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A Câmara dos Deputados aprovou na terça-feira (12) o projeto de lei PL 10431/18 que agiliza bloqueio de bens e ativos de pessoas ou empresas investigadas ou acusadas de terrorismo pela Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU). O texto, que ainda tem de ser avaliado pelo Senado, determina execução imediata das sanções impostas pela organização. Depois do confisco, o poder Executivo nacional ficaria encarregado de homologar a decisão, e quem teve patrimônio retido poderia recorrer à Justiça.
A proposta atende a uma recomendação do Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo (Gafi), organização intergovernamental da qual o país faz parte desde 1999. O texto em discussão é defendido pelo ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sergio Moro, e foi encaminhado ao plenário em 2018.
A legislação brasileira já prevê norma que disciplina a ação de indisponibilidade de bens, direitos ou valores em decorrência de resolução da ONU (Lei 13.170/15), mas o dispositivo demanda ação judicial antes do sequestro. O objetivo do novo projeto é justamente evitar a demora gerada por essa tramitação.
Para juristas, no entanto, a medida suscita controvérsia.
— É sempre delicado tratar assim de restrições a direitos sem decisão judicial — pondera o advogado criminalista e professor de direito processual penal da Unisinos, Stephan Doering Darcie.
Segundo ele, é complexo fazer uma gerência adequada das punições se não houver controle judicial. Ele acrescenta que existe, no direito, o princípio da reserva de jurisdição, no qual medidas restritivas de direitos fundamentais têm de ser precedidas de controle judicial.
— A legislação anterior, parece, já tratava sobre isso de maneira satisfatória. Talvez não tão célere, mas com segurança. São escolhas: se querem algo mais veloz isso tem um custo, que é alguém ser privado de direitos sem administração judicial prévia — pontua Doering.
O advogado Lenio Streck, um dos fundadores do núcleo da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) no Rio Grande do Sul, também assinala possíveis riscos:
— A medida deve passar. Com isso, há perigo de inconstitucionalidade, pois a pessoa pode ter bens recolhidos antes mesmo de responder processo.
Fabiano Clementel, também professor da PUCRS, defende que não se pode abrir mão do controle de jurisdicionalidade.
— A ideia é boa, mas a eficiência tem de ser pensada do ponto de vista da não supressão de bens. Se problema é morosidade, que se exija mais celeridade na apreciação do julgador. Que tenhamos mais juízes — avalia.
Streck acrescenta que a legislação atual preconiza a atuação de vários agentes — Ministério da Justiça, Advocacia Geral da União (AGU) e Poder Judiciário — o que daria menos margem a possíveis restrições desnecessárias.
O relator do projeto na Câmara, deputado Efraim Filho (DEM-Paraíba), comemora a aprovação e afirma que é preciso rapidez nesse tipo de processo internacional. O parlamentar complementa que, caso a matéria não seja aprovada, existe risco de o Brasil entrar na lista de nações não engajadas na prevenção ao terrorismo e sofrer embargos econômicos e políticos de outros países.
— Atualmente, o Ministério da Justiça precisa ser acionado. Ele passa a ordem para a AGU que distribui a um juiz que decide se aplica a pena ou não. Com a nova proposta, a ONU poderia acionar diretamente o Banco Central (BC) para executar bloqueio imediatamente — explica Efraim.
O democrata rebate, ainda, o receio de que movimentos sociais sejam criminalizados com o novo o texto. Segundo ele, não houve alteração na Lei Antiterrorismo (13.260/2016), que tipifica o que é terrorismo.
— Não inova em termos conceituais. A proposta trata apenas da adaptação de procedimento para implementação das sanções — destaca Ifraim.
Streck, no entanto, pondera:
— Há um fundado receio de que no futuro o governo aprove outros projetos, como fez com esse, que alterem a lei que tipifica o terrorismo. Mas, nesse momento, isso não faz parte da discussão. A proposta aqui não entra nessa seara.
— Esse projeto de lei esse não tem condão de criminalizar movimentos sociais. Ele busca cumprimento de sanções impostas pelo Conselho de Segurança da ONU. A proposta não vem para disciplinar condutas como práticas terrorista, para isso tem a lei 13260/201 – analisa Fabiano Clementel.