
O lobo-terrível ("dire wolf", em inglês) foi considerado extinto há mais de 10 mil anos. Na segunda-feira (7), a empresa norte-americana de engenharia genética Colossal Biosciences anunciou a "desextinção" da espécie. Para tentar recriar o animal pré-histórico, os cientistas utilizaram técnicas de edição genética que exigem atenção.
A partir de dois fósseis do lobo-terrível — um dente e um osso do ouvido interno de um crânio —, os cientistas sequenciaram o DNA antigo para ter uma ideia de como era o material genético dessa espécie. Com essas informações, realizaram uma edição gênica de células de uma espécie atual — o lobo-cinzento —, que tem parentesco com o lobo-terrível, para deixar as características mais próximas das do animal extinto.
"Ao utilizar edição de ponta baseada em CRISPR, a Colossal ressuscitou uma espécie perdida no tempo, demonstrando o poder da biologia sintética para reverter a extinção", escreveu a empresa. A técnica, pronunciada como "crísper", é como uma tesoura genética programável, que permite que os cientistas cortem, removam ou troquem precisamente partes do DNA.
Marco Antonio Marinho, professor do Departamento de Ecologia, Zoologia e Genética do Instituto de Biologia da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), lembra que essa técnica já foi utilizada em humanos. Em 2018, o cientista He Jiankui anunciou o nascimento de gêmeas com o DNA alterado para que pudessem resistir ao vírus HIV que o pai havia contraído. Para Marinho, há questões morais envolvidas:
— Isso foi algo que aconteceu em 2018, quando esse cientista chinês disse que havia editado embriões humanos usando o CRISPR-Cas9. Trouxe um monte de implicações éticas, como se estivessem brincando de Deus fazendo esse tipo de alteração — avalia.
Lobo-cinzento, lobo-terrível ou híbrido?
O experimento gerou três espécimes: dois machos, Romulus e Remus, e uma fêmea, Khaleesi. Marinho defende que ainda não é possível chamar os animais de lobos-terríveis porque a Colossal não submeteu um artigo científico para a revisão de pares. Por enquanto, para o pesquisador, trata-se de lobos cinzentos com características de lobo-terrível.
— Dentro da genética, usamos o termo híbrido de uma forma mais estrita para quando duas linhagens se cruzam. Então, por exemplo, o lobo selvagem consegue cruzar com o cão doméstico, e aí geram um híbrido que tem metade do DNA de uma linhagem e a outra metade de uma outra linhagem. Não dá para chamar esse lobo-terrível da nova geração de híbrido — explica.
Pontos negativos e positivos
Marinho, doutor em Genética e Biologia Molecular, também teme que a possibilidade da "desextinção" desestimule os esforços para a conservação das espécies. Ou seja, por saber que é possível trazer animais de volta à vida, as pessoas deixem de se preocupar em evitar a extinção. Apesar disso, ele acredita que há pontos positivos no feito da Colossal.
— Do ponto de vista técnico, de metodologia de pesquisa, obviamente eles estão fazendo vários avanços. Inclusive, se tudo se comprovar, o número de edições feitas no genoma do lobo-cinzento deve ser o maior número já feito no genoma de uma espécie. O recorde atual de edições era de oito genes, e para a transformação desse lobo-cinzento foram feitas 20 edições — pondera.