Quando se fala em furto de energia, a lembrança mais comum é o dos famosos "gatos", geralmente encontrados em áreas ocupadas irregularmente e em pequenas residências. No entanto, o uso de recursos cada vez mais sofisticados tem levado a Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE) a uma verdadeira força-tarefa para evitar os prejuízos à companhia.
Até dezembro, 38 pessoas foram presas no ano por furto de energia em Porto Alegre, segundo dados contabilizados até sexta-feira (20). A identificação de irregularidades e a prisão de pessoas que fraudam os equipamentos levaram à recuperação de R$ 26,3 milhões na Capital em 2019 (valor contabilizado até novembro). Para comparação, em todo o ano passado, o valor recuperado chegou a R$ 35,4 milhões.
O dinheiro trazido de volta aos cofres da CEEE é usado em incremento e recuperação. Em 2019, R$ 9,9 milhões foram aplicados em incremento, que é o valor que passa a ser registrado nas contas dos clientes após a regularização. A recuperação, que soma R$ 16,4 milhões, é o valor pago depois que uma fraude é identificada.
Uma equipe criada em 2017 dentro da companhia trabalha focada na procura por perdas e irregularidades em toda a área de concessão, que engloba 72 municípios e 1,7 milhão de clientes. O grupo, que reúne técnicos, engenheiros e eletricistas, identifica queda de consumo dos clientes e, a partir disso, faz inspeções — há, inclusive, um sistema que emite um alerta quando há alteração no consumo de algum dos 10 mil clientes responsáveis por 40% do faturamento da empresa.
Neste ano, foram realizadas 34,3 mil fiscalizações na Capital, que geraram a identificação de 4,6 mil fraudes. Os clientes são diversos: além de moradores de residências, há donos de estabelecimentos.
— Tem academias, hotéis, supermercados. Tem aumentado muito o furto de energia, por questão de recessão, desemprego. Tem pessoas com dificuldade de pagar. Tem aquele que furta para ter mais lucro e tem aquele que está com dificuldade. Quando se fala em furto de energia, todo mundo pensa em invasão, loteamento irregular. Mas há também furtos feitos por especialistas — esclarece o diretor de distribuição da CEEE, Giovani Francisco da Silva.
A maneira mais comum de furtar energia é o popular "gato", que é a ligação direta da casa à rede, sem medição. Os recursos mais especializados envolvem fios que passam por fora do medidor ou alterações no próprio equipamento.
Prejuízo aos moradores do entorno
Quando há furto de energia em um estabelecimento, os prejuízos não impactam somente a companhia, mas todos os moradores próximos do local. Isso ocorre porque a rede não está preparada para distribuição além da que foi programada.
— O entorno do furto começa a ter queda de energia, luz mais fraca, oscilações. Os fios não estão preparados para aquela carga. E tem a questão da segurança: se há um "gato" direto e pega fogo na casa, não há um disjuntor para desligar. Começa a atrapalhar a nossa rede e todos que vivem ali perto — explica o diretor.
O trabalho de fiscalização é feito em conjunto com a Polícia Civil, que realiza prisões quando a irregularidade é constatada — os proprietários dos estabelecimentos podem ser detidos por furto simples ou qualificado, que geralmente envolve recursos mais sofisticados.
— O enfoque é maior em estabelecimentos comerciais, por conta do alto consumo. Não adianta pegar uma casa que tem uma lâmpada, enquanto tem um comércio consumindo o equivalente a 300 casas. É o que representa prejuízo maior. Além da concorrência ileal, há impostos que deixam de ser recolhidos — alerta o delegado Luciano Peringer, titular da Delegacia de Polícia de Repressão a Crimes Contra o Patrimônio e Serviços Delegados.
Perdas
O furto de energia levou a CEEE a perder R$ 193 milhões em toda a área de concessão em 2019 — valor suficiente, por exemplo, para construir aproximadamente 12 subestações de energia elétrica, estruturas importantes na distribuição.
O índice de perda de energia do último ano é de 17,1%. Deste total, 6% são as chamadas perdas técnicas, que envolvem infraestrutura e material, como fios e transformadores. Outros 3,8% referem-se a perdas não técnicas regulatórias, que dizem respeito a furtos em um índice previsto pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Estes dois tipos de perdas estão contemplados no cálculo tarifário e têm compensação.
O restante, 7,4%, é a chamada perda não técnica excedente e corresponde ao furto de energia que é convertido em prejuízo para a concessionária. A CEEE iniciou um estudo em dezembro deste ano para identificar com mais precisão em quais municípios está concentrado o maior índice de perda.
Em toda a área de concessão, 46 pessoas foram presas este ano, contra 49 no ano passado. Do total de 105,4 mil fiscalizações, 12,7 mil foram identificadas como fraudes. O valor trazido de volta aos cofres — somando incremento e recuperação — chegou a R$ 123 milhões.