As sete peixarias e uma câmara fria localizadas no Mercado Público de Porto Alegre funcionaram normalmente nesta terça-feira (6), um dia após o Ministério Público e a Polícia Civil realizarem a operação chamada Gato por Lebre no local. Durante a fiscalização aos estabelecimentos, três proprietários de dois pontos de venda foram presos em flagrante por comercializarem peixes proibidos. O total de 1,68 tonelada de pescado foi recolhida para descarte.
A Polícia Civil não informou os nomes dos comerciantes detidos, mas a reportagem apurou que eles são Alfredo André Signoretti, 50 anos (Peixaria Collar), e Manoel Claudio Carvalho Maciel, conhecido como Maneco, 52, e João Carlos Leal de Lima, 76 (ambos da Peixaria São Lourenço). Os três obtiveram liberdade provisória na manhã desta terça-feira.
— Os dois autos de prisão em flagrante foram homologados pelo juiz e foi concedida liberdade provisória aos três detidos — explica o titular da Delegacia de Proteção ao Consumidor, Joel Wagner, que participou da ação de fiscalização.
A reportagem de GZH esteve na Feira do Peixe do Mercado Público, em torno das 11h45min desta terça, e constatou que todas as peixarias estavam abertas e seguiam comercializando seus pescados. Na verdade, nenhuma delas estava proibida de vender seus produtos.
Os três proprietários que haviam sido presos na véspera não estavam no local, informaram os atendentes. GZH procurou entrevistá-los indo às bancas presencialmente e por meio de chamadas de telefone para os estabelecimentos, sem sucesso.
O delegado Joel Wagner comenta sobre o valor da multa a ser aplicada aos envolvidos:
— Estimamos uma multa de mais de R$ 1,2 milhão para a Peixaria São Lourenço e de pouco mais de R$ 320 mil para a Collar.
As investigações da Delegacia de Polícia de Proteção ao Consumidor (Decon) apontaram que as bancas substituiriam espécies, vendendo o produto com falsa denominação, como se fossem peixes mais nobres. Porém, seriam espécies de valor comercial mais baixo e de procedência duvidosa.
Durante a ação, três bancas não apresentaram irregularidades (confira quais são abaixo) e uma foi parcialmente interditada (parte do depósito da DuPorto/Santo Antônio, que tem nome fantasia). Todos os estabelecimentos com problemas foram autuados. Entre as principais irregularidades verificadas, estaria o comércio de peixes proibidos, sem origem de procedência, armazenados em temperatura irregular e péssimas condições de higiene, além de utensílios enferrujados usados para cortar os pescados.
A operação conjunta envolveu o Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP), por meio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) – Segurança Alimentar, e a Polícia Civil, por meio da Delegacia de Polícia de Proteção ao Consumidor (Decon).
O promotor de Justiça Alcindo Luz Bastos da Silva Filho, um dos coordenadores da operação por parte do MP, antecipa o que vai acontecer agora:
— Na Promotoria do Consumidor, vamos marcar audiência e os envolvidos terão que indenizar pela venda dos peixes ao público. Vamos fixar multas altas para eventuais reincidentes.
O gestor do Mercado Público, Ronaldo Pinto Gomes, relata o que esse tipo de crime significa para quem não tem nada a ver com essas irregularidades e sempre trabalha de forma correta.
— O Mercado trabalha muito com a confiança que se estabelece entre cliente e mercadeiro. Com a peixaria não é diferente. Quando existe um fato como esse, se quebra a confiança. E é muito difícil se restabelecer, e leva tempo — observa.
Estabelecimentos sem irregularidades
- DuPorto
- Japesca
- Mar Azul
Estabelecimentos autuados por problemas
- Collar (venda de peixes proibidos)
- Coopeixe (irregularidades como ausência de notas fiscais)
- DuPorto/Santo Antônio (problemas de higiene)
- São Lourenço (venda de peixes proibidos)
Saiba como identificar um peixe fresco e em bom estado para consumo
O gerente Gabriel Cunha, da Japesca, onde nenhuma irregularidade foi encontrada durante a fiscalização, dá dicas de como escolher um peixe na hora da compra.
