Desde o começo do distanciamento social, em março, não se via tanta gente na rua em Porto Alegre como nos últimos dias. Depois de mais um fim de semana de orla movimentada, imagens de segunda e terça-feira mostraram centenas de pessoas caminhando com pouca distância entre si em vias da região central da cidade. A impressão que se tem desde o começo da semana vem acompanhada de um número recorde: nesta segunda-feira,a Trensurb registrou 59.825 passageiros, o maior número desde 20 de março. Em comparação com a primeira segunda-feira de abril, representa um aumento de quase 70%.
Na terça-feira (5), dia em que estabelecimentos de pequeno porte foram autorizados a reabrir na Capital, foram 55.905 passageiros. Nas imediações do Mercado Público, onde estão os principais pontos de comércio do Centro, antes das 10h, a circulação de pedestres já era intensa. Em bairros como Menino Deus, Petrópolis e Bom Fim, também havia mais gente na rua, especialmente em torno de agências bancárias.
Nesta quarta-feira (6), GaúchaZH retornou a sete pontos da área central fotografados entre 20 e 27 de março e verificou, em todos eles, uma movimentação bem maior do que naquele período, quando o distanciamento social na Capital impôs a paralisação do comércio, entre outras restrições. Em frente ao Mercado Público, na Rua dos Andradas, na orla do Guaíba e na Rua General Lima e Silva era possível ver mais pessoas a pé — muitas circulando de máscara —, enquanto nas avenidas Getúlio Vargas, Alberto Bins e na Borges de Medeiros, sob o Viaduto Otávio Rocha, o fluxo de veículos se intensificou.
Segundo a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), entre os dias 25 de abril e 1º de maio, a Capital registrou a maior circulação de veículos desde a primeira semana de distanciamento social, com 65% do fluxo considerado normal em outros períodos. O menor fluxo verificado até agora foi na segunda semana, entre 21 e 27 de março, quando o movimento foi de 49%. Ainda não há dados consolidados do trânsito nos últimos dias.
A prefeitura defende que a liberação de atividades, que começou com a volta da construção civil, no fim de abril, seguida da indústria e de parte do comércio, obedeceu a uma série de critérios para minimizar os efeitos sobre o distanciamento social, necessário para controlar a disseminação da doença. Segundo o secretário extraordinário de Enfrentamento ao Coronavírus, Bruno Miragem, o poder público está monitorando os impactos sobre o número de casos confirmados e internações a cada 15 dias. Caso o poder público observe um rápido avanço na propagação do vírus ou sobrecarga do sistema de saúde, a flexibilização pode ser interrompida.
— Estamos fazendo um movimento calculado. Se houver qualquer sinal de agravamento do ritmo de contágio, vamos retroceder — disse Miragem.
Mais aglomerações
A mudança de comportamento dos porto-alegrenses pode ser vista como consequência das medidas de flexibilização, mas também de uma tendência de rompimento do distanciamento social observada há mais tempo. Somente em abril, a Guarda Municipal atendeu a 230 ocorrências de aglomerações em Porto Alegre, uma média de quase oito casos por dia.
No começo da semana, restaurantes do Mercado Público receberam clientes em suas mesas, alguns deles em grupos. O atendimento foi interrompido, mas este não era o único problema em um dos principais pontos de vendas de alimentos da Capital. Na manhã desta quarta-feira, fornecedores circulavam sem máscara para entregar produtos no local.
Um estudo publicado na revista científica The Lancet indica que um relaxamento prematuro das políticas de distanciamento social pode culminar em um crescimento rápido de mortes pelo coronavírus, desperdiçando parte do esforço conjunto de antes. No fim de abril, o ministro da Saúde, Nelson Teich, desaconselhou medidas de flexibilização enquanto os casos de coronavírus estiverem em “franca ascensão”, como ocorre em todo o país.
Apesar da imprudência de parte da população — diante disso, não se sabe até quando —, Porto Alegre ainda registra o menor ritmo de crescimento de novos casos de coronavírus entre as 27 capitais brasileiras. Até a publicação desta reportagem, a Capital somava 17 mortes por covid-19.