Não é só o presidente Jair Bolsonaro (PL) que optou pelo silêncio desde que foi derrotado nas urnas por seu arquirrival, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), no domingo (30). Os integrantes das Forças Armadas também estão quietos, seja em público (o que é normal e até determinado pelos regulamentos da caserna), seja em conversas de bastidor. Tentam evitar polêmica e pressão por preposicionamento, nesse delicado momento de transição.
Este colunista tem sido questionado de o porquê dos militares não desbloquearem rodovias. Como o leitor sabe, caminhoneiros, inconformados com a derrota de Bolsonaro, bloquearam estradas em 11 Estados. Só no Rio Grande do Sul são 14 pontos com trânsito interrompido ou dificultado pela ação dos transportadores de carga.
A primeira razão alegada pelos militares para não agir nas estradas é que isso é missão natural das polícias rodoviárias Federal e estaduais. Estão certos. Acontece que a PRF no domingo fez intensa mobilização para evitar tráfego de veículos em más condições (e parou muitos ônibus com eleitores, o que fez a oposição dizer que era manobra para beneficiar o candidato Bolsonaro). Já após o resultado das eleições, os bloqueios de caminhoneiros foram montados e não foram removidos. A oposição, mais uma vez, vê nisso um "cruzar de braços" dos policiais rodoviários para uma ação de militantes bolsonaristas que pode ser caracterizada como ilegal.
Discussões políticas à parte, resta saber o que os militares poderiam fazer. Ora, as Forças Armadas podem atuar em patrulhamento de ruas. No próprio dia da eleição elas fizeram missão de GVA (Garantia de Votação e Apuração), em locais de clima político instável ou delicado, com soldados em frente às seções eleitorais prevenindo distúrbios.
No caso dos bloqueios de estradas, os militares poderiam executar missões de GLO (Garantia da Lei e da Ordem). Elas são desencadeadas quando há distúrbios de rua, greves de policiais e/ou ameaça de invasão ou depredação de instalações estratégicas do país (portos, aeroportos, refinarias, sedes de ministérios e de governos em geral). Já foram feitas várias GLO em anos passados. Tudo dentro da normalidade democrática.
Existem ainda duas medidas excepcionais, geralmente tomadas quando a animosidade nas ruas se assemelha a uma pré-guerra civil. Uma delas é o Estado de Defesa, decretado pelo presidente da República e que precisa ser aprovado pelo Congresso. Ele pode acarretar em restrição do direito de reunião e do sigilo telefônico, assim como ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos. O Congresso deve continuar funcionando enquanto o estado de defesa estiver em vigor. A outra medida, mais grave, é o Estado de Sítio, que o presidente pode decretar, mediante aprovação prévia pelo Congresso. Ele permite impor toque de recolher, restrição severa a deslocamentos, restrição ao sigilo de comunicações e outros poderes excepcionais aos militares, como prisões e ingresso em alguns locais sem prévia ordem judicial.
Lógico que nenhuma dessas medidas excepcionais está no horizonte dos fardados. O máximo que se fala é em GLO, mas com um detalhe: essa missão de garantia da ordem precisa ser solicitada por algum governador e aprovada pelo presidente. Resta saber se Jair Bolsonaro tem interesse em promover o desbloqueio das rodovias por parte de caminhoneiros que o apoiam. Alguns aliados do presidente solicitam que ele distensione o ambiente e recomende aos motoristas que voltem para casa, para normalização da situação do país. A ver como serão os próximos passos.