Segundo Cunha, "o grande segredo é o controle da temperatura".
Confira as orientações abaixo:
- O produto precisa ter odor de peixe, mas a fragrância não pode ser muito intensa;
- Ao tocar no peixe, a carne precisa ser firme;
- O peixe necessita ser mantido em local refrigerado com abundância de gelo;
- O peixe fresco fica armazenado a uma temperatura em torno de 5°C, enquanto que, se estiver congelado, o ideal é a temperatura ficar em torno de -18°C;
- Os olhos do peixe devem estar brilhantes;
- Após a compra do peixe, o consumidor não deve ficar mais do que duas horas com o produto fora de refrigeração
Punições aos envolvidos
Os três homens que foram presos em flagrante por crime contra as relações de consumo deverão responder, no termos do artigo, 7º, inciso IX, da Lei nº 8.137/1990 (vender, ter em depósito para vender ou expor à venda ou, de qualquer forma, entregar matéria-prima ou mercadoria, em condições impróprias ao consumo) – com pena de detenção, de dois a cinco anos. Poderão responder também por crime ambiental (com pena de detenção de um a três anos e/ou multa, em caso de condenação), por conta da venda de peixes cuja pesca é proibida.
Os demais investigados poderão responder pelo crime previsto na Lei nº 8.137/90, artigo 7º, inciso VII (induzir o consumidor ou usuário a erro, por via de indicação ou afirmação falsa ou enganosa sobre a natureza, qualidade do bem ou serviço, utilizando-se de qualquer meio, inclusive a veiculação ou divulgação publicitária) e inciso IX (vender, ter em depósito para vender ou expor à venda ou, de qualquer forma, entregar matéria-prima ou mercadoria, em condições impróprias ao consumo), bem como pelo crime previsto no artigo 34, inciso III, da Lei nº 9.605/1998 (transporta, comercializa, beneficia ou industrializa espécimes provenientes da coleta, apanha e pesca proibidas).
A Associação de Comércio do Mercado Público Central (Ascomepc) se posicionou sobre o assunto. Veja, abaixo, o conteúdo da nota da Ascomepc:
“Esse tipo de operação é de rotina e pontual. Cabe à Associação orientar os proprietários para que ofereçam os melhores serviços e cumpram as determinações exigidas pela saúde e demais órgãos competentes. Para todos é muito importante esse tipo de fiscalização, uma vez que a Ascomepc não tem o poder de punição, e a maioria esmagadora dos mercadeiros atua de forma correta no Mercado.”
Contrapontos
A advogada Camila de Souza Corrêa, que defende Manoel Claudio Carvalho Maciel e João Carlos Leal de Lima, proprietários da Peixaria São Lourenço, disse que não se manifestaria sobre o caso "em razão do sigilo profissional e da ausência de autorização dos clientes".
Já o advogado Vinicius Borges de Moraes, que representa Alfredo André Signoretti, proprietário da Peixaria Collar, diz que seu cliente nega as irregularidades e aguarda mais detalhes da polícia e do MP a respeito da investigação.
— Vamos nos reunir, aguardar se o MP fará a denúncia, qual será o desdobramento, até para saber os tipos penais efetivamente que ele estaria respondendo e, a partir disso, ir tentando demonstrar, explicar a situação para o Poder Judiciário e para a população gaúcha — afirmou o advogado.
Quanto à manifestação de seu cliente, Moraes disse que ele aguarda um "ambiente mais tranquilo para explicar a situação".
— O que se sabe, em um primeiro momento, é que a avaliação feita foi sensorial das características dos pescados e que, segundo o senhor Alfredo, não corresponderia às impressões de pessoas que realmente conhecessem ou estivessem habituadas ao produto. Eles avaliaram textura, aparência, coloração. Nesse aspecto, meu cliente alega que os produtos estavam adequados, mas essas pessoas, em tese, teriam divergências nesse sentido. Não nos foi mostrado nenhum material ainda. Estamos aguardando mais detalhes — frisou o advogado.
GZH não conseguiu contato com os proprietários da Coopeixe e da DuPorto/Santo Antônio.