Os primeiros galhos da tipuana em frente a um prédio da UFRGS na Avenida João Pessoa, em Porto Alegre, já tinham sido cortados quando Carlos Alberto Dayrell subiu na árvore, aproveitando a hora de almoço dos operários da Secretaria de Obras. O impulso do estudante de 20 anos acabou virando notícia internacional e marcou a luta movida pela Agapan contra o corte e a poda indiscriminada de árvores. A entidade completa 50 anos nesta terça-feira (27).
A árvore está até hoje em pé junto ao Viaduto Imperatriz Leopoldina, no pátio da faculdade de Direito. Naquele 25 de fevereiro de 1975, muitas pessoas passavam e nada faziam ao ver a derrubada das plantas, em razão de uma obra. Carlos, que já participava das reuniões de Agapan, não tinha nada premeditado. Mas decidiu agir.
– Eu morava na casa de estudantes, e nesse dia estava saindo pra fazer a matrícula da faculdade (para engenharia elétrica). Eu e um amigo vimos os garis cortando as árvores e ficamos pensando: o que a gente pode fazer? – rememora Carlos, 45 anos depois do evento.
Carlos lembrou dos discursos do então presidente da Agapan, José Lutzenberger, e de um protesto na Alemanha citado por ele, onde as pessoas se acorrentaram a árvores que seriam derrubadas para a construção de uma estrada. Não tinha nada para se amarrar, mas sua calça boca de sino e camisa de manga curta e botões não o impediram de escalar a árvore.
O ato chamou a atenção das pessoas no chão, que se solidarizaram. Algumas lhe alcançaram garrafas de água e sanduíches, enquanto outras apareciam com cartazes pedindo: "mais verde, menos concreto". Outros dois estudantes acabaram se juntando a Carlos sobre os galhos.
Quando voltaram do almoço, os funcionários encontraram uma centena de pessoas cercando o local. A Polícia Militar chegaria uma hora depois, mas em vez de tentar tirá-los, passou um cordão de isolamento ao redor da árvore.
As autoridades usavam um megafone para falar com os jovens. Lá pelas tantas, chegou um caminhão dos bombeiros com escada Magirus. A pressão foi tanta que o diretor da Escola de Engenharia da UFRGS acabou subindo na árvore para negociar a descida. Ele conseguiu levar Carlos à prefeitura, para ouvir do secretário de Obras que a árvore não seria cortada.
Ao voltar à tipuana para anunciar a vitória, Carlos deparou com uma confusão: revoltadas com a prisão dos outros dois estudantes que subiram na árvore, pessoas que acompanhavam o protesto reagiram. Os policiais reprimiram as objeções com gás lacrimogêneo e cassetetes.
Lutzenberger foi pedir a soltura dos jovens e declarou à imprensa:
– Agora vamos lutar cada vez mais, pois sentimos que os jovens entenderam o objetivo de nossa entidade. A causa que abraçaram merece qualquer sacrifício.
Carlos destaca que esse episódio e seu envolvimento com a Agapan acabariam marcando sua história – largou a engenharia eletrônica, virou agrônomo e hoje atua com agroecologia no norte de Minas Gerais. Ele comenta:
– A gente está vivendo uma crise infinitamente maior do que a dos anos 1970, mas aquilo me fez ver que é possível sair mudando a realidade através da ação.