
No meio acadêmico, sabe-se que Albert Einstein (1879-1955) dormia em média 10 horas por noite. A anedota vai além: quando o físico sabia que teria um dia cheio pela frente, adicionava mais uma horinha.
Mas e se Einstein tivesse nascido em pleno século 21? Será que a TV a cabo, os tablets, as redes sociais, os sites, os chats, os smartphones, os videogames e todos os demais elementos da vida moderna permitiriam esse luxuoso tempo de descanso absoluto? E se Einstein, como a maioria da população de hoje, não tivesse mais que meia dúzia de horas de sono corrido? Ainda seria um gênio? A ciência não tem elementos para avaliar o que seria do cientista alemão após noites em branco, dada a relatividade da suposição - sem trocadilhos com sua famosa teoria.
Contudo, há evidências numerosas de que a qualidade do sono está intrinsecamente ligada à saúde, à qualidade de vida e à capacidade de cognição do indivíduo. Tal correlação, em tempos de privação de sono generalizada, afeta brutalmente a sociedade.
Uma noite maldormida vai muito além de um rosto cansado, de olhos inchados e de pele sem vida, podendo levar a pessoa a problemas sérios, como hipertensão, impotência sexual, diabetes ou mesmo um acidente vascular cerebral (AVC). Segundo dados da Sociedade Brasileira do Sono, um em cada três brasileiros tem dificuldade para dormir. O assunto é tão preocupante que o Conselho Federal de Medicina reconheceu, em outubro, a área do sono como uma especialidade médica.
- É um mal da modernidade. Antes, a programação da televisão acabava cedo. Depois do Corujão, você ligava a TV e era só estática. Então, todo mundo ia dormir. Hoje, fazemos uma restrição de sono crônica - alerta o neurocientista Fernando Louzada. - Não é que as oito horas sejam obrigatórias. Mas esse, em geral, é um número que funcionaria bem para todo mundo. Menos de sete horas por noite é uma irresponsabilidade.
Todos estão sempre ocupados, e o sono é uma das primeiras coisas a ser sacrificada quando sentimos que não há horas suficientes no dia.
- Ironicamente, nós seríamos muito mais produtivos se estivéssemos bem descansados - afirmou o psicólogo James B. Maas, autor de best-sellers que relacionam o bom sono ao sucesso profissional.
Cinco fases
Ao entrar no primeiro estágio do sono, o cérebro se mantém, por vezes, mais ativo do que quando estamos acordados. Nesse estado, ele exerce um papel dramático na manutenção e na regulação cardiovascular, gastrointestinal e imunológica.
- Quando adormecido, ele também facilita processos mentais, como aprendizagem, memória e criatividade - diz o psicólogo James B. Maas.
O neurologista Walter Teixeira explica que o sono é dividido em cinco estágios. Ao dormir, entra-se no primeiro: um sono muito leve, no qual o corpo já está em um estado considerável de repouso. Os músculos relaxam, e a respiração diminui. A passagem para o estágio dois se dá em minutos.
- É comum que, na transição, você acorde com aquela sensação de queda - diz Maas.
Essa fase dura de 10 a 20 minutos e é marcada por intensa atividade cerebral e total quebra de vínculo com o ambiente.
Na terceira fase, que dura em média 30 minutos, as ondas cerebrais ficam mais lentas, até a chegada da fase quatro, na qual o sono é extremamente profundo. A pressão arterial cai, o fluxo sanguíneo diminui, e a respiração fica lenta. Apesar do aparente marasmo, é nessa fase, de até 40 minutos, que muitos hormônios têm picos produtivos, como o hormônio do crescimento (GH), secretado pela glândula pituitária (daí a importância de uma excelente noite de sono para crianças e adolescentes).
- É o mais próximo que os seres humanos chegam da hibernação. É um estágio no qual, se acordado, você se sentirá grogue, desorientado - diz Maas.
Depois desse estágio, explica o psicólogo, você retorna ao três, e depois ao dois. Aí, já se vão 90 minutos de sono. De repente, o sistema nervoso simpático fica mais e mais ativo, assim como a pressão, a respiração e a circulação sanguínea. Os olhos, ainda fechados, se mexem rapidamente, e você entra na famosa fase REM (rapid eye movement, movimento rápido dos olhos, na tradução em português).
Mesmo com o cérebro completamente ativado, os músculos relaxam e param de se mexer, fenômeno conhecido por paralisia do sono. É aí que começamos a sonhar (e é por causa dessa paralisia que você não reproduz os movimentos que "executa" nos sonhos).
O ideal é que você atinja o estado REM de quatro a cinco vezes por noite, o que exigiria de sete a oito horas de sono diárias.
Elixir de beleza e juventude
Dormir bem já é considerado uma espécie de elixir de beleza e juventude, além de auxiliar na manutenção do peso. Segundo a biomédica Mônica Levy Andersen, a privação do sono induz a produção de hormônios do estresse no corpo - inimigos da beleza saudável. Tais hormônios provocam vasoconstrição, resultando em um rosto pálido, com olheiras e aparência cansada. A baixa secreção do hormônio do crescimento (GH) afeta a regeneração celular e o tônus muscular. Ou seja, dormir pouco também acelera o processo de envelhecimento da pele e dos músculos.
Os efeitos são visíveis a olho nu, como afirma uma pesquisa divulgada pelo British Medical Journal. Estudiosos suecos concluíram que quem dorme bem é fisicamente mais atraente. O trabalho consistiu na análise de fotos de pessoas em duas situações: uma imagem as retratava devidamente descansadas, e na outra elas estavam acordadas havia 31 horas. O resultado foi óbvio: pessoas descansadas são consideradas mais bonitas.
Do ponto de vista nutricional, uma surpresa: hoje, sabe-se que a falta de sono está relacionada ao desejo por alimentos hipercalóricos. A revelação foi feita pela Escola de Medicina de Harvard, em parceria com o McLean Hospital, nos EUA. Para o sonolento, um alimento rico em gordura parece muito mais atraente do que uma fruta ou qualquer comida mais saudável.
Falta de repouso adequado está relacionada ao desejo por alimentos calóricos
Manual para descansar de verdade
DESCUBRA QUANTAS HORAS DIÁRIAS DE SONO SÃO NECESSÁRIAS PARA VOCÊ. E SIGA ESSA NECESSIDADE À RISCA
Calcule quantas horas você dormiu na última noite e analise sua disposição durante o dia. Em geral, as pessoas se sentem dispostas com sete ou oito horas de repouso. A partir do momento em que você sabe a duração do seu sono ideal, programe-se para não dormir menos do que o necessário. Por exemplo, se você precisar de oito horas e tiver de acordar às 7h, deite-se lá pelas 22h.
Nesses casos, é melhor errar para mais do que para menos, uma vez que, com a nova rotina, o sono pode demorar a chegar. Se depois de alguns dias nessa programação você ainda precisar de um despertador para acordar ou ainda se sentir cansado ao longo do dia, tente mudar o horário, adiantando 15 ou 30 minutos aos poucos.
Continue fazendo isso até acordar sem despertador e se sentir revigorado e alerta por todo o período de vigília. Quando você achar que descobriu a quantidade de sono perfeita, faça um teste. Durma 15 minutos mais tarde no próximo dia. Se esses simples 15 minutos fizerem diferença, com sinais de fadiga e indisposição, você havia encontrado o tempo exato para se sentir 100%.
VÁ PARA A CAMA SEMPRE NO MESMO HORÁRIO, INCLUSIVE NOS FINAIS DE SEMANA
Mantenha um horário de sono consistente em todos os momentos - isso significa sete dias por semana, 365 dias por ano! Regularidade é importante para a estabilização do relógio biológico.
OBTENHA A QUANTIDADE NECESSÁRIA DE SONO EM UM BLOCO CONTÍNUO, EVITANDO FRAGMENTÁ-LO
O chamado sono fragmentado não é nem física nem mentalmente restaurador. Embora, às vezes, seja impossível conseguir oito horas de sono contínuo (basta perguntar a pais de recém-nascidos), acordar várias vezes durante a noite tem um grande efeito negativo no corpo. E nisso está incluída a tecla "soneca" de seu despertador.
COMPENSE O SONO PERDIDO O MAIS RÁPIDO POSSÍVEL
Em geral, precisamos de uma hora de sono para compensar duas horas de vigília. É por isso que precisamos de oito horas de sono, a fim de compensar as 16 horas em que ficamos despertos. Se você violar essa regra, começará a acumular uma "dívida de sono" que terá de ser paga. Não tente, entretanto, compensar de uma só vez, no entanto. Se você pulou uma noite de sono, dormindo por 14 ou mais horas na noite seguinte, não vai ajudar. Apenas vai confundir o seu corpo. Tente espalhar o seu débito durante alguns dias até se sentir melhor. Cochilos também podem ajudar, desde que eles não sejam muito longos (o ideal é entre 20 e 90 minutos, para que você acorde em estágios do sono que lhe permitam se sentir disposto).