Deputados gaúchos aprovaram na tarde desta quarta-feira (4) por 9 votos favoráveis e nenhum contrário o relatório final da comissão parlamentar de inquérito (CPI) que apurou supostas fraudes de seguradoras de veículos contra clientes no Rio Grande do Sul. Instalada em novembro de 2017, a CPI ouviu 59 pessoas envolvidas com o setor e teve mais de 50 denúncias de clientes e proprietários de oficinas que resultaram em 50 mil páginas de documentos.
O relatório sugere o indiciamento de oito seguradoras: Mapfre Seguros, Bradesco Seguros, Azul Seguros, Sul América, Banco do Brasil Seguro Auto, Liberty Seguros, Mitsui Suminoto Seguros e Caixa Seguros. Na lista também estão três oficinas credenciadas com as empresas.
Segundo o relator da CPI, deputado Tiago Simon, além de depoimentos e análises de notas fiscais e ordens de serviços, irregularidades teriam sido comprovadas durante fiscalização em três oficinais ocorrida na semana passada. Na ação, a força-tarefa composta por Polícia Civil, Ministério Público, Procon e Crea-RS, escolheu aleatoriamente os estabelecimentos e identificou suspeitas de colocação ilegal de peças usadas em veículos cobertos por seguro, uso de peças não originais sem o consentimento do consumidor, falta de nota fiscal e reparo de itens de segurança que, por lei, deveriam ser substituídos quando danificados.
— O consumidor não pode escolher a oficina de confiança e, na prática, o carro dele recebe peças não genuínas em itens de segurança, colocando em risco a vida das pessoas — destacou Simon.
De acordo com a CPI, há indícios de lesão ao consumidor, fomento à criminalidade, formação de cartel e sonegação fiscal. A prática de cartel se evidência, conforme a comissão, pois de 12 mil oficinais atuantes no Estado, apenas 2% delas recebem 80% dos encaminhamentos para reparo por parte das seguradoras. A sonegação ocorre quando peças estariam sendo compradas pelos investigados e encaminhadas para destinatários diferentes dos referidos em notas.
O crime de lesão ao consumidor é apontado pela utilização de peças paralelas em veículos segurados e pela recuperação de peças consideradas itens de segurança, como longarinas, rodas, suspensão, eixos, entre outros. Já o fomento à criminalidade é apontado pois a CPI identificou que veículos em leilões eram comprados por criminosos que pretendiam fazer uso da documentação e de peças para "esquentar" carros roubados. A comissão constatou que, de 1,4 mil compradores de carros em leilões, durante cinco meses de 2017 no Rio Grande do Sul, 14% tinham antecedentes por crimes envolvendo veículos.
O inquérito está tramitando na Promotoria. Vamos definir ainda sobre a formalização de um termo de ajustamento ou até a uma ação. Os indícios são eloquentes de que alguma prática desconforme com o interesse do consumidor está ocorrendo.
ANDRÉ MARCHESAN
Promotor de Justiça
— A sugestão de indiciamento não precisa de prova cabal, mas sim de indícios. Quem irá buscar as provas são Ministério Público e Polícia Civil. Tivemos indícios fortes de lesão ao consumidor, crime contra o código de defesa do consumidor por desrespeito em vários aspectos, como substituição de peças sem concordância do cliente, conserto e reparos de peças sem que o consumidor soubesse. Além disso, identificamos que a a própria escolha das oficinais de confiança do cliente não eram respeitadas — disse o presidente da CPI, deputado Enio Bacci.
Contraponto
O advogado da Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados e de Capitalização (Fenaseg), Paulo Roberto Moreira de Oliveira, discorda do relatório e destaca que as seguradoras apresentaram várias provas, mas nenhuma foi referida pelos deputados.
— Não foi feita perícia nas peças recolhidas e analisadas. A CPI teve essa oportunidade, mas não fez. Agora vamos esperar e ver se, realmente, vai ocorrer alguma coisa por parte do Ministério Público ou Procon, se há mesmo alguma coisa de fundamento nessa CPI. Acreditamos que não e temos provas suficientes para comprovar isso — afirmou Oliveira.
Embora não tenha poder de indiciamento criminal, a CPI repassa o que foi apurado para outros órgãos. Os autos de infração produzidos pelo Procon-RS, após a operação em três oficinas, também compõem as sugestões da CPI.
O relatório final já está sendo analisado no Ministério Público pela Promotoria do Consumidor de Porto Alegre. Segundo o promotor André Marchesan, análise preliminar tem apontado para irregularidades contra o consumidor.
— O inquérito já está tramitando na Promotoria. Vamos definir ainda sobre a formalização de um termo de ajustamento ou até a propositura de uma ação. Os indícios são bastante eloquentes de que alguma prática desconforme com o interesse do consumidor está ocorrendo — disse Marchesan.