Prestes a completar um ano, a nova Lei Seca aumentou o cerco aos motoristas embriagados e elevou o número de autuações e prisões no Estado. Mas a mudança de comportamento esbarra na conscientização dos condutores sobre o perigo da mistura álcool e direção.
Apenas nas rodovias estaduais e federais gaúchas, o impacto da mudança na lei favoreceu o acréscimo de quase um terço no número de motoristas presos. De janeiro a novembro de 2012, houve 1,3 mil detenções devido à embriaguez nas estradas - vias de alto risco para acidentes graves. Este ano, no mesmo período, os policiais rodoviários conduziram 1,8 mil motoristas às delegacias.
As vias federais registraram 12% mais autuações (quando a quantidade de álcool fica abaixo do limite para ser considerado crime) e 21% mais prisões - quando atinge esse limite (quadro ao lado). Parte disso se deve a um grande avanço no número de abordagens, que triplicaram e chegaram a 97 mil. Nas estradas estaduais, houve queda no número de multas (-28%), mas também aumentou consideravelmente o número de detenções, com um acréscimo de 38%.
O cerco nas estradas gaúchas
O superintendente da Polícia Rodoviária Federal (PRF) no Estado, Jerry Adriane Dias Rodrigues, afirma que o maior rigor trazido pela mudança na lei estimulou os policiais a abordar mais condutores e facilitou a condução dos motoristas com sinais de embriaguez - mesmo sem realizar o teste do bafômetro - às delegacias.
Testemunho facilita detenção
O problema é que a punição depende da interpretação dos delegados. Em alguns casos, o testemunho do policial é considerado suficiente para manter o suspeito preso. Em outros, ele é solto se não houver mais provas.
- Preocupa que um mesmo caso será enquadrado (como crime) em um lugar e, em outro, não. Nossa ideia é de que deveria haver um tratamento isonômico para que a lei tenha mais força, e o condutor saiba que terá o mesmo tratamento se beber e dirigir. Mas respeitamos o entendimento dos delegados - diz Rodrigues.
Titular da Delegacia de Lesões Corporais de Trânsito, Daniela Duarte comenta que não há uma orientação geral. É preciso analisar caso a caso.
- Depende sempre do caso concreto, se tem provas ou outros indicativos, como acidente. Os delegados têm autonomia para decidir sobre a autuação em flagrante, mas é um crime suscetível ao pagamento de fiança e, via de regra, é o que ocorre - explica.
O impacto do álcool
Incluída há um ano, a admissão do testemunho do policial como prova de embriaguez facilita a prisão, mas, segundo o chefe da comunicação social da Polícia Rodoviária Federal (PRF) no Estado, Alessandro Castro, nem sempre é considerado suficiente:
- Para a punição administrativa, o testemunho serve. Mas alguns delegados exigem outras provas para confirmar a prisão, como outras testemunhas, ou prova em vídeo.
Neste sentido, a PRF discute dotar policiais de celulares capazes de filmar, por exemplo. A apresentação de vídeos pelos agentes ainda é tímida, conforme a delegada Daniela. O mais comum é chegarem com um documento por escrito com os sintomas aparentes na pessoa. Por isso, delegados da Capital costumam encaminhar o motorista detido para um exame clínico feito por profissionais do Departamento Médico Legal (DML).
RELEMBRE O QUE MUDOU
PROVAS
Em 20 de dezembro do ano passado, a presidente Dilma Rousseff sancionou a nova lei. Veja os principais pontos
- Nas blitze, os agentes de trânsito e policiais ganharam mais chances de comprovar que o motorista dirige sob efeito de álcool. O testemunho de policiais e de terceiros, a gravação de vídeos e testes clínicos também passaram a valer na prisão de condutores.
CONTRAPROVA
- Se o condutor autuado por embriaguez se sentir injustiçado com a avaliação do agente de trânsito durante a blitz, pode voltar atrás e se submeter ao teste de bafômetro.
MULTAS
- A nova lei aumentou o valor a ser pago por dirigir alcoolizado. O condutor autuado passou a desembolsar R$ 1.915,40, o dobro da multa anterior (R$ 957,70). Em caso de reincidência em período de 12 meses, o valor tem acréscimo de 100%: R$ 3.830,80.
É CRIME DE TRÂNSITO
- Quando o motorista apresenta dosagem acima de 0,33 miligramas de álcool por litro de ar expelido dos pulmões ao soprar o bafômetro ou tem concentração de álcool por litro de sangue igual ou maior a 6 decigramas.
Comportamento ainda é um desafio
A ampla divulgação das mudanças e dos procedimentos a que motoristas podem ser submetidos fez com que muitos temessem a punição e, com isso, alterassem alguns costumes no trânsito ao longo deste ano. Para o juiz aposentado e advogado de causas no trânsito Nei Pires Mitidiero, o rigor inibiu que muitas pessoas continuassem ingerindo álcool antes de pegar o volante:
- As pessoas pensam três vezes antes de beber, porque sabem que podem parar na delegacia, arcar com fiança e um processo criminal.
No entanto, a conscientização, especialmente entre os mais novos, ainda não atingiu o nível necessário, acredita o sociólogo e especialista em educação e segurança no trânsito, Eduardo Biavati. Para ele, a fiscalização é fundamental no processo de mudança do comportamento:
- A nova lei deu mais ferramentas e mais poder, mas ainda estamos esperando uma expansão da fiscalização para dar mais resultado. Queria ouvir jovens dizendo "não vou nem arriscar", mas eles sabem que é muito difícil ser pego em blitz, é uma questão de dar o "azar" de encontrar uma.
Para o comandante do Comando Rodoviário da Brigada Militar, coronel Fernando Alberto Grillo Moreira, a nova legislação facilitou o enquadramento de condutores, mas a mudança de comportamento é parcial:
- Em alguns locais e horários, percebemos que há um maior cuidado dos motoristas. Mas em outras situações percebemos que as pessoas ainda bebem e dirigem.
UM ANO DE MAIS RIGOR
Nova Lei Seca eleva prisões no trânsito do RS
Entre janeiro e novembro deste ano, 1,8 mil motoristas foram detidos por embriaguez nas estradas estaduais e federais gaúchas
GZH faz parte do The Trust Project