O futebol ficou em segundo plano na vida de Deivison Gularte Martins, 15 anos, desde que começou a frequentar aulas de dança contemporânea na escola em que estuda, no bairro Guajuviras, na periferia de Canoas. Paixão instantânea, a nova atividade logo consumiu o tempo dedicado à escolinha de futebol. E o treinamento intensivo mostrou-se capaz de mudar o futuro do menino.
No ano passado, Deivison ganhou uma bolsa de estudos no prestigioso Ballet Vera Bublitz, em Porto Alegre. Neste ano: depois de participar de aulas com professores de diferentes países, em junho, foi o escolhido para ir aos Estados Unidos fazer um curso de verão em 2020.
— A ficha não caiu completamente. Por enquanto, não estou nervoso. Acho que vai ser mais no dia (de embarcar) — conta o adolescente.
O desempenho de Deivison chamou a atenção do professor norte-americano Robert Garland durante o Festival Internacional de Dança de Porto Alegre (FIDPOA). A comunicação entre os dois teve de contar com a ajuda da tecnologia. Como o adolescente não fala inglês, e o professor não se comunica em português, usaram o GoogleTradutor para conversar entre uma atividade e outra. O convite veio ao final do evento, e surpreendeu a família do morador do Guajuviras.
— Foi maravilhoso, um presente que a gente não esperava. Muito marcante — diz Marci Gularte, mãe do aspirante a bailarino.
Em julho do ano que vem, o caçula de três filhos de Marci deve passar um mês no Dance Theatre of Harlem, em Nova York, para aprimorar os estudos no balé clássico. Mas a jornada até lá promete ser árdua. Sem recursos para custear os gastos com passagem, estadia e alimentação, a família já promoveu uma rifa, um galeto e, nos próximos meses, planeja lançar uma vaquinha virtual para conseguir dinheiro. Com o dólar alto, o custo total estimado é salgado, em torno de R$ 30 mil.
— Na hora a gente ficou feliz, mas depois pensou: "como a gente vai fazer?". Não temos muita noção dos gastos. Conseguimos R$ 1 mil e metade da passagem, mas estamos na correria para arrecadar fundos, porque não temos condições — contou Marci.
Para Deivison, os próximos meses prometem ser de trabalho redobrado. Além da rotina de ensaios, de quatro horas diárias, começou a estudar inglês para se preparar para as aulas — o curso foi presente de uma escola de idiomas. Também está aprendendo a gerenciar a popularidade entre os amigos depois que a notícia se espalhou.
— Meus amigos acharam bacana. Agora ficam pedindo pra tirar foto comigo antes que eu fique famoso — sorri.
A dedicação integral de Deivison ao balé, desde o começo, não foi sem motivo. Até então acostumado a treinar dança contemporânea, ele ainda está se adaptando ao estilo mais formal e exigente do balé clássico. Paixão antiga, o futebol não foi abandonado completamente. Sempre que pode, joga na rua ou na escola, com os colegas. Não se arrepende, no entanto, de ter trocado as chuteiras pelas sapatilhas.
— Quando eu danço, eu me sinto bem, esqueço todos os problemas. É como se eu entrasse em outro mundo, inexplicável — diz.
Campanha
A história de Deivison é uma das cinco que dão vida à campanha de fim de ano do Grupo RBS, protagonizada por personagens reais. Os relatos foram escolhidos por meio do projeto Sua Vida É Notícia, no qual a RBS se dedicou a ser porta-voz das boas notícias do público, como o nascimento de um filho ou uma grande conquista pessoal. Acontecimentos que geralmente não virariam notícia acabaram apresentados por comunicadores, ganhando forma na voz de personalidades conhecidas do público.