Acostumada aos aplausos por sua interpretação de mulheres inesquecíveis nas novelas da Globo, a atriz Regina Duarte está a um passo de encarar o maior desafio de sua carreira, como secretária da Cultura do governo de Jair Bolsonaro. A política não tem o glamour das novelas. Ocupar cargo público no Brasil é virar vidraça.
É preciso ter coragem para participar de um governo. Poucos artistas aceitaram trocar o carinho dos fãs pelas agruras de um cargo de ministro (Gilberto Gil, no governo Lula, foi um deles) ou de secretário. Diga-se a favor de Gil e Regina que os dois são do ramo. Vivem de sua arte.
Substituir o adoidado Roberto Alvim na Cultura não é nada que se compare ao que Regina fez a vida inteira, encarnando mocinhas, como a Simone de Selva de Pedra, pelas quais o Brasil inteiro torcia no tempo da TV em preto e branco, ou divertindo os telespectadores com a impagável Viúva Porcina, “a que foi sem nunca ter sido” (porque jamais casou com Roque Santeiro).
Como nos folhetins que protagonizou em mais de meio século de carreira, a atriz não disse sim a Bolsonaro ontem. Em linguagem afinada com a do presidente, que adora metáforas de casamento, a ex-namoradinha do Brasil disse que “noivou”. É um aceite com possibilidade de reviravolta, na melhor tradição das novelas.
A atuação política de Regina não começou em 2002, quando participou do programa eleitoral de José Serra (PSDB) e popularizou a frase “eu tenho medo”, referindo-se à vitória de Lula. Em 1985, ela fez propaganda para Fernando Henrique Cardoso, candidato a prefeito de São Paulo (veja abaixo).
No auge do sucesso como a viúva de Roque Santeiro, a atriz pedia voto para FHC e alertava que votar em Eduardo Suplicy (PT) seria ajudar Jânio Quadros. Em tom alarmista, citava a ascensão de Hitler como exemplo do que ocorre quando os democratas se dividem. Jânio ganhou a eleição e morreu no ostracismo. FHC virou presidente 10 anos depois.
Aliás
Em respeito à trajetória de Regina Duarte, Jair Bolsonaro deveria recriar o Ministério da Cultura para não submetê-la ao constrangimento de ser subordinada a um ministro que está sob investigação.
Marcelo Álvaro Antônio, o ministro do Turismo, a quem Regina responderá, é acusado de chefiar o esquema de candidatas-laranja do PSL na eleição de 2018.