
O funeral do papa Francisco, embora cheio de emoção, não deixou de ser, também, um palco político, no qual, à frente ou atrás das câmeras, o atual estado das coisas no mundo foi debatido.
Primeiro, o arranjo de quem sentaria com quem no altar montado nos degraus da basílica, próximo ao altar, montado na Praça de São Pedro. Entre os confirmados, havia um ministro russo e o presidente da Ucrânia, Volodimir Zelensky; um embaixador de Israel e um ministro do Irã; Donald Trump, o rival, Joe Biden, e meio mundo com quem o atual presidente dos EUA comprou briga em razão da guerra tarifária.
Como acomodar toda essa gente em alguns metros quadrados, mesmo em um espaço gigantesco como a Praça de São Pedro? O Vaticano resolveu ser, com o perdão do trocadilho, salomônico: ordem alfabética, pelo nome do país em francês, a língua oficial da diplomacia.
Segundo essa lógica, duas exceções: preferência aos reis, afinal o Papa também é um monarca no regime teocrático da Santa Sé. Logo, eles sentaram-se primeiro, seguidos por chefes de Estado, chefes de governo, membros da realeza e assim por diante, incluindo ministros e outras autoridades.
Apenas os chefes de Estado da Itália, Sergio Mattarella, e da Argentina, terra natal do Papa, Javier Milei, tiveram assentos privilegiados. Lula e Donald Trump, por exemplo, ficaram na primeira fila, a umas 15 cadeiras de separação. O brasileiro saiu de Roma dizendo que nem o encontrou.
Imigração e guerra em pauta
Resolvida essa questão (ok, em parte), o restante não estava muito sob controle. Nem os recados que o celebrante, o decano do colégio cardinalício, cardeal Giovanni Battista Re, que incorporou mensagens de Francisco contra a guerra e a favor de minorias.
— A guerra sempre deixa o mundo pior do que estava antes: é uma derrota dolorosa e trágica para todos — afirmou, sob aplausos.
Em outro momento, em clara alusão à questão migratória, reafirmou o desejo de defender a paz e lembrou a frase proferida pelo papa argentino:
— Construir pontes e não muros é uma exortação que ele repetiu muitas vezes, e o serviço da fé como Sucessor do Apóstolo Pedro esteve sempre unido ao serviço do homem em todas as suas dimensões.
A homilia destacou a importância dos imigrantes no pontificado do papa Francisco, com alusões à missa que celebrou na fronteira entre Estados Unidos e México e à sua viagem oficial à ilha de Lampedusa.
— É significativa a primeira viagem do papa Francisco, é significativo que tenha sido a Lampedusa, ilha-símbolo do drama da emigração, com milhares de pessoas afogadas no mar.
Na mesma linha se inscreve a viagem a Lesbos, com o Patriarca Ecumênico e o Arcebispo de Atenas, e a celebração de uma missa junto da fronteira mexicana com os Estados Unidos, por ocasião da sua viagem.
Face a face

Porém, nenhum sinal foi tão significativo quanto a imagem que vazou nas redes sociais e percorreu, em segundos, o mundo. Trump e Zelensky sentados frente a frente, em frente ao batistério da Basílica de São Pedro, logo na entrada da igreja, à esquerda.
Foi uma rápida reunião, antes do funeral, improvisada, nas cadeiras que estavam próximas. Trata-se do primeiro encontro face a face entre os dois, que durou 15 minutos, após o dramático ocorrido e transmitido mundialmente no Salão Oval da Casa Branca, de onde Zelensky saiu sem participar da coletiva de imprensa.
Para muitos, a paz passa por São Pedro. Ou, quem sabe, tenha sido o primeiro milagre de Francisco.