
Responsável por internacionalizar a imagem de inovação brasileira no Exterior, o programa Diplomacia da Inovação é realizado desde 2017 pelo governo federal. Encarregado pela inciativa, o chefe da Divisão de Ciência, Tecnologia e Inovação do Ministério das Relações Exteriores (MRE), Rafael Leal, esteve no South Summit Brazil e conversou com a coluna.
O que é o programa Diplomacia da Inovação?
São três objetivos: o primeiro é trabalhar a imagem do Brasil no Exterior. O segundo é incentivar os agentes do ecossistema a se internacionalizar. E o terceiro é conectar as startups ou os parques tecnológicos com os seus contrapartes no Exterior. Por que é importante trabalhar a imagem do Brasil lá fora? Quando compramos um celular ou um microfone, por exemplo, a informação de onde foi feito esse equipamento afeta o juízo que se tem sobre esse produto. Se eu disser que esse celular é fabricado na Coreia do Sul ou nos Estados Unidos, no Vale do Silício, ou no Chile, isso vai afetar a visão que se tem sobre a qualidade desse produto. O trabalho do Itamaraty é tentar reduzir o gap entre a percepção que se tem do Brasil no Exterior e a realidade. Estamos aqui no South Summit, mas o evento não é conhecido em todo o mundo. Na Malásia, em Singapura, não se sabe o que está acontecendo aqui. O nosso trabalho é fazer com que ele seja conhecido: Trazendo pessoas de lá para cá e levando gente do Brasil para esses ecossistemas, para que se saiba o que está sendo feito aqui. Quando uma startup ou empresa brasileira tentar fazer negócio com esse país, vai carregar junto essa imagem positiva que queremos levar do ecossistema brasileiro de inovação.
Como isso é operacionalizado?
De várias formas. Primeiro fazemos um trabalho de inteligência, que consiste em mapear os ecossistemas de inovação mais dinâmicos do mundo Mapear para quem? Para os brasileiros. Por exemplo: se conversarmos sobre o Vale do Silício, provavelmente você vai conhecer bastante, os ecossistemas de inovação na Malásia, no Vietnã ou na China, por exemplo, ainda são pouco conhecidos no Brasil. Usamos diplomatas que estão nas embaixadas e consulados do Brasil mundo afora para um conhecimento especializado sobre aqueles países. O que temos feito é mapear o ecossistema de inovação e publicar isso no site da Diplomacia da Inovação, para que um empreendedor, um parque tecnológico, uma missão de ciência, tecnologia e inovação que vá para aquele país, tenha um documento de referência do como aquele país atua em setores de ciência, tecnologia e inovação, quem são os players, quais são as verticais em que aquele país é bom, o que tem sinergia com o ecossistema brasileiro. Fazemos o contrário também. Estamos trabalhando no mapeamento, produção de um documento em inglês que mostra o ecossistema de inovação brasileiro, para quando vier uma delegação do Peru, como veio aqui para o South Summit, mostramos: "Olha, em Recife, tem o Porto Digital, em Porto Alegre tem o Instituto Caldeira, tem o Tecnopuc". Mostrar também para o Exterior o que está sendo feito aqui. Essa é uma ação de inteligência. Outra é levar os empreendedores para o Exterior, por meio de missões tecnológicas, por exemplo o South Summit em Madri, o Viva Technology em Paris, ou a China-Brasil Innovation Week em Pequim. Normalmente temos um espaço de feira, lançamos um edital para startups e as levamos, geralmente, para um mercado pouco explorado. Queremos abrir novas frentes, fazer com que os brasileiros conheçam mais o que está sendo feito na Ásia, que entendemos que é para lá que está indo o centro de gravidade da inovação no mundo. Também trabalhamos com programas de incubação cruzados, que significa levar startups para conhecer um país e também selecionar projetos de fora e fazer uma imersão nos ecossistemas.
Ou seja, vender o Brasil no Exterior?
Diria reduzir a simetria de informação. Não se trata de dourar a pílula, de dizer que somos bons em tudo, mas mostrar que, em algumas áreas, somos muito bons. Dizer, por exemplo, que o Brasil é muito bom em agritech, temos um centro de excelência em inteligência artificial em Goiás, temos o Instituto Caldeira, Miditec em Florianópolis. Muitos países, especialmente o Sul Global, têm interesse em conhecer a experiência brasileira.
Como o Brasil se encontra nesse cenário global e o que falta para o país estar entre os grandes players de inovação?
Temos um ecossistema maduro o suficiente para ser um líder regional na América Latina. Não temos abundância de capital, como em outros ecossistemas, mas tem ocorrido um amadurecimento. Tive uma startup em Florianópolis de 2000 a 2002. Se o ecossistema fosse o que é hoje, talvez eu não fosse diplomata, porque está muito mais maduro e sofisticado para quem quer empreender. Temos uma jornada de amadurecimento que é muito boa comparado com vários países do Sul Global, mas que, claro, ainda está em desenvolvimento. Estamos mais ou menos numa faixa intermediária no geral, e muito avançados em algumas áreas. Somos muito bom em fintechs e agritechs.
Qual a importância de feiras como essas para lançar o país mundialmente?
Do ponto de vista da diplomacia da inovação, esses eventos são fundamentais. Porque, de certa forma, em oportunidades como essa você sintetiza e dá uma amostra da força do ecossistema. Estamos vendo o South Summit lotado, palestrantes e delegações internacionais. Isso mostra muito como o Brasil consolida essa posição de referência na América Latina e se torna cada vez mais maduro para ser referência mundial. Vejo que ainda há muito trabalho a ser feito em divulgação, em trabalhar a marca Brasil, principalmente no continente asiático. A distância não ajuda, o desconhecimento das culturas também não, mas é para isso que estamos trabalhando.
Como alinhar inovação e resiliência, o tema deste ano?
Depois de tudo o que ocorreu no ano passado em Porto Alegre, com as enchentes, o tema, de certa forma, sintetiza também a característica geral do brasileiro de ser resiliente, de conseguir enfrentar as dificuldades. Vemos muitos depoimentos dos empreendedores dizendo como é difícil empreender no Brasil, mas como vemos aqui, os inovadores mostrando essa resiliência, essa vontade de seguir, apesar das dificuldades. Acho que o evento também foi muito feliz na escolha do tema, tanto pelo contexto da sociedade, quanto pela característica básica do brasileiro em geral.
Diante da guerra comercial entre China e Estados Unidos. Como isso preocupa ou afeta a diplomacia da inovação?
É preocupante, sem dúvida, mas, por outro lado, o Itamaraty sempre trabalhou nesse espaço multilateral, preservando a independência do Brasil, de conseguir trabalhar com todos os povos e buscando oportunidades para o país, procurando avançar da melhor forma o interesse nacional. Continuamos trabalhando nessa área da inovação como estávamos fazendo antes, buscando nesse cenário conturbado, de incertezas. Vemos a cada dia o noticiário que parece que dá (um giro de) 180º, mas buscando oportunidades para inserir o Brasil inovador tanto na Ásia, quanto aqui no hemisfério americano.