Cinco pesquisadores gaúchos estão na lista dos mais citados do mundo, divulgada em 15 de novembro pela empresa de análises Clarivate. O Highly Cited Researchers 2023 traz os cientistas que demonstraram influência significativa e ampla em seus campos de pesquisa. Cada pesquisador selecionado é autor de múltiplos artigos altamente citados, que estão no top 1% de citações em suas áreas e ano de publicação na Web of Science na última década.
Em 2023, foram 7.125 designações de pesquisadores altamente citados em todo o mundo. Desse total, 19 são brasileiros – e destes, cinco gaúchos, que representam 26% da lista (confira abaixo). Da população mundial de cientistas e cientistas sociais, os pesquisadores altamente citados são um em cada mil. "Esta pequena fração da população mundial de pesquisadores contribui desproporcionalmente para alargar as fronteiras do conhecimento e obter para a sociedade inovações que tornem o mundo mais saudável, mais sustentável e mais seguro", afirma a instituição.
Porém, vale destacar que a atividade de citação não é o único indicador da seleção. Uma lista preliminar é refinada utilizando análise qualitativa e opinião de especialistas.
Para o diretor científico do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), professor Olival Freire Junior, quando os levantamentos apresentam pesquisadores brasileiros entre os mais citados do mundo é motivo de contentamento.
— Eu diria que o aspecto que mais me chama atenção é que, no caso desses cinco pesquisadores, todos eles são de áreas diferentes, gerações diferentes, instituições gaúchas diferentes. Mas eles têm em comum pesquisas que têm um impacto social muito significativo — avalia.
Freire cita o caso do professor Cesar Gomes Victora, de Pelotas, que recebeu recentemente o Prêmio Almirante Álvaro Alberto do CNPq. Victora é pesquisador na área de epidemiologia – portanto, saúde pública – e desenvolve um trabalho de “enorme impacto mundial”.
— Muitas das práticas nutricionais e médicas que são adotadas hoje no mundo inteiro relativas à nutrição infantil, em particular o papel da amamentação nos primeiros anos, foram adotadas a partir dos estudos feitos pelo professor — enfatiza.
Qualidade da ciência gaúcha
A lista é uma evidência de onde a boa ciência é produzida no Brasil, conforme o diretor científico do CNPq. Outros índices, como qualidade de cursos de pós-graduação, número de pesquisadores do CNPq ou presença em academias científicas, apresentam padrão semelhante.
— Esse resultado não surpreende quem conhece a ciência brasileira e, portanto, a excelência da ciência praticada no Rio Grande do Sul — destaca.
Dos cinco pesquisadores gaúchos, quatro são vinculados a universidades públicas. Para Freire, isso reflete o fato de que a maior parte da pesquisa (mais de 80% dos artigos publicados) está nas universidades – com espaço preponderante para as públicas. Freire aponta que há alguns casos de instituições privadas, por vezes religiosas, também de "excelente qualidade", com tradição de ensino e pesquisa de qualidade, como a PUC. Contudo, o fenômeno é muito recente no Brasil nas instituições privadas em geral, configurando uma limitação.
Além disso, na contramão de países de médio e alto desenvolvimento, o estímulo à pesquisa em inovação tecnológica no mundo empresarial brasileiro ainda é muito limitado, bem como a absorção da mão de obra qualificada – constituindo uma fraqueza da economia brasileira, de acordo com o diretor do CNPq. Há exceções, como a Petrobras, a Embraer, o Instituto Tecnológico de Aeronáutica, certas áreas do agronegócio e a Embrapa.
O diretor científico lembra ainda que a boa ciência é possibilitada por órgãos de fomento federais e estaduais, como o CNPq, a Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (Fapergs) – além, é claro, das universidades e instituições, que têm apoiado a pesquisa de qualidade.
Falta de representatividade
Ainda que o resultado seja motivo de celebração, há muito a avançar: entre os pesquisadores gaúchos, não há nenhuma mulher ou negro na lista. Freire reconhece a debilidade da ciência brasileira:
— É uma limitação não só por razões de interesse social de maior inclusão ou de reparação histórica, o que em si é uma coisa relevante. Nós precisamos avançar nesse sentido também porque uma ciência mais diversa é necessariamente uma ciência melhor. Essa é a lição que o mundo inteiro tem extraído, e as políticas de inclusão e equidade de gênero, étnico-racial, no mundo inteiro, estão movidas por isso. Então é um grande desafio que nós temos, aumentar a diversidade, ampliar a inclusão na ciência brasileira, para melhorar a qualidade da ciência brasileira.
Em vista disso, o governo e o CNPq devem lançar, até o final de 2023, um edital de cerca de R$ 100 milhões, visando promover a inclusão de mulheres em áreas científicas onde estão subrepresentadas – particularmente na computação e na engenharia.
Os pesquisadores gaúchos entre os Highly Cited Researchers 2023
- Carlos Henrique Escosteguy Barrios - PUCRS/Grupo Oncoclínicas
Possui graduação em Medicina pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (1979). Professor assistente adjunto na Miami University School of Medicine. Diretor e pesquisador principal do Centro de Pesquisa em Oncologia do Hospital São Lucas da PUCRS. Diretor do Grupo Latino-americano de Investigação Clínica em Oncologia. Médico e coordenador de pesquisa clínica do Grupo Oncoclínicas. Tem formação na área de medicina interna, hematologia e oncologia clínica na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Miami University School of Medicine (EUA) e Washington University School of Medicine (EUA). Áreas de atuação e interesse: câncer de mama, câncer de pulmão e pesquisa clínica. Já participou de mais de 300 projetos de pesquisa clínica nacionais e internacionais.
- Cesar Gomes Victora - UFPEL
Possui graduação em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. É professor emérito de Epidemiologia na Universidade Federal de Pelotas. É PhD em Epidemiologia da Assistência Médica pela Escola de Higiene e Medicina Tropical da Universidade de Londres (1983). Em 2018, recebeu o título de Doutor Honoris Causa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Realizou extensas pesquisas em diversos Estados brasileiros e atuou como pesquisador ou consultor em mais de 40 países, assessorando a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF). Suas pesquisas incluem as áreas de saúde e nutrição materno-infantil, amamentação, coortes de nascimento, desigualdades sociais e avaliação de programas de saúde, tendo resultado em mais de 740 publicações científicas com mais de 60 mil citações no Web of Science. Suas principais contribuições científicas incluem a documentação da importância do aleitamento materno exclusivo para prevenir a mortalidade infantil e a construção de curvas de crescimento infantil atualmente adotadas em mais de 140 países. Atua como pesquisador do CNPq, professor visitante das universidades Harvard, Oxford e Johns Hopkins e membro do conselho editorial de várias revistas, inclusive The Lancet. Em 2008, recebeu o Prêmio Abraham Horwitz para Liderança em Saúde Interamericana, da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Foi presidente da Associação Epidemiológica Internacional (2011-2014) e, em 2021, recebeu o Richard Doll Award, sua maior distinção. Foi admitido para o The World Academy of Sciences, da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) em 2018. Atua como membro do Conselho Científico da OMS. Em 2023, foi agraciado com o Prêmio Almirante Álvaro Alberto (CNPq/Marinha do Brasil) e com a medalha de Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico, entregue pelo presidente da República.
- Felipe Barreto Schuch - UFSM
Possui graduação em licenciatura plena em Educação Física (2008) e mestrado (2011) e doutorado (2015) em Ciências Médicas: Psiquiatria pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Atualmente é professor adjunto da Universidade Federal de Santa Maria. Coordenador do grupo de pesquisa em exercício físico e saúde mental da UFSM. Orientador em programas de pós-graduação da UFSM e da UFRJ. Membro da força-tarefa em medicina do estilo de vida para depressão da World Federation of Societies of Biological Psychiatry e da força-tarefa em exercício físico e nutrição para o transtorno do humor bipolar da International Society for Bipolar Disorders. É editor e membro do corpo editorial de revistas e jornais especializados.
- Guilherme Luiz Dotto - UFSM
Possui graduação em Engenharia de Alimentos (2008) e mestrado (2010) e doutorado (2012) em Engenharia e Ciência de Alimentos pela Universidade Federal do Rio Grande. É professor do Departamento de Engenharia Química da Universidade Federal de Santa Maria e bolsista de produtividade em pesquisa do CNPq. Atua nas áreas de fenômenos de transporte, operações unitárias, tratamento de efluentes líquidos, sistemas particulados e processos de separação. Tem experiência nas operações de adsorção, biossorção e secagem, nas quais possui mais de 400 artigos publicados em periódicos indexados. Atua como revisor de mais de 120 periódicos internacionais e é membro do corpo editorial de diferentes periódicos, em editoras como Springer, Elsevier e Taylor & Francis.
- Luis Augusto Paim Rohde - UFRGS
Professor titular do Departamento de Psiquiatria e Medicina Legal da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, diretor do Programa de Déficit de Atenção/Hiperatividade no Hospital de Clínicas de Porto Alegre e vice-coordenador do Instituto Nacional de Psiquiatria do Desenvolvimento. Professor da pós-graduação em Psiquiatria da Universidade de São Paulo. Professor convidado e membro do Conselho das Faculdades de Medicina do Grupo UNIEDUK. Fez seu mestrado e doutorado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Foi editor de periódicos nacionais e internacionais e atualmente é editor associado do Journal of Attention Disorders. Foi vice-presidente da International Association of Child Adolescent Psychiatry and Allied Disciplines. Foi presidente da World Federation of ADHD. Publicou cerca de 450 artigos científicos, 50 capítulos de livros ou editoriais, e é organizador ou editor de 10 livros sobre saúde mental de crianças e adolescentes no Brasil, Inglaterra, Alemanha e Estados Unidos. Tem cerca de 38 mil citações per doc. Eleito pesquisador do ano na área de saúde pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio Grande do Sul e segundo lugar na área de saúde no Brasil pela Conselho Nacional de Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa em 2021.