A disputa pela prefeitura de Porto Alegre tende a terminar em 29 de novembro, data do segundo turno, mas boa parte dos partidos aproveita a ocasião como ensaio para 2022. Tendo no horizonte político as próximas eleições gerais, as siglas usam a exposição natural da campanha para reforçar junto ao eleitor a própria marca e o nome de candidatos que estarão de volta às urnas em dois anos, concorrendo a cargos legislativos, ao governo do Estado ou até mesmo à Presidência da República.
Ao menos dois partidos escancaram essa estratégia na propaganda eleitoral: PP e PDT. Entre os trabalhistas, a candidatura de Juliana Brizola reforça um planejamento nacional que deseja manter em constante projeção a figura de Ciro Gomes. Terceiro colocado na disputa presidencial de 2018, Ciro obteve 154 mil votos em Porto Alegre, uma diferença de 0,75% para o segundo mais votado entre os eleitores locais, Fernando Haddad (PT).
Além de ser o único postulante ao Planalto em 2022 a frequentar a propaganda eleitoral de rádio e TV na Capital, Ciro chega ao Estado na próxima segunda-feira (9) para atuar diretamente na campanha. Ele irá gravar depoimentos para o partido e deve cumprir agenda ao lado de Juliana em Porto Alegre e de Anabel Lorenzi em Gravataí, sexto maior colégio eleitoral gaúcho.
Preparação
Para o PDT, a presença de Ciro no Estado e a presença de Juliana na eleição municipal são importantes para motivar a militância e preparar o terreno para a sonhada candidatura do presidente do Grêmio, Romildo Bolzan, ao Piratini em 2022.
— Porto Alegre é a cidade mais importante do país para o trabalhismo, e o Ciro tem muita força aqui. Além disso, o PDT precisa ter protagonismo nas eleições. A Juliana foi vereadora, é deputada e, mais do que isso, é uma Brizola. O Romildo por enquanto está fardado no Grêmio, mas ele sabe que vai chegar o momento em que terá de trocar de fardamento e vestir a camisa do PDT — afirma o deputado federal e ex-presidente da sigla, Pompeo de Mattos (PDT).
No PP, o pano de fundo é o desejo do senador Luis Carlos Heinze concorrer ao governo do Estado em 2022. Sem conseguir montar uma coligação competitiva e tampouco garantir suporte financeiro à campanha de Gustavo Paim, o partido chegou a flertar com o apoio a Sebastião Melo (MDB) e José Fortunati (PTB).
O próprio Paim havia publicado um vídeo anunciando que desistia da candidatura, mas acabou convencido a retomar a empreitada. De São Borja, onde cumpria quarentena em sua fazenda, Heinze comandou a reviravolta.
Desgaste
Ainda marcado por ter sido forçado a renunciar à candidatura ao Piratini em 2018 —quando Ana Amélia Lemos levou o PP a uma aliança com Eduardo Leite (PSDB), tornando-se vice na chapa presidencial do tucano Geraldo Alckmin — Heinze não aceitou novo recuo.
Com direito a indicar o destino de R$ 3,6 milhões em recursos do fundo eleitoral, o senador bancou a presença de Paim na disputa, chefia o conselho político da campanha e é uma das figuras mais assíduas na propaganda. Há duas semanas, chegou a comandar sozinho uma carreata pelas ruas da Capital, enquanto o candidato se recuperava da covid-19 em casa. Em nota, a direção do PP desvincula a atual mobilização de Heinze do próximo pleito.
Com forte presença no Interior, face à defesa que faz do agronegócio, o senador sabe que para 2022 precisa de maior penetração nos grandes aglomerados urbanos. Além de Porto Alegre, ele também deu suporte às candidaturas próprias do partido em Pelotas e Santa Maria, dois dos maiores colégios eleitorais do Estado e onde o PP caminhava para apoiar a reeleição dos atuais prefeitos, ambos do PSDB.
Sem eleger um governador há quase 40 anos — o último foi Jair Soares, em 1982 — a cúpula partidária apoia o movimento de Heinze, mas enfrenta desgaste por causa do investimento na Capital. Candidatos pelo Estado afora reclamam dos parcos recursos recebidos do partido, enquanto em Porto Alegre estão sendo gastos mais de R$ 1 milhão em uma campanha que não consegue sair do sétimo lugar nas pesquisas.
PCdoB e PT reforçam laços e tucanos avaliam sucessão
No outro espectro ideológico, a aliança entre PT e PCdoB em torno de Manuela D’Ávila reforça a proximidade dos dois partidos e cimenta a união para 2022, embora tenha origem em 2018. Naquele ano, Manuela abriu mão da disputa presidencial e aceitou ser vice de Fernando Haddad. Agora, em gratidão ao gesto e consciente de que ela era a candidata mais competitiva da esquerda, pela primeira vez o PT aceitou ceder a cabeça de chapa. Ainda assim, Manuela evita qualquer citação a questões políticas nacionais na campanha e jamais exibiu o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na propaganda de rádio e TV.
No PSDB, além de dar continuidade ao projeto vitorioso em 2016, a reeleição de Nelson Marchezan é considerada estratégica para robustecer a campanha do partido à Presidência em 2022 depois da pífia performance de Geraldo Alckmin há dois anos, quando teve apenas 4,6% dos votos na Capital. Por enquanto, o governador de São Paulo, João Doria, trilha sozinho a candidatura. Todavia, o nome do governador Eduardo Leite sempre é lembrado como primeira alternativa ao paulistano.
Para os tucanos, a eleição também conversa com a disputa à sucessão do próprio Leite. Até agora, o governador diz que não pretende concorrer à reeleição. Se a intenção se confirmar, os herdeiros naturais de uma candidatura de situação seriam Marchezan e a prefeita de Pelotas, Paula Mascarenhas, sobretudo se ambos renovarem o mandato nas urnas neste ano.
— A eleição municipal sempre tem esses contornos de preparar a disputa seguinte. Muito político aproveita para melhorar o recall, se fazer lembrado pelos eleitores. O curioso é que o cenário atual mostra que está acabando aquela velha polarização PT versus MDB que por tantos anos acompanhou as eleições no Estado. Os dois partidos enfrentam crises de renovação e não têm candidatos naturais ao governo em 2022. Por outro lado, o PDT tem Romildo Bolzan e o PSDB pode ter ao menos três nomes: Leite, Marchezan ou Paula — aponta o cientista político Carlos Eduardo Borenstein.