Após cenas de alegria, mas também de confusões posteriores e alheias aos blocos, o Carnaval de rua de Porto Alegre segue neste final de semana na Cidade Baixa. A programação se estende em outros pontos da cidade até 24 de março.
Os desfiles de sábado (9) e domingo (10) ocorrem dias depois de uma longa reunião entre autoridades. Na tarde de quinta-feira (7), órgãos da prefeitura, Brigada Militar e Ministério Público debateram por cerca de três horas os erros e acertos até aqui, que terão impacto no planejamento do evento em 2020.
O esforço da prefeitura tem sido o de desvincular os episódios de confusão dos eventos em si, e exaltar a organização por edital, novidade deste ano. Na véspera, o prefeito Nelson Marchezan classificou o Carnaval de rua como "de qualidade, organizado e seguro". Secretário-adjunto de Cultura, Leonardo Maricato, discursa na mesma linha, salientando avanços como os serviços de segurança e limpeza privados.
— Está claro para a prefeitura que a baderna não tem a ver com o Carnaval. Não podemos nivelar os eventos da cidade por um grupo de anarquistas — declara Maricato, em relação aos grupos que promoveram quebra-quebra nas cercanias da Rua da República em três dias consecutivos, embora em apenas um deles (no dia 5) houvesse bloco no bairro, horas antes.
Está claro para a prefeitura que a baderna não tem a ver com o Carnaval. Não podemos nivelar os eventos da cidade por um grupo de anarquistas.
LEONARDO MARICATO
Secretário-adjunto de Cultura
Ao longo do feriadão de Carnaval, a República recebeu os blocos e também grupos espontâneos que tomaram conta da via à noite e entraram madrugada adentro, sobretudo nos dias em que não houve evento (domingo e segunda).
Neste final de semana, prefeitura e órgãos de segurança esperam que a localização dos blocos seja menos propícia a transtornos para os moradores: no sábado e no domingo, eles se concentram na Praça Garibaldi e desfilam pela Avenida Aureliano de Figueiredo Pinto.
Mesmo que dissocie as cenas de baderna do evento Carnaval de rua, a prefeitura admite mudanças para 2020. Uma delas é lançar o edital mais cedo (o deste ano saiu em 9 de janeiro) e mais detalhado, contemplando eventos na cidade em todos os dias do feriadão. A ausência de eventos oficiais foi apontada como uma das causas da aglomeração espontânea e, a partir dela, da algazarra no bairro. A principal medida, todavia, é transferir os blocos para a Orla do Guaíba. A Brigada Militar aplaude a ideia:
— Muda demais, para o policiamento, realizar o evento em um espaço aberto. Se começa uma confusão, podemos entrar e retirar quem estiver incomodando. Em uma via estreita, como a Rua da República, a pessoa corre, vira a esquina e perdemos ela de vista. Bloqueando a Orla, também conseguimos evitar que um carro de transporte por aplicativo deixe as pessoas com sacolas e garrafas de bebida no meio do evento. Esse tipo de controle nós não conseguimos realizar em via pública — explica o comandante do policiamento da Capital, tenente-coronel Rodrigo Mohr Picon.
Muda demais, para o policiamento, realizar o evento em um espaço aberto. Se começa uma confusão, podemos entrar e retirar quem estiver incomodando. Em uma via estreita, a pessoa corre, vira a esquina e perdemos ela de vista.
TENENTE-CORONEL RODRIGO MOHR PICON
Comandante do Policiamento da Capital
Em 2019, até agora, houve apenas um dia de Carnaval de rua na Orla, em fevereiro, e outros dois estão marcados para 16 e 17 de março. Na opinião dos organizadores do bloco Galo do Porto, um dos que desfilaram no local, será preciso ajustes para 2020:
— Quando se falou em desfile na Orla, imaginamos ali no Gasômetro, no trecho revitalizado, perto das pessoas. Mas não, é no trecho 2 da Orla. Começa na Praça do Canhão, no Parque Marinha, e vai adiante. Parece que a ideia é sempre afastar, isolar em vez de agregar. Isso desmotiva — declara Valdomiro Soares, o Valdomiro de Olinda, vice-presidente do bloco.
Na opinião do tenente-coronel Rodrigo Mohr Picon, comandante do policiamento de Porto Alegre, o Carnaval pode ter sido encarado como uma oportunidade para grupos que se aglomeravam na Rua João Alfredo nos últimos meses de retomar o espaço, causando transtornos na vizinhança.
— Nem são carnavalescos. É um pessoal do funk — classifica.
Desde a madrugada em que ocorreu um triplo homicídio na via, em 26 de janeiro, a João Alfredo é alvo de uma operação de tolerância zero da Brigada Militar, Guarda Municipal e EPTC, com forte presença de policiais, monitoramento de pedestres na via, de sons automotivos, coibição de ambulantes e fiscalização de alvarás dos estabelecimentos do entorno.
Na opinião da promotora de Justiça e do Meio Ambiente do Ministério Público Annelise Monteiro Steigleder, o problema da João Alfredo, que teve desdobramentos neste Carnaval, é reflexo de uma falta de planejamento urbanístico de anos na Cidade Baixa.
— Desde a época da Copa do Mundo de 2014 vem ocorrendo uma série de flexibilizações com o intuito de reforçar a ideia da Cidade Baixa como região boêmia. Mas não houve políticas públicas de acompanhamento, e nem do impacto para o bairro. As pessoas vieram para uma região que não comporta aquele movimento. Mas, falando especificamente sobre o Carnaval da região, apesar dos episódios de baderna deste ano, acho que evoluímos desde 2015, quando não havia regra alguma — opina a promotora, um dos nomes por trás do acordo que limitou os eventos no coração do bairro a no máximo dois neste Carnaval.
Desde a época da Copa do Mundo de 2014 vem ocorrendo uma série de flexibilizações com o intuito de reforçar a ideia da Cidade Baixa como região boêmia. Mas não houve políticas públicas de acompanhamento, e nem do impacto para o bairro.
ANNELISE MONTEIRO STEIGLEDER
promotora do Ministério Público
Enquanto o Carnaval de rua continua, o delegado Paulo Cesar Jardim destaca que os episódios de violência estão sendo investigados pela Polícia Civil. Pede, inclusive, que pessoas que fizeram imagens dos quebra-quebras na Rua da República que procurem a 1ª Delegacia da Polícia Civil, na Rua Riachuelo, para ajudar a polícia na identificação de suspeitos.
— Com o devido cuidado, toda pessoa pode ser um pouco policial e ajudar a sua vizinhança gravando esse tipo de episódio. É fundamental individualizar responsabilidades, para os criminosos saberem que estão sendo observados e que serão processados. Nossa maior arma contra esse tipo de baderna é o vídeo — declara o delegado.