O subprocurador-geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), Lucas Furtado Rocha, e deputados da oposição criticaram a decisão do presidente Jair Bolsonaro e do advogado-geral da União, José Levi Mello do Amaral Júnior, de pedir, ao Supremo Tribunal Federal (STF), a suspensão do bloqueio de perfis de bolsonaristas nas redes sociais. Para eles, a atitude é um desvirtuamento do papel constitucional da Advocacia-Geral da União (AGU).
O bloqueio dos perfis foi determinado pelo ministro Alexandre de Moraes, relator no STF do inquérito das fake news, que apura notícias falsas, ofensas e ameaças contra autoridades. A medida foi solicitada ainda em maio, quando apoiadores do governo foram alvo de buscas em operação da Polícia Federal, e cumprida na sexta-feira (24) por Twitter e Facebook.
Um dos atingidos pela decisão de Moraes, o fundador da rede de academias Smart Fit, Edgard Corona, disse, em nota, que não se sente representado pela ação do governo no STF.
"Tendo em vista o noticiário recente envolvendo reações a medidas adotadas pelo ministro Alexandre de Moraes no curso do inquérito 4781, informo que a única pessoa autorizada a me representar perante o Supremo Tribunal Federal é o advogado Celso Vilardi", afirmou.
A ação direta de inconstitucionalidade protocolada no sábado (25), e assinada por Bolsonaro, alega que o desbloqueio das contas é necessário para "assegurar a observância aos direitos fundamentais das liberdades de manifestação do pensamento, de expressão, de exercício do trabalho e do mandato parlamentar".
Para Furtado, o caminho adequado, para defender a liberdade de expressão ou algum artigo da Constituição visando aos interesses de cidadãos comuns, seria recorrer ao Ministério Público Federal.
— Conseguem transformar uma questão privada em uma guerra pública. Há real interesse do presidente da República na questão. Para o bem da democracia brasileira, esse limite deve ser melhor definido — disse Furtado, que é professor de Direito Administrativo da Universidade de Brasília.
O deputado Carlos Zarattini (PT-SP) classificou a ação como "totalmente equivocada" e disse que a assinatura de Bolsonaro na peça tem um peso simbólico e revela a utilização do órgão com finalidade política.
— Eles estão usando a máquina de governo em defesa de seus propagandistas, agitadores de internet. Ainda que se possa discutir uma tese: se a decisão do ministro atinge interesses individuais, se é censura prévia ou não. Ainda assim, não cabe à AGU discutir isso.
— Usar a AGU para defender os amigos do presidente, em vez de interesses da União, é o cúmulo da instrumentalização — afirmou o deputado Alessandro Molon (PSB-RJ).
— A AGU representa a União e não tem por missão institucional advogar para o grupo político do presidente — completou o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP).
Advogado-geral da União entre 2009 e 2016, Luís Inácio Lucena Adams classificou a ação como "não muito ortodoxa", mas afirmou que "não há nada de errado" no pedido.
— Aqui a conotação política e ideológica é muito marcada, mas, independentemente disso, não é estranho nem errado, já que, nesse caso, a tese é a liberdade de expressão — afirmou Adams.
O ex-AGU explica que uma Adin não busca beneficiar apenas os casos que estão sendo julgados, mas todos o brasileiros que eventualmente forem lesados pela suposta inconstitucionalidade — no caso, a limitação à liberdade de expressão.
— Quando eu era advogado-geral, entrei com uma ou duas Adins com o presidente. Nesses casos, não cheguei a assinar. Eu reservava minha posição para apresentar posteriormente, diretamente no Supremo.