O episódio da suspensão do início do ano letivo na rede estadual pela Justiça tem de servir, sobretudo, de lição. Deve ficar o aprendizado de que a preparação e a adaptação aos extremos do clima, como ondas de calor, são tarefas urgentes. Não é algo para o futuro, mas que já está atrasado. As consequências do aquecimento global, na forma de dilúvios ou de temperaturas tórridas, são uma realidade bastante palpável pelos gaúchos.
Há premência de adequação em vários aspectos do cotidiano e nos serviços públicos, como na educação
No caso em questão, parece ter faltado sensibilidade do governo do Estado e das Coordenadorias Regionais de Educação para tratar da demanda do Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul (Cpers) para adiar a volta às aulas, diante das previsões meteorológicas de que o início da semana marcaria o pico da atual onda de calor. Se existisse um diálogo adequado que conduzisse a uma decisão de bom senso para postergar o começo do ano letivo em dois ou três dias, famílias não teriam passado pelo transtorno do cancelamento de última hora das aulas. Ademais, talvez a suspensão não precisasse ser generalizada, já que há escolas com climatização. Algumas prefeituras, atentas à previsão, decidiram adiar o retorno. O próprio Estado já optou por ser previdente por alertas de temporais.
Climatologistas reiteram que o aquecimento global fará o Rio Grande do Sul ter maior frequência de episódios de vários dias de calor intenso. Os reflexos são múltiplos. Há premência de adequação em vários aspectos do cotidiano e nos serviços públicos, como na educação. Na semana passada, quando Quaraí registrou 43,8ºC, a maior marca observada no Estado em 115 anos, foi pauta a situação dos ônibus da Capital e trens metropolitanos que circulavam sem ar condicionado.
A saúde merece especial atenção. Calorões elevam os riscos para idosos e pessoas com doenças crônicas. Um estudo de instituições como Fiocruz e Universidade de Lisboa, publicado em 2024, indicou que os efeitos de temperaturas escaldantes mataram 48 mil brasileiros entre 2000 e 2018. Chuvas em excesso seguidas de calor também contribuem para a proliferação do mosquito Aedes aegypti, transmissor da dengue, doença que tem números inéditos no Estado. Para dias com previsão de calor extremo, o trabalho ao ar livre requer cuidado. As cidades, com uma arborização planejada, devem buscar formas de amenizar os bolsões de aquecimento. O abastecimento de água potável é alvo recorrente de reclamação de usuários.
A adaptação necessária também passa por solucionar os gargalos crônicos que impedem a rede estadual de ensino de oferecer o mínimo conforto térmico para alunos, mestres e funcionários. De acordo com a secretária de Educação, Raquel Teixeira, das 2.320 escolas geridas pelo governo gaúcho, apenas 633 têm aparelhos de ar condicionado. Outras sequer contam com ventilador funcionando. O Estado afirma que existem recursos para ampliar a climatização, mas as redes elétricas dos prédios são defasadas e não suportam condicionadores de ar. Trata-se de uma debilidade há muito conhecida, sem solução. Os educandários devem ser um ambiente acolhedor em todos os sentidos. A exposição ao calor extremo, por certo, não contribui para uma aprendizagem adequada.