Quando os cidadãos de Porto Alegre começaram a se assustar com a volta do alagamento em áreas que já haviam secado e a chegada da água imunda a locais antes não alcançados, a primeira justificativa do Dmae foi de que não estava previsto o volume de chuva que caiu ao longo do dia.
O dilúvio de maio de 2024 não foi desenhado em todo seu alcance, mas os primeiros avisos sobre o capítulo desta quinta-feira (23) surgiram ainda no final de semana anterior. Meteorologistas ou apresentadores da previsão do tempo, consternados, quase pediam desculpas por relatar o que estava por vir nesta semana. Era tão óbvio que a primeira manifestação do prefeito Sebastião Melo, depois desse episódio, foi dizer o oposto:
— Sabíamos, sim.
Admitiu, ainda, que houve problemas na passagem de atribuições do Departamento de Esgoto Pluvial (DEP) para o Dmae. Mas insistiu na surpresa com a suposta concentração da precipitação na parte da manhã.
Isso não significa que o Dmae e a prefeitura de Porto Alegre sejam culpados por todos os males da enchente na cidade. Mas alegar surpresa, seja sobre o volume ou sobre o turno da chuva, é admitir falta de informação. E um desrespeito aos cidadãos. A jornalista que assina esta coluna ouviu até de um simpatizante de negacionistas da mudança do clima que a previsão era de precipitação de 100 mm.
A média de precipitação na capital gaúcha nos meses de maio é de 113 milímetros. Ou seja, havia previsão de que poderia cair, em um dia, quase o mesmo volume que costuma cair em um mês. Só o Dmae foi pego de surpresa?
Porto Alegre teve um potente alerta em fevereiro de 2016. Na época, uma tempestade que foi diagnosticada como “microexplosão”, “supercélula” ou “down burst” arrasou parques, shoppings, empresas e outras estruturas da cidade. A coluna apontou que não havia protocolo de emergência e recebeu a resposta de que havia, sim. Como se vê com clareza agora, não havia. Ainda não há, oito anos depois.
É preciso ter respeito e empatia com quem trabalha de forma incessante há vários dias, tentando reduzir o impacto do dilúvio na cidade. O esforço humano não pode ser ignorado e merece reconhecimento. Mas erro tão banal como desconsiderar avisos reiterados precisa mudar a forma como a capital de todos os gaúchos enfrenta a mudança climática.
PARA LEMBRAR: ainda há emergências a atender e uma reconstrução desafiadora pela frente, para as quais será necessária toda a ajuda disponível e mobilizável, por menor que seja. Se for grande, melhor ainda. Se puder, por favor, contribua. Saiba como clicando aqui.