Mesmo afastada do serviço público após a aposentadoria, não era incomum Nara Denise dos Santos, 61 anos, tentar interceder por alguma pessoa que estava precisando de auxílios. Entre amigos, familiares e conhecidos, é lembrada como uma mulher amorosa, de coração bom e que estava sempre disposta a ajudar. Pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), concorreu no último pleito ao cargo de vereadora em Osório, de onde era natural.
No último sábado (6), o corpo de Nara foi encontrado dentro de casa, no interior de uma geladeira, e o companheiro dela foi preso pelo crime. O assassinato chocou o município do Litoral Norte.
— A mulher com o coração mais bondoso que já conheci. Guerreira, confiante, esperançosa, irmã, amiga, tia. Um sorriso que por onde chegava iluminava o ambiente. Ajudava todo mundo e não media esforços para isso — diz uma amiga próxima, que preferiu não se identificar.
A brutalidade do crime de que Nara foi vítima fez algumas pessoas ficarem com receio de falar sobre o caso. Marcos do Nascimento Falavigna, 37 anos, que mantinha relacionamento com ela havia cerca de seis anos, admitiu informalmente o crime. Ele foi preso em flagrante por feminicídio e ocultação de cadáver.
Candidata
Nara atuou em cargos de confiança pelo PDT em setores públicos, como a Câmara de Vereadores, prefeitura e outros locais. O último em que esteve, como auxiliar administrativo, foi a Câmara, onde se aposentou havia cerca de cinco anos. Em 2020, concorreu ao cargo de vereadora, e obteve 108 votos – não chegou a ser eleita.
— A gente não se conforma. Ela estava sempre de bom humor, era divertida, amorosa. Recebia todo mundo bem. Por mais que já estivesse aposentada, estava sempre ajudando as pessoas — recorda a amiga, Sandra Borba, 59 anos, que também trabalha na Câmara.
— Ela era assim, tinha um coração bom e, ao mesmo tempo, era muito divertida — complementa Camila Knack, 48 anos.
Depois da aposentadoria, Nara passou a ajudar uma das irmãs, que é doceira na cidade. Nara vinha de uma família de mulheres, num total de cinco irmãs, que perderam os pais cedo e se tornaram bastante unidas. Sem filhos biológicos, ajudou a cuidar dos sobrinhos.
Quando conheceu Marcos, passou a ajudar também na criação do filho dele, que ainda é adolescente. As amigas lembram que Nara tratava o garoto com muito afeto. Nas redes sociais, fazia posts se referindo ao adolescente como “filho”.
— Ela tinha um sorriso contagiante. O fato de não ter filhos fazia com que ela fosse ainda mais amorosa com os sobrinhos. E esse menino (filho do companheiro), ela abraçou ele. Tratava como uma mãe zelosa — conta uma amiga de Nara.
A aposentada havia se mudado com o companheiro havia cerca de dois meses para o endereço onde estavam residindo, numa casa alugada. Nara estava evitando sair, em razão de um tratamento de saúde para câncer.
Manifestação
O PDT de Osório emitiu uma nota, na qual lamenta a morte de Nara. No texto, o partido afirma que Nara Denise "sempre demostrou força, garra e alegria de viver. Uma apaixonada pela luta partidária e tradicional militante da família PDT, tendo sido inclusive candidata a vereadora no último pleito municipal".
No próximo fim de semana, uma manifestação será realizada em Osório. O protesto está marcado para ocorrer às 10h de sábado (13), no Largo dos Estudantes. A intenção é alertar para casos de feminicídio, como o de Nara, levando cartazes e balões brancos.
— Queremos pedir justiça, que esse crime não fique impune. Mas também pedimos paz e não ao feminicídio. Quantas Naras estão sendo agredidas, manipuladas, usadas, e não cogitam ir embora e pedir ajuda? Nossa ideia é alertar pra isso — diz uma das organizadoras.
Investigação
A polícia deve concluir a investigação até o início da próxima semana, em razão do prazo de 10 dias por conta da prisão do investigado. Após o flagrante, foi decretada a prisão preventiva. Segundo a Polícia Civil, não havia nenhum registro anterior de Nara contra o companheiro. Marcos não tinha nenhuma ocorrência envolvendo violência doméstica até o momento.
A perícia deverá indicar a forma como a vítima foi assassinada. Segundo a polícia, a principal hipótese é de que o companheiro de Nara tenha cometido o crime sozinho.
Sobre o caso, a Polícia Civil destacou que o o esclarecimento da autoria e motivação se deu “em razão da rápida e eficiente ação integrada entre a Polícia Civil, por meio da delegacia de Osório, e policiais militares do CRPO/LITORAL”. Segundo a polícia, diligências preliminares foram realizadas, perícias requisitadas, oitavas de testemunhas, coleta de todos os elementos possíveis para esclarecer a autoria, que resultou na prisão em flagrante do suspeito, com homologação pelo judiciário e conversão em prisão preventiva.
Contraponto
À Polícia Civil Marcos do Nascimento Falavigna optou por permanecer em silêncio. A Polícia Civil informou que até o momento não houve apresentação de defesa por parte do investigado. GZH busca contato com a defesa.
Como pedir ajuda
Brigada Militar – 190
- Se a violência estiver acontecendo, a vítima ou qualquer outra pessoa deve ligar imediatamente para o 190. O atendimento é 24 horas em todo o Estado.
Polícia Civil
- Se a violência já aconteceu, a vítima deverá ir, preferencialmente à Delegacia da Mulher, onde houver, ou a qualquer Delegacia de Polícia para fazer o boletim de ocorrência e solicitar as medidas protetivas.
- Em Porto Alegre, a Delegacia da Mulher na Rua Professor Freitas e Castro, junto ao Palácio da Polícia, no bairro Azenha. Os telefones são (51) 3288-2173 ou 3288-2327 ou 3288-2172 ou 197 (emergências).
- As ocorrências também podem ser registradas em outras delegacias. Há DPs especializadas no Estado. Confira a lista neste link.
Delegacia Online
- É possível registrar o fato pela Delegacia Online, sem ter que ir até a delegacia, o que também facilita a solicitação de medidas protetivas de urgência.
Central de Atendimento à Mulher 24 Horas – Disque 180
- Recebe denúncias ou relatos de violência contra a mulher, reclamações sobre os serviços de rede, orienta sobre direitos e acerca dos locais onde a vítima pode receber atendimento. A denúncia será investigada e a vítima receberá atendimento necessário, inclusive medidas protetivas, se for o caso. A denúncia pode ser anônima. A Central funciona diariamente, 24 horas, e pode ser acionada de qualquer lugar do Brasil.
Defensoria Pública – Disque 0800-644-5556
- Para orientação quanto aos seus direitos e deveres, a vítima poderá procurar a Defensoria Pública, na sua cidade ou, se for o caso, consultar advogado(a).
Centros de Referência de Atendimento à Mulher
- Espaços de acolhimento/atendimento psicológico e social, orientação e encaminhamento jurídico à mulher em situação de violência.