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Enfim, a oposição argentina tem um fio de novelo para puxar a fim de tentar construir uma narrativa com potencial de fustigar Javier Milei.
A rocambolesca história do post do presidente, na sexta-feira (14), apoiando uma até então desconhecida criptomoeda, a $LIBRA, provoca o primeiro escândalo político-financeiro-digital da Argentina, com respingos sérios sobre a Casa Rosada, mas dificilmente o terremoto levará a um processo de impeachment - mesmo em um país onde os presidentes não costumam durar no Sillón de Rivadavia.
O kirchnerismo se armou para tentar emplacar os votos necessários para abrir o processo de julgamento político no Congresso. Para que o processo de impeachment seja aberto são necessários 129 votos do total de 257 parlamentares na Câmara.
Milei não tem maioria. Mas a oposição também não. Para levar o processo adiante, a oposição precisaria se unir - o que é muito difícil no atual momento político argentino. Falo de uma união não apenas entre as diferentes facções peronistas, mas, principalmente entre os demais partidos adversários do governo, como a União Cívica Radical (UCR).
Digamos que o processo fosse instaurado. Também não seria fácil desbancar o presidente.
O Senado atuaria como tribunal. Para afastar o presidente, são necessários dois terços dos votos - 48 do total de 72 senadores. Na Câmara Alta, o cenário é também um mosaico.
Na Argentina, no entanto, tudo pode mudar em horas. Por isso, muitos políticos estão cautelosos. O fato de o ex-presidente Mauricio Macri (PRO) ter reagido com críticas a Milei deu ânimo momentâneo aos kirchneristas. Nesta segunda-feira (17), no entanto, ele recuou dando mostras de que pretende esperar o resultado da investigação interna iniciada pelo governo - uma apuração, não é difícil prever, que vai isentar Milei.
Essa parece ser a estreia de uma longa série de streaming, que, pelo menos nos próximos dias, ganhará novos capítulos. Um deles já foi acrescido ao roteiro no domingo (16), quando o criador da $LIBRA, o empresário americano Hayden Mark Davis, foi às rede sociais confirmar que é assessor de Milei. Disse que está “trabalhando com Milei e sua equipe num projeto de tokenização muito maior”.
No campo criminal é mais fácil fritar o presidente, enquanto, no campo político, cada um escolhe seu lado. No domingo (16), foi apresentada a primeira denúncia contra Milei. Os autores são os advogados Jonatan Baldiviezo e Marcos Zelaya, a engenheira María Eva Koutsovitis e o ex-deputado e presidente do partido de esquerda Unidade Popular, Claudio Lozano. Além do crime de “associação ilegal”, a denúncia pede que o Ministério da Justiça investigue Milei por “fraude”, “não cumprimento dos deveres de funcionário público” e “violação da Lei de Ética Pública”.
Por trás dos portões da Casa Rosada, o clima é de preocupação, mas, para além da Praça de Mayo, a ordem é minimizar o caso. A rejeição de Macri em aderir ao pedido de impeachment é um alívio. Ao menos, por enquanto.