
A pouco mais de 500 metros da antiga Esquina Maldita, encontro da Osvaldo Aranha com a Sarmento Leite que deu início à vida noturna no Bom Fim nos anos 1960, em Porto Alegre, o bairro experimenta o renascimento da boemia após duas décadas de primazia da Cidade Baixa.
Nos últimos dois anos, novos bares, restaurantes e festas atraem fluxo crescente de frequentadores às imediações da Rua General João Telles, que animam as calçadas, mas também começam a despertar preocupação em antigos moradores que testemunharam os embates ocorridos entre notívagos e policiais.
– Abriram novos bares e restaurantes nos últimos anos. Tem mais gente na rua, o que não é ruim. Mas uma parcela dos moradores tem medo de que voltem a acontecer excessos como antigamente, quando havia briga, barulho. Não somos contra a ocupação das calçadas, desde que de forma ordenada e fiscalizada pelo poder público – afirma o vice-presidente da Associação de Amigos do Bom Fim, Milton Gerson.
Entre o final dos anos 1980 e meados dos anos 1990, as reclamações de quem morava nas proximidades da Osvaldo e os conflitos entre frequentadores e deles com a polícia se tornaram tão frequentes que acabaram sepultando o movimento ao longo da avenida – que costumava ficar apinhada de gente até o limite do meio-fio. Terminava, assim, uma tradição iniciada na esquina com a Sarmento Leite, onde a proximidade com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) havia estimulado a abertura de bares como Alaska, Marius, Copa 70 e Estudantil. A partir desse núcleo, nos anos seguintes surgiram duas dezenas de outros estabelecimentos na Osvaldo e vias próximas. Quase todos fecharam.
Agora, aos poucos, as calçadas do bairro voltam a receber aglomerações. Aberto há pouco mais de dois anos, o café-bar Josephyna's é um dos novos atrativos da região, que também herdou festas que ocorriam tradicionalmente na Cidade Baixa e migraram para o Bom Fim como a Meltdown – atualmente abrigada no tradicional Ocidente (na esquina da João Telles com a Osvaldo).
– O bairro está resgatando essa memória boêmia e alternativa. Sabemos que o passado deixou traumas em muita gente, mas hoje não vemos o mesmo ambiente que antes. Havia muitas tribos que brigavam entre si, agora recebemos um público que quer ficar em um ambiente ao ar livre, sem confusão – analisa um dos proprietários do Josephyna's, João Henrique Silva Martins, 33 anos.
Em vez dos punks, headbangers e skinheads de outros tempos, hoje se veem muitos estudantes e profissionais liberais e ligados à indústria criativa.
– Frequentava a Cidade Baixa, agora também venho ao Bom Fim. Nunca vi nenhuma briga por aqui – comenta o designer Cláudio Rabello, 39 anos, encostado a uma parede da João Telles.
Ao lado dele, o professor de geografia e educação ambiental Tomás Rech da Silva, 39 anos, acredita que os conflitos na Cidade Baixa não foram tratados da melhor forma:
– A repressão policial não é solução. Falta diálogo e oferecer mais opções de entretenimento em outras regiões da cidade como na periferia. Ocupar a rua é um ato político, uma forma de estabelecer relações comunitárias.