Cada idade vem com as suas crises, mais fáceis de mapear perto das datas redondas. Aos 20 anos, lembro do meu choque ao assistir Diego & Robinho se sagrarem campeões brasileiros mais novos do que eu. Era sinal de que estava ficando tarde para eu ser descoberto um jovem talento em algo.
Passados os 30, qualquer risoto no ponto correto já é comemorado como um novo talento. O "jovem" eu dispenso, até por falta de alternativa. Mas o tempo passa e novas crises aparecem. E sempre me surpreendem pela obviedade. Como eu nunca havia pensando nisso antes?
Uma das últimas crises balzaquianas tem a ver com a noção e a valoração do tempo. Qualquer novo projeto – um doutorado, uma mudança de emprego ou de cidade, mesmo um relacionamento ficando sério – vem com o questionamento: vale despender esse tempo? Devo embarcar em algo que, valendo a pena ou não, eu só saberei (se é que saberei) depois de quatro, cinco anos, à beira dos 40 anos e de suas crises que ainda desconheço?
Outra epifania dos 30: perceber que nem tudo anda para a frente. Você cresceu acreditando que os seus pais e tios seriam mais evoluídos do que os seus avós. E a sua geração, claro, teria a mente ainda mais aberta do que as duas anteriores. Afinal de contas, você é do tempo em que se recicla lixo e se debate transexualidade na novela, eles são do tempo em que as crianças viajavam no porta-malas da caminhonete e os aviões tinham cinzeiro.
Até o dia em que se ilumina um grande "não necessariamente" diante dos olhos. Você percebe que o nazismo ascendeu quase três séculos depois do iluminismo. Que o Estado Islâmico foi fundado em 2004 e conquista corações em plena Europa com barbáries do califado, extinto em 1924. A Copa de 1994 foi depois da Copa de 1982. Claudia Leitte apareceu 10 anos depois da Daniela Mercury. Nem tudo na humanidade evoluiu naturalmente.
Hoje, ao ligar a TV, minhas duas crises dos 30 anos se unem. Donald Trump, supremacia branca, armas pela vida, igreja se misturando ao Estado, ditaduras ganhando simpatizantes à direita e à esquerda… Tudo isso me provoca, mais do que decepção, uma tremenda angústia.
Sério que farão eu passar uns bons anos da minha breve passagem por este planeta vivendo e argumentando contra isso? Temos tempo a desperdiçar com esse tipo de baboseira?