Não é exagero dizer que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, tem sorte. Foi por uma trapalhada gigantesca de delatores soberbos que gravações com conteúdo nauseante chegaram ao Ministério Público Federal e colocaram em discussão o acordo homologado meses atrás. A partir de diligências dentro do MPF, sob a gestão de Janot, descobriu-se que Joesley Batista, dono da JBS, e Ricardo Saud omitiram fatos importantes para a investigação.
Os delatores poderiam entregar as provas adicionais do acordo até o fim de outubro, porque o ministro Edson Fachin havia dado mais 60 dias para a entrega dos arquivos. O prazo original acabava na quinta-feira, quando os áudios foram recebidos. Ao que tudo indica, a defesa dos irmãos Batista não foi notificada a tempo sobre a decisão de Fachin.
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Se as gravações chegassem à PGR no fim de outubro, Janot não poderia evitar o próprio fracasso. Seria sob a gestão de Raquel Dodge que o conteúdo viria à tona e que se questionaria ainda mais a blindagem em favor dos delatores.
O atual PGR pode ter errado ao fechar um contrato de colaboração tão benéfico para os proprietários da JBS. Eles, supostamente assessorados pelo ex-procurador Marcello Miller, sabiam o roteiro que deveriam seguir para agradar Janot. Com a revisão do acordo, abre-se a oportunidade de rever os benefícios excessivos.
Pela iniciativa anunciada na segunda-feira, de investigar as omissões dos delatores, presume-se que Janot fora enganado. Ávido por denunciar o presidente da República, o procurador-geral deu agilidade ao processo e não deu bola à cautela.
Nas próximas horas, Joesley, Saud e Marcelo darão explicações ao MPF sobre o conteúdo dos áudios entregues por engano. Tudo indica que Janot não se sensibilizará com o depoimento do trio. Por terem omitido informações importantes, os executivos da JBS podem ser presos. No Supremo Tribunal Federal, os ministros, que também foram alvos de comentários sórdidos, não escondem a vontade de que querer puni-los.
– Acho que Joesley e Saud ludibriaram a Procuradoria, degradaram a imagem do Brasil no plano internacional e atentaram contra a dignidade da Justiça. Mostraram a arrogância dos criminosos do colarinho branco. A primeira providência que tem de ser tomada é a prisão deles – disse nesta quarta-feira o ministro Luiz Fux.
Assim como Janot, Fux e Marco Aurélio Mello entendem que, se o acordo de colaboração for rescindido, as provas ficam.
Limpando as gavetas
Em clima de despedida, Rodrigo Janot continua limpando as gavetas. Só nesta semana, denunciou os ex-presidentes Lula e Dilma duas vezes, em dois processos diferentes. Terça-feira foi por organização criminosa. Nesta quarta, por obstrução de Justiça.