeno era ganhar uma moto elétrica. Na ocasião, aproveitei para levar uma cópia da capa da ZH (foto). Em 24 de dezembro, lá estava eu em Osório, me emocionando em ver o meu amigo forte e, ao mesmo tempo, gentil, levando a mana para dar uma banda na garupa da motinho! Tenho certeza de que toda essa felicidade e alegria ajudou a deixar o nosso heroizinho ainda mais valente para enfrentar o desafio que vinha logo ali à frente, com o autotransplante. De lá pra cá, sempre procurei estar por perto para saber todas as novidades e conquistar com o tratamento. E, felizmente, só recebo boas notícias! Feliz Dia das Crianças, meu super-herói favorito!"