Nos próximos meses, pessoas com dificuldades de locomoção em Porto Alegre deverão ter a circulação facilitada em pelo menos 500 pontos da cidade. Uma empresa de Santa Catarina venceu a licitação aberta pela Secretaria Municipal de Acessibilidade e Inclusão Social (Smacis) para a execução do serviço, que pode começar no mês de setembro e deve levar sete meses para ser concluída.
- Conseguimos reduzir o valor do serviço em 34%, o que significa que, mais tarde, vamos conseguir aumentar o número de rebaixos - comemorou o secretário de Acessibilidade e Inclusão Social, Raul Cohen.
As propostas dos interessados em instalar os rebaixos na Capital foram entregues nesta terça-feira. Três companhias mostraram interesse em realizar o trabalho, mas uma foi desclassificada por ter chegado atrasada. A vencedora foi a empresa Ana Cardoso, de Santa Catarina. Ela apresentou o melhor orçamento: R$ 329.998, R$ 170 mil a menos que a previsão inicial.
Os pontos que receberão os rebaixos ainda estão sendo definidos, segundo o titular da Smacis. A Avenida Assis Brasil, na Zone Norte, a Rua 24 de Outubro, no bairro Moinhos de Vento, e a Rua General Lima e Silva, na Cidade Baixa, estão entre as vias que devem ser contempladas. Equipes técnicas da secretaria estariam estudando outros locais para a instalação dos declives.
Se, por um lado, mais acessos melhoram, incontestavelmente, o deslocamento de cadeirantes e pessoas com dificuldades de locomoção, os lugares escolhidos pela prefeitura para receber os novos rebaixos são questionados pelos principais interessados. Para Rotechild Prestes, do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoas com Deficiência de Porto Alegre (Comdepa), as demandas mais urgentes se concentram na região central da Capital, em especial no Centro e no bairro Menino Deus.
- Nós entendemos que, nesse momento, a prioridade é o Centro. É o lugar onde há maior circulação de pessoas, os principais serviços, órgãos públicos e agências de emprego. A acessibilidade tem que estar em todos os lugares, mas podemos indicar onde há maior número de pessoas com dificuldades de locomoção - avalia.
O Comdepa não foi consultado pela prefeitura para a definição dos locais onde serão implantados os acessos. O secretário de Acessibilidade e Inclusão Social disse que a pasta está em "constante diálogo" com o conselho e aberta a receber sugestões:
- Eu penso que, se eu ficar aguardando o conselho, vou levar muito tempo para tomar providências. Temos que ser mais ágeis. Mas agora eles vão poder se manifestar e nós vamos avaliar - disse.
Quem depende dos declives para se deslocar destaca, ainda, a precariedade da situação atual. O escritor Ari Heck, cadeirante e ativista dos direitos das pessoas com deficiência, lamenta a falta de estrutura nas vias do Centro, onde circula toda semana.
- Minha mulher trabalha perto da Voluntários da Pátria, onde há muito comércio, e o deslocamento por ali é sempre um transtorno. Temos que andar pelo asfalto, às vezes no corredor de ônibus, porque os passeios não têm rebaixamento - conta Heck.
Para o ativista, que percorre diversas capitais a trabalho, o principal problema da capital gaúcha é a dificuldade em tirar a legislação do papel. Lançado em 2011, o Plano Diretor de Acessibilidade do município prevê que o acesso a pessoas com deficiência seja facilitado - desde então, as obras executadas em calçadas, por exemplo, são obrigadas a terem acessibilidade -, mas as iniciativas do poder público ainda não tiveram impacto significativo sobre a rotina de quem não tem condições de vencer o cordão da calçada.
Presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil no Rio Grande do Sul (IAB-RS), Tiago Holzmann da Silva concorda com as pontuações feitas pelos cadeirantes. Ele acredita que, como lógica urbana, os declives deveriam atender primeiramente aos lugares mais movimentados da cidade.
- Poderia ser em todo o Centro ou no lugar mais movimentado dos bairros, não faz muita diferença. Mas antes, isso devia ter sido definido junto ao conselho (Comdepa) - critica o arquiteto.
O problema de circulação na Capital, no entanto, não se restringe às pessoas com deficiência. Buracos, pedras soltas e obstáculos nos passeios fazem parte da rotina dos pedestres, e não há perspectiva de melhora: em quatro anos, o Projeto Minha Calçada: Eu Curto, Eu Cuido, da prefeitura, solicitou melhorias em 24,3 mil calçadas, mas emitiu apenas 186 autuações - ou seja, menos de 1% dos proprietários de imóveis com passeios avariados foram punidos. A (má) situação das vias, no entanto, não será impeditivo para a instalação dos rebaixos, segundo a Smacis.
Em números, os rebaixos de calçadas são matéria obscura na Capital. Conforme a Smacis, eles ultrapassariam os 4 mil. De 2011 a 2013, no entanto, a Secretaria Municipal de Obras e Viação (Smov) instalou apenas 136 - no ano passado, foram feitos mais 132. A Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), responsável por esse tipo de obra em locais perto de pontos de ônibus que tenham sinalização semafórica não tem um levantamento do número de instalações.