Acompanharei os Jogos de Paris de diversas formas e, enquanto o atletismo não começa, tenho apurado informações de fora da pista. É extremamente satisfatório fazer esse trabalho, pois as coisas que acontecem nas Olimpíadas não são só os esportes. Por trás e em volta de tudo isso, há uma série de temas para se trazer a público que são de interesse das pessoas.
E um dos temas mais controversos desta edição é a proibição da utilização de hijab — véu que cobre a cabeça e o pescoço usado por mulheres muçulmanas — por atletas francesas, decretado pelo comitê olímpico francês.
A justificativa por parte do comitê é que o uso de símbolos religiosos foi proibido para respeitar a neutralidade religiosa e o Estado laico na França. Em tese, o país segue o princípio da laicidade ou secularismo, o que significa que o Estado não é regido sob a interferência de religiões e suas doutrinas. E pelos atletas olímpicos estarem ligados a um órgão governamental, eles são submetidos aos mesmos princípios que os funcionários públicos.
Nos Jogos, tão amplamente divulgados como os de "maior equidade da história”, me parece que uma medida desse tipo vai na direção totalmente contrária do que está sendo dito, uma completa contradição. É como se o Comitê Olímpico Francês não visse as mulheres muçulmanas como iguais, visto que a proibição é um descumprimento até de um direito humano básico — a liberdade religiosa.
No atual momento em que vivemos, onde as minorias religiosas estão sendo diariamente atacadas em vários cantos do planeta, a organização dos Jogos de Paris perde uma oportunidade de ouro de passar uma mensagem para o mundo inteiro enquanto a cidade está com todos os holofotes: aqui todos são aceitos.
A luta contra a intolerância religiosa deve ser coletiva. Recentemente, em 2021, o lema olímpico foi alterado e a palavra “juntos” foi adicionada, um gesto extremamente simbólico que reflete uma das características primordiais do esporte — unir pessoas. Precisamos nos engajar em causas que permitam a união, ao invés da exclusão nesse caso, para que o esporte cumpra o seu papel de agente transformador da sociedade.
Espero que a decisão seja revista e que esses Jogos Olímpicos estabeleçam mais um marco histórico.