Aquela barrinha de cereal entre uma refeição e outra pode não ser uma opção tão saudável quanto se pensa. Um teste feito pela Associação de Consumidores Proteste com 12 marcas constatou que quatro não estão cumprindo o que relatam nas embalagens.
Sobram sódio e gorduras totais e até alguns aditivos controversos, proibidos em outros países. Pelas leis brasileiras, a diferença entre o valor real e o dado declarado nos pacotes é permitida, mas não pode ultrapassar os 20%. No entanto, alguns produtos superaram (e muito!) esse índice.
É o caso da barrinha da Taeq que apresentou 69,4% a mais de gordura total do que o informado no rótulo, além de o sódio ter passado em 26,8% do que diz a embalagem.
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– Usamos 960 unidades de barra de cereal para realizar os testes em dois laboratórios diferentes. Foram feitos exames de veracidade, microbiologia, toxinas e sensorial. Esperávamos encontrar mais fibras nos produtos, afinal a proposta deles é ser produzido com cereais. No entanto, encontramos açúcar e gordura e dois antioxidantes que já foram associados, em diferentes estudos, ao câncer – explica engenheira de alimentos Pryscilla Casagrande, que coordena o Centro de Competência de Alimentação e Saúde da Proteste.
Os aditivos seriam o BHA e o BHT. Em 2011, um relatório do Departamento de Saúde e Serviços Humanos do Programa Nacional de Toxicologia dos Estados Unidos apontou que o primeiro “tem potencial para ser um cancerígeno” e que o segundo pode causar intoxicações sistêmicas. Mais de 50 países já baniram os componentes, que são liberados no Brasil. Nos testes, eles foram encontrados nas barrinhas Quaker, de banana, e Ritter, de castanha.
De acordo com a diretora técnica da Ritter Alimentos, Elizabeth Beiser, em resposta enviada por e-mail à reportagem, "todos os parâmetros analisados apresentaram seus resultados de acordo com a Legislação Brasileira de Alimentos" e que "o BHA e BHT citados são utilizados com a função antioxidante na Barra de Castanha do Pará somente porque são aprovados em regulamento técnico pela Anvisa" e porque "estão de acordo com as especificações da FAO/Who e do Food Chemical Codex". A Quaker não havia respondido os contatos da reportagem até o fechamento desta matéria.
Doces, mas com muito sódio
Quatro barrinhas apresentaram índices de sódio acima do permitido pela legislação brasileira. Nuts tinha 30,3% a mais do elemento do que consta no rótulo, assim como Nutry (29,9%), Trio (26,7%) e Nesfit (22,4%).
– Por serem produtos doces, os consumidores podem esquecer que também têm sódio e, às vezes, além do que declaram – disse Maria Inês Dolci, coordenadora da Proteste.
O açúcar aparece como o primeiro ingrediente nos rótulos de algumas barras, como a Nutry e a Trio de banana, o que indica que ele é o principal ingrediente utilizado no preparo do produto. Ou seja: há mais açúcar que cereais nos produtos. O açúcar também é listado nos rótulos com outros nomes, como maltodextrina, extrato de malte e xarope de glicose.
A Proteste não revela onde os testes foram feitos. A associação afirma que pretende levar os resultados à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e cobrar uma legislação mais clara sobre a classificação light de produtos alimentícios.
– O consumidor que tenta adotar uma alimentação saudável, conferindo as tabelas nutricionais, por exemplo, e acaba sendo enganado pelas informações das embalagens. Por isso, denunciamos essa situação à Anvisa – explica Maria Inês.
O que dizem as empresas:
Nestlé, que produz a Nesfit
A Nestlé desconhece os critérios e a metodologia aplicados pela Proteste na análise de barras de cereais. A empresa aguarda os parâmetros considerados, bem como a identificação dos lotes utilizados a fim de avaliar essa suposta variação específica. A companhia reforça que monitora periodicamente os teores nutricionais com análises laboratoriais para assegurar o cumprimento à legislação.
Ritter Alimentos, que produz a Ritter
Produzir alimentos seguros e de alta qualidade que atendam aos requisitos legais estabelecidos é a nossa filosofia desde a fundação em 1919.O BHA e BHT citados são utilizados com a função antioxidante na Barra de Castanha do Pará somente porque são aprovados em regulamento técnico pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) através da Resolução RDC nº 60 de 05/09/2007 para uso em cereais e derivados e também porque estão de acordo com as especificações da FAO/WHO e do Food Chemical Codex.Um aditivo alimentar somente pode ser utilizado pela indústria de alimentos quando explicitamente previsto em regulamentação específica, com suas respectivas funções, limites máximos e categorias de alimentos permitidas. A segurança de uso de aditivos alimentares tais como os antioxidantes BHA e BHT é primordial e a legislação brasileira que dispõe sobre o uso de aditivos alimentares tem sido atualizada pela Anvisa de acordo com o avanço dos conhecimentos científicos e tecnológicos.
Grupo Pão de Açúcar, que produz a Taeq
A Taeq tem como premissa o cumprimento das normas em vigor e todos seus produtos são devidamente analisados e aprovados sob a ótica das leis que regem a produção e oferta de alimentos. Em relação a análise da Proteste, a empresa informa que desconhece os critérios e a metodologia utilizados na pesquisa e se coloca à disposição para apresentar os laudos técnicos aos órgãos públicos.
Nutrimental, que produz a Nutry e a Nuts
Tivemos acesso as informações da Proteste e ficamos muito satisfeitos que duas de nossas barras foram consideradas as melhores escolhas pela análise.Embora não tenhamos tido a oportunidade de analisar com mais profundidade os dados de análises divulgados, reiteramos que trabalhamos com os mais rigorosos controles na produção dos nossos produtos.
Pepsico, que produz a Quaker
A PepsiCo, fabricante de Quaker®, informa que cumpre as boas práticas de produção e segue rigorosos padrões internacionais de segurança do alimento e de qualidade. A empresa esclarece que todos os ingredientes que compõem as barras de cereal Quaker®, inclusive os aditivos BHT e BHA, são autorizados pela ANVISA e utilizados de acordo com os limites estabelecidos pelo órgão regulador.
A Trio Alimentos, responsável pela produção da barra Trio não respondeu às solicitações enviadas pela reportagem.