O Departamento Estadual de Investigações do Narcotráfico (Denarc) apura um novo método que estaria sendo utilizado por traficantes de entorpecentes no Rio Grande do Sul. Trata-se da coloração de cocaína para uma apresentação diferenciada aos consumidores. A intenção seria associar a ideia de qualidade superior da droga e atribuir um valor mais elevado no tráfico aos consumidores. Estimativa da Polícia Civil é de que preço poderia triplicar.
A apreensão que deu origem ao trabalho de investigação sobre a presença da cocaína cor-de-rosa no Estado ocorreu em operação deflagrada no dia 10 de outubro em São Sebastião do Caí, no Vale do Caí. A ação teve como alvo um laboratório para refino, embalagem e distribuição do entorpecente a operadores do esquema de venda na Região Metropolitana, no Vale do Sinos e na Serra.
— Acreditamos que seja uma estratégia para agregar valor e chamar a atenção dos consumidores para um produto que seria mais sofisticado e valioso, mas que na verdade traz o perigo de ser um produto tóxico com altíssimo poder destrutivo — aponta o diretor de investigações do Denarc, delegado Alencar Carraro.
O delegado conta que os investigadores chegaram a cogitar que o produto pudesse ser a droga sintética conhecida como 2-CB, uma metanfetamina de alto poder tóxico. Contudo, após exames no Instituto-Geral de Perícias (IGP), foi constatado que se tratava de cocaína colorida.
— A perícia indicou que o objeto da apreensão era cocaína com alto teor de concentração, o que fortalece a hipótese de que a droga teria sido colorida para adquirir um aspecto diferenciado e render um ganho maior aos criminosos — diz Carraro.
Dono da droga é o maior distribuidor de cocaína do RS
Coordenador das investigações em campo, o delegado Gabriel Borges afirma que as apurações indicam que o importador da cocaína cor-de-rosa é o homem apontado como maior distribuidor de cocaína do Rio Grande do Sul. Este indivíduo está preso e tem seus movimentos monitorados mesmo dentro da penitenciária onde cumpre medida de reclusão.
— É o mesmo investigado que foi alvo de um trabalho efetivado em março deste ano, quando a polícia realizou a maior apreensão de cocaína desde a fundação do Denarc. Foram mais de 150 quilos naquela ocasião — lembra o delegado.
Borges sustenta que a introdução da cocaína rosa seria uma nova investida deste criminoso para diversificar a oferta de drogas ao mercado consumidor. Na ação de outubro, em São Sebastião do Caí, os agentes apreenderam 40 quilos do entorpecente. Entre os volumes de cocaína, crack e maconha, estavam cerca de 300 gramas do pó rosa.
— Chegamos à conclusão, após verificarmos que se tratava de cocaína e não de metanfetamina, que a nova modalidade da droga estava sendo trazida de forma experimental. A apuração indica que o preço de venda seria o triplo do convencional — comenta.
Operação revelou sistema industrial de processamento
O delegado Gabriel Borges conta ainda que as investigações sobre o esquema criminoso estruturado por este líder de uma fação com berço no Vale do Sinos desfraldou um sofisticado sistema de produção e armazenamento, semelhante a um processo industrial.
— Havia neste sítio um galpão, com equipamentos, ferramentas, depósitos subterrâneos concretados, grande estoque e variedade de insumos utilizados no refino da cocaína. Mas o que mais nos chamou a atenção foi a presença de uma prensa industrial de grande capacidade, parecida com aquelas utilizadas na prensagem de material em usinas de reciclagem — descreve.
Na ocasião, dois homens foram presos em flagrante. Borges diz que eles foram indiciados por tráfico e permanecem presos preventivamente. As investigações prosseguem monitorando a entrada de carregamentos de drogas pelas fronteiras internacionais e divisas interestaduais do Estado, e também com foco em identificar a origem patrimonial dos bens apreendidos.
— Nos preocupa muito a existência deste tipo de droga e de método para estimular o consumo de entorpecentes — define Gabriel Borges. — É muito importante que as famílias tenham diálogo franco com jovens para que não sejam seduzidos por este mercado destrutivo — acrescenta Alencar Carraro.
Conforme o delegado, não houve mais indicativos da circulação da cocaína cor-de-rosa no Rio Grande do Sul. Denúncias podem ser encaminhadas de forma anônima e sigilosa pelo telefone 08000 518 518 do Denarc.
Altíssimo poder destrutivo
Tanto a cocaína cor-de-rosa de alta pureza quanto o composto sintético denominado 2-dimetoxibenzaldeído (2-CB) possuem elevado poder tóxico e destrutivo. Segundo as autoridades, o 2-CB não é muito comum no Brasil por ter alto custo de produção e elevado preço de venda. O fármaco foi desenvolvido em 1974 para auxiliar no tratamento de dependentes químicos.
Em abril deste ano, a droga ganhou notoriedade depois que a necropsia da modelo brasileira Emmily Rodrigues Santos Gomes, 26 anos, revelou o uso da substância. Ela morreu ao cair de um prédio localizado em área nobre de Buenos Aires, na Argentina, sob condições desconhecidas.
Conforme o Conselho Federal de Farmácia (CFF), a 2-CB produz efeito estimulante, despersonalizante e eufórico, semelhantes ao LSD e ao Ecstasy, razão pela qual pode ocasionar alucinações. A cocaína rosa, segundo o CFF, pode causar dependência e levar a uma overdose, pode provocar hipertensão, hipertermia e desidratação. Em doses extremas, o uso pode levar à sobrecarga do coração, causando infarto.