Até quando vamos lembrar das coisas que vivemos e jamais gostaríamos de esquecer? É preciso partir da ideia de que nenhuma lembrança é eterna. Ou a gente esquece, ou morre com a gente.
Tenho medo de esquecer.
O esquecimento é um dos piores castigos pra qualquer pessoa. A vida é tão rápida que as memórias são pedacinhos da gente distribuídos ao longo tempo.
Esquecer é apagar o que existiu, é jogar fora a conexão com o que forma a gente, a nossa personalidade é baseada nas memórias. As lembranças moldam nosso padrão de comportamento. É através delas que é possível compreender quem a gente é, o que nos trouxe até aqui. O que seria (ou será) de nós sem essas informações?
Eu não estou preocupado com a história, com os fatos marcantes do mundo. Eu não quero esquecer jamais o que aconteceu comigo. O ruim e o bom. Muitas lembranças da minha infância são péssimas, mas até disso eu quero seguir lembrando sempre que for preciso.
Perder a lucidez me assusta.
Eu não consigo imaginar o que é viver no esquecimento de uma doença. Sinto calafrios ao imaginar essa possibilidade, não tenho dúvida que esse é meu maior temor.
Haverá de existir um sistema de inteligência artificial, um medicamento, uma terapia capaz de prevenir isso no futuro próximo. Fica meu apelo à ciência: debrucem em estudos, pesquisas, tentativas. Por favor, encontrem uma saída.
Lembrar também é viver. Que sentido a nossa existência teria se não existissem as memórias? Pense como seria viver hoje sem lembrar de nada que aconteceu ontem? De que adiantaria ser feliz agora?
Eu tive uma avó que esqueceu de tudo. Lembro como se fosse ontem. Nunca senti tanta angústia.
Ver alguém não reconhecer os próprios filhos, netos. Não saber nada de si. Não saber onde está. Não ter ideia de nada que acontece naquele espaço. Tudo é desconhecido. As referências não existem. Não há um cheiro, um rosto, um toque que te conecte com o teu eu. Não há mais vida, mesmo vivo.
Perder a memória é desumano. É uma condição que vai contra a beleza de estar vivo. É duvidar de si. Esquecer o passado é jogar-se num abismo branco, sem fundo, sem som, sem nada. É a ausência de tudo.
Não me importa se os outros vão lembrar de mim depois que eu partir, eu só peço para que eu mesmo lembre de mim até o dia de morrer.