Já é tradição: entra ano, sai ano, uma encenação carnavalesca repetida há mais de uma década pelo Bloco da Laje — grupo que transformou o Carnaval de rua de Porto Alegre — vira polêmica. A trupe chega a reunir mais de 30 mil pessoas em suas apresentações.
Como mostrou o jornalista Vitor Netto, na coluna do Rodrigo Lopes, imagens do último cortejo, no domingo passado (26), levaram a vereadora de Porto Alegre Mariana Lescano (PP) a formalizar denúncias ao Ministério Público e à Polícia Civil. As gravações mostram um homem fantasiado de Jesus Cristo usando tanga. No vídeo, visto de forma descontextualizada, parece ser um striptease.
Mariana fez as denúncias com base no artigo 208 do Código Penal Brasileiro, que tipifica intolerância religiosa como crime.
A discussão é controversa, mas me arrisco a dizer — de forma respeitosa, sendo de família luterana e reconhecendo o direito de quem discorda — que não é para tanto. Vou explicar por que penso dessa forma.
No último episódio do Perimetral Podcast, que foi ao ar na sexta-feira (25), Paulo Germano e eu conversamos com Júlia Rodrigues, uma das fundadoras do bloco, e Vini Silva, mestre de bateria, sobre esse assunto, entre outros temas. Eles explicaram a encenação. A história também foi contextualizada no programa Timeline.
A cena ocorre durante a música "Pregadão", que fala em "tirar Jesus da cruz". É uma canção bem humorada e irreverente, como toda música carnavalesca. Está dentro de um contexto.
O ator começa a cena de terno e gravata, como um homem comum. Ele se despe e revela a identidade de Jesus. O personagem é apresentado como um símbolo de amor, perdão e compaixão.
Na sequência, o bloco tira Jesus da cruz para que ele possa brincar o Carnaval. Ele termina nos braços do povo, sendo carregado. O bloco canta que Jesus também é "mulher" e "negão", e ele passa a coroa para "outros Cristos".
Você pode enxergar tudo isso como uma afronta à fé ou, ao contrário, como uma mensagem de libertação e de esperança. Jesus, afinal, somos todos nós, e, ali, por um instante, pulando Carnaval, ele parou de sofrer pelos pecados da humanidade e foi feliz.