Quem passa pela Travessa dos Cataventos, a rua que divide a Casa de Cultura Mario Quinana, depara com uma marca no piso, quase no centro da estrutura, junto aos acessos do prédio histórico. É uma marca irregular, de ferro, em meio às tradicionais pedras portuguesas do calçamento. Trata-se de uma intervenção artística, feita em alumínio fundido, com significado simbólico.
Desde que a conclusão das obras de recuperação da enchente, a linha “Memória das águas” foi instalada no local para demarcar a antiga margem do Guaíba. Ela mostra o limite até onde o rio-lago chegava antes de a área ser aterrada, no século 19. O objetivo é provocar uma reflexão sobre os processos de urbanização e a relação entre civilização e natureza.
Por trás da ideia, está a diretora da instituição, Germana Konrath. Além de gestora cultural, Germana é arquiteta urbanista, mestre e doutora em Planejamento Urbano e Regional pela UFRGS.
A marca, segundo ela, é uma forma de mostrar que a cheia de 2024 não foi uma “invasão” da água, mas um retorno dela ao seu lugar original, antes da intervenção humana. Os aterros sucessivos, realizados na segunda metade do século 19 e ao longo do século 20, faziam parte de um movimento global, seguindo um modelo de urbanização.
Muito disso se perdeu na memória. Era tudo Guaíba. A água invadiu a cidade? Sim, mas a cidade também invadiu a água.
GERMANA KONRATH
Diretora da Casa de Cultura
Porto Alegre, assim como Rio de Janeiro e outros municípios litorâneos e portuários, tanto brasileiros quanto estrangeiros, foram afetados por esse processo, segundo o qual a expansão urbana foi visto como uma forma de progresso, apesar dos impactos ambientais.
A linha será permanente no local e estabelece um contraponto a outra marca, a da cota de inundação, pregada na fachada da Casa de Cultura desde 2024, quando a enchente chegou a mais de 1,5 metros de altura junto à Rua Sete de Setembro